quinta-feira, 15 de outubro de 2015

A educação e a formação no pensamento e na práxis de libertação nacional de Amílcar Cabral

Para Amílcar Cabral, a libertação nacional é um processo de grande alcance estratégico, posto que ultrapassa os marcos da conquista formal da Independência, implicando a remoção de todos os obstáculos ao livre desenvolvimento das forças produtivas e de todas as formas de subjugação da pessoa humana, sendo, por isso, indissociável da luta contra a ignorância e pela promoção do conhecimento e da cultura.

Como manifestação genuína da cultura e como ato de cultura, a luta de libertação nacional não só se fundamenta e se inspira na cultura como influencia esta última (Cabral, 1972). Por outro lado, a cultura da libertação nacional fundamenta a conceção e a práxis da Democracia, posto que essa luta visa, em última instância, a construção de uma sociedade nova, livre e de progresso, em que o poder esteja nas mãos e ao serviço do povo.

Para ser vitoriosa, a gesta libertadora exige, pois, a par do recurso ao “poder das armas”, que se mostrou inevitável para fazer face à repressão colonial, a utilização da “arma da teoria” ou do conhecimento: um conhecimento que deve ser mobilizado para a transformação profunda da sociedade, ao serviço ou a bem desta.
Amilcar Cabral 
No contexto da libertação nacional, Cabral não só delineia como enceta a implementação das bases de um novo paradigma educacional que, pelo seu carácter emancipatório, humanista e progressista, contraria os pressupostos do ensino colonial e, no essencial, mantém toda a sua atualidade.

Nos conturbados tempos de hoje, a obsessão pelo mercado continua a ser tendência dominante na referencialização das políticas educativas e das prescrições curriculares à escala global, não obstante as evidências de que a atual crise internacional é largamente tributária do falhanço das políticas ultraliberais de crença cega nas alegadas virtudes da desregulação da economia.

No atual contexto, em que a globalização hegemónica preconiza e impõe processos de ampla convergência e uniformização da educação e do currículo, na base da ideia de que “tudo se torna igual, independentemente dos contextos nacionais” (Pacheco, 2011, p. 15), subvalorizando-se quer a natureza emancipadora da educação quer a sua função de promoção da diversidade cultural e identitária dos povos, afigura-se oportuno invocar, sem cair no “culto da personalidade”, o contributo de homens que, como Amílcar Cabral, Paulo Freire e outros pugnaram por uma sociedade assente no ideário da liberdade e da dignidade da pessoa humana, do progresso solidário e da justiça social, para cuja construção concorrem, de forma decisiva, a educação e a formação.

Nesta palestra, seguimos, de perto, em vários pontos, um artigo científico que publicámos na revista Desafios, nº 1, da Cátedra Amílcar Cabral, em 2013, e nalgumas das nossas páginas Web, sob o título “A educação, o conhecimento e a cultura na práxis de libertação nacional de Amílcar Cabral” .

Segue o texto integral da palestra realizada a 6 deste mês, na Universidade Federal do Pará:


Praia, 15 de Outubro de 2015.
Bartolomeu Varela
Universidade de Cabo Verde

domingo, 2 de agosto de 2015

Síntese da coleção História Geral da África em português – dois volumes



O “Programa Brasil-África: Histórias Cruzadas”, iniciativa conjunta da Representação da UNESCO no Brasil, do Ministério da Educação e da Universidade Federal de São Carlos, tem por objetivo principal dar visibilidade e reconhecimento à intersecção das histórias africana e brasileira, transformando e valorizando positivamente as relações entre os diferentes grupos étnico-raciais que constituem o Brasil.
Assim, na sequência da publicação da versão portuguesa da Coleção História Geral da África da
UNESCO, em 8 volumes (que divulgámos oportunamente nesta página) e correspondendo às disposições constantes da Lei n° 10.639 de 2003, que vão no sentido da inclusão do ensino da história da cultura afro-brasileira e africana desde a educação básica, o “Programa Brasil-África: Histórias Cruzadas” tem-se empenhando na produção e divulgação de materiais pedagógicos para todos os níveis educacionais, sendo o seu primeiro produto a “Síntese da Coleção História Geral da África”, publicada em dois volumes.
Estes dois volumes pretendem fornecer subsídios para os investigadores e os estudantes, bem como para a prática pedagógica de professores responsáveis pela educação básica, com o objetivo de ampliar seus conhecimentos em relação à história e à cultura africanas.
O volume I, que se compõe de quatro capítulos, apresenta o resumo dos quatro primeiros volumes da edição completa da coleção História Geral da África, abarcando os períodos desde a pré-história até o século XVI.
O volume II resume os restantes quatro volumes da edição completa da História Geral da África coleção, correspondendo ao período que vai do século XVI ao século XX. 

Pode aceder, gratuitamente, aos dois volumes, em PDF, clicando nos links que se seguem:

Praia, 2 de Agosto de 2015.

Ph.D. Bartolomeu L. Varela
Universidade de Cabo Verde

sábado, 11 de julho de 2015

A Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde propõe-se afirmar como instituição credível ao serviço do desenvolvimento


Tendo em conta os "avanços alcançados pela humanidade no que respeita ao acesso à informação, a construção de sociedades baseadas no conhecimento, bem como  interligação entre as ciências e as humanidades, numa lógica de inter e transdisciplinaridade," a Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde - ACH-CV apresenta-se como um fórum  de "debate e proposta de soluções das grandes questões de desenvolvimento do país e sua integração dinâmica nas comunidades mundiais ancorando no valor do conhecimento" - lê-se na Nota de Imprensa difundida no final da primeira assembleia-geral da Academia, que teve lugar no dia 10 de Julho de 2015, nas instalações do Instituto Internacional de Língua Portuguesa – IILP, na Cidade da Praia.

Com a presença de académicos de diversas gerações, residentes no país e na diáspora, durante este evento  "histórico", conforme realça a Nota de Imprensa, foram aprovadas diversas deliberações e eleitos os órgãos estatutários. De entre as conclusões do Plenário a que se refere a Nota de Imprensa, passo a destacar as seguintes:

1- Reconhecimento do trabalho da Comissão Académica Instaladora, presidida pelo Doutor Onésimo Silveira, na condução da Academia durante a fase da sua instalação, bem como do papel do Poeta Corsino Fortes, um dos promotores da ACH-CV;

2 - Aprovação pelos promotores dos pedidos de admissão de 45 membros fundadores, passando a ACH-CV a ser constituída por  68 membros fundadores, residentes no país e na diáspora;

3- Aprovação do Regulamento Interno e do Regulamento Eleitoral da ACH-CV;

4- Eleição da Mesa do Plenário, para todo o mandato (3 anos), constituída pelos seguintes membros: Doutora Iva Cabral – Presidente; Doutor Jairzinho Pereira – Vice-Presidente; Doutor Carlos Bellino Sacadura – Secretário;

4- Eleição, por sufrágio secreto, sob a condução de uma Comissão Eleitoral, dos demais órgãos estatutários, a saber:

a) Conselho Académico: Doutor Jorge Sousa Brito - Presidente do Conselho Académico e da Academia; Doutor João Lopes, Filho – Vice-Presidente; Doutora Amália de Melo Lopes – Vice-Presidente;  Doutor Bartolomeu Varela – Secretário-Geral; Doutor António Aly de Pina - Tesoureiro;

 b) Conselho Fiscal  - Doutor  Albertino Graça – Presidente; Doutor Manuel Brito Semedo - Vogal; Doutor Júlio de Carvalho - Vogal;

 5- Eleição da Comissão para Marca, Logo, Portal e Infraestruturação Tecnológicada Academia, constituída pelos Doutores Leão Lopes (Presidente), Silvino Évora  e Eurídice Monteiro;

6- Aprovação de Moções de Homenagem ao Membro Promotor falecido Ireneu Fileto Gomes, bem com ao Engº. Horácio Soares, recentemente falecido;

7- Distinção com o título de Presidente Emérito do Membro Fundador Doutor Onésimo Silveira.

Refira-se ainda que o Plenário aprovou o montante mensal da quota dos membros da ACH-CV, que é de mil escudos.

Por fim, o Plenário tomou  conhecimento das linhas orientadoras da ação da Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde para os próximos 3 anos, apresentada pelo Presidente ACH-CV e do Conselho Académico, Professor Doutor Jorge Sousa Brito, de entre as quais passo a destacar as seguintes, esperando traduzir o mais fielmente possível a alocução do Presidente:

- Consolidação da Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde - ACH-CV, mediante o envolvimento de todos os seus membros, residentes no país ou no estrangeiro, individualmente ou integrados em grupos ou comissões de trabalho;

- Afirmação da credibilidade da ACH-CV no seio da sociedade cabo-verdiana, mediante um trabalho qualificado, em parceria com as instituições do ensino superior, os poderes públicos e demais entidades potencialmente interessadas;

- Promoção da Academia nos contextos regional e internacional, mediante o desenvolvimento de relações de colaboração e parceria com outras instituições;
 

- Elaboração do plano estratégico da ACH-CV com base numa ampla auscultação individual dos membros da ACH-CV para o levantamento de suas perspetivas e contribuições;
 

- Promoção da investigação científico-humanística sobre questões relevantes, numa perspetiva inter e transdisciplinar;

- Colaboração com as instituições de ensino superior cabo-verdianas em iniciativas e projetos de natureza transversal, que extravasem a atuação de cada uma delas em particular;
 

- Organização de jornadas científicas para a discussão de questões específicas de candente relevância para a sociedade cabo-verdiana e o seu desenvolvimento;

- Promoção da produção académica, mediante patrocínio de estudos e criação de prémios de mérito;

- Criação de condições para a publicação de uma revista académica credível até ao final do mandato;

- Levantamento da diáspora científica cabo-verdiana e identificação das linhas de investigação em que possa participar tendo em vista a promoção da cultura cabo-verdiana e o desenvolvimento do país;

- Promoção do património imaterial cabo-verdiano, na sua diversidade, tendo por base um roteiro de estudos e investigação a ser aprovado;

- Contribuição, através de estudos especializados para a promoção da língua cabo-verdiana, valorando as suas variantes, tendo em vista a sua elevação ao estatuto de língua oficial, no quadro do bilinguismo nacional;

- Até ao final do mandato, revisão dos Estatutos e aprovação dos símbolos e marcas da Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde.



Praia, 11 de Julho de 2015.

Bartolomeu L. Varela
Professor da Universidade de Cabo Verde
Membro Fundador da ACH-CV



segunda-feira, 27 de abril de 2015

A formação dos professores nem sempre foi mantida com coerência


Com a devida vénia, publico, a seguir, a primeira parte da entrevista concedida à jornalista Arminda Barros, da Inforpress (agência de Notícias de Cabo Verde), por ocasião do dia do Professor cabo-verdiano (23 de Abril):

Bartolomeu Varela: A formação dos professores nem sempre foi mantida com coerência

Cabo Verde vem progressivamente promovendo a massificação do ensino com aumento considerável do número de professores com um conjunto de direitos e regalias, mas a aposta na sua formação nem sempre foi mantida com coerência, defendeu Bartolomeu Varela.


Em entrevista à Inforpress a propósito do Dia do Professor Cabo-verdiano, que se assinala a 23 de Abril, este ‘eterno’ professor, com mais de 40 anos dedicados ao ensino, disse que o país continua com um corpo docente no ensino primário composto, na sua grande maioria, por professores que não possuem curso superior.
Apenas 9 a 10% de professores desse nível de ensino possuem curso superior, ainda que não confira grau de licenciatura, o que é “muito pouco”, confirmou Bartolomeu Varela, para lembrar que a lei de bases do sistema educativo de 2010, que veio a exigir como requisito mínimo para ser docente o bacharelato, “ficou praticamente como uma letra morta”.

Isso porque não se apostou maciçamente na formação dos professores desse nível, criticou, ao realçar que os ganhos conseguidos no sector da educação poderiam ser maiores se a aposta na sua formação em exercício “fosse mais consequente e mais assumida de forma regular ao longo dos tempos”.
Apesar de reconhecer como positivo o facto de duas instituições públicas assumirem a formação de professores, a Uni-CV e o actual Instituto Universitário de Educação (IUE), podendo instituições privadas também intervir nesse domínio, Bartolomeu Varela considerou que isso acaba por criar outros problemas.
O mais importante, a seu ver, é o fraco aproveitamento dos recursos humanos, do potencial científico existente a nível das duas instituições para uma estratégia de formação de professores mais bem conseguida e que pudesse ser acessível a todos e nas diversas ilhas.

Na visão do professor, por estarem sedeadas na Praia, no Mindelo e até na Assomada, isso cria grandes dificuldades aos professores das outras ilhas que não podem se deslocar a esses centros urbanos, pelo que a formação à distância se impõem como uma grande prioridade, devendo-se investir em recursos, novas tecnologias de informação, formação de professores de ensino superior e adequado a esse nível, etc.
Bartolomeu Varela lamentou, entretanto, as reforma "decretadas” numa perspectiva de cima para baixo e sem auscultação dos professores, porquanto criam uma situação delicada, porque têm dificuldade em compreender o sentido e alcance das mesmas.
Aliás, as reformas têm um grande défice congénito, que é não estarem devidamente explicitadas, adiantou o professor, salientando que “não existe um documento público, do Estado, a explicitar o sentido e o alcance das reformas, até mesmo o conceito de reforma que se quer implantar no país”, o que cria muitas incertezas, dúvidas e vários problemas na sua implementação.
Destacou, contudo, que é graças aos professores que existem, “com défices consideráveis de qualificação e que se repercutem também na qualidade da educação, em relação à qual a sociedade tem estado muito crítica”, que o sistema educativo no período pós-independência evoluiu, contribuindo para uma mobilidade social ascendente, para um avanço considerável no combate à pobreza e na melhoria das condições de vida das pessoas e para a redução do analfabetismo a um nível residual.
Espera que as negociações em curso sobre o estatuto dos professores e outras reivindicações se traduzam em melhorias das condições de trabalho, de desenvolvimento profissional e de remuneração.
“Sem professores qualificados e motivados não temos um sistema educativo de alta qualidade, susceptível de nos fazer competir com outros sistemas educativos, até do mundo ocidental”, argumentou.
Bartolomeu Varela é um reformado "activo" da Uni-CV que, actualmente, trabalha ‘pro bono’ para esta universidade, lecionando, orientando alunos de pós-graduação e fazendo investigação.

Começou como professor do ensino básico, na Brava, ainda no período colonial com 18 anos, depois de concluir uma formação de quatro anos na escola de habilitação de professores, mas também foi professor do ensino secundário público e privado.

Ajudou a criar a Uni-CV, onde foi também administrador-geral, tendo sempre dado o seu contributo na elaboração da legislação nacional em matéria de educação, formação e ensino superior.
Dentre os vários cargos que desempenhou, merecem menção os de inspector da educação e de secretário-geral do Ministério da Educação.
AB
Inforpress/

Qualidade e Regulação da Educação - Práxis e perspetivas no contexto cabo-verdiano

Partindo do entendimento de que a educação, a diversos níveis, constitui um bem público essencial, ė imperioso que ela seja de qualidade, so...