sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Pressupostos e vias de integração do Instituto Pedagógico na Universidade de Cabo Verde *

1. Com mais este Fórum, denominado, desta feita, “Fórum Pensar o Instituto Pedagógico”, que decorre sob o lema “Melhorar para Servir”, o IP evidencia que, mais do que uma organização com provas dadas de sucesso na formação e capacitação de professores e outros profissionais do ensino básico, é uma instituição sólida e madura, capaz de, em cada contexto, reavaliar a sua missão e procurar as vias e formas mais adequadas para corresponder aos seus fins, de modo coerente e com uma visão estratégica – uma visão estratégica que procura explicitar, através de um intenso diálogo interno e com os parceiros, tendo em devida conta os anseios e demandas da sociedade. Nisso se distingue, também, uma "instituição qualquer" de uma instituição de excelência…

2. A possibilidade de integração do Instituto Pedagógico (IP) na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) chegou a ser objecto de reiterados pronunciamentos públicos por parte do Ministério da Educação e, no quadro dos preparativos para a criação da Uni-CV, foi encarada favoravelmente, tendo em conta que, à luz de diversos pressupostos ou critérios de análise e avaliação, o IP sempre se apresentou como uma mais-valia no processo de construção da universidade pública.

Vejamos, sucintamente, esses pressupostos:

a) Pressupostos científico-técnicos – O IP possui um substrato científico e técnico invejável, representado pelo seu capital humano e pela rede de parcerias que mobiliza nos planos nacional e internaciona;l

b) Pressupostos económico-financeiros – Além do seu orçamento privativo, o IP tem um mercado potencial que lhe permite ser sustentável económica e financeiramente;

c) Pressupostos de ordem logística e material – O IP possui instalações que poderiam servir de suporte ao desenvolvimento da estratégia de uma universidade em rede e acessível à sociedade cabo-verdiana;

d) Pressupostos sociais – Temos uma sociedade que demanda mais e melhor ensino básico, como suporte para o desenvolvimento sustentável e para o exercício da cidadania;

b) Pressupostos políticos – Ao que parece, existe vontade política no sentido de se apostar no desenvolvimento institucional do IP. Para se alcançar esse desiderato, uma das vias por excelência será a integração do IP no projecto da universidade pública;

Pressupostos jurídicos - A partir dos pressupostos anteriores, é possível dar corpo às premissas de ordem jurídica, de modo a viabilizar-se a integração ou associação do IP à Uni-CV.

3. Com a criação efectiva da Uni-CV, foi estabelecido um figurino jurídico de transição em que os institutos públicos de ensino superior sob a superintendência do membro do Governo responsável pela educação passam, automaticamente, e sem quaisquer formalidades, a constituir-se como unidades associadas da Uni-CV. Tal figurino está explicitado nº 1 do artº 50º, no artº 51º e na alínea c) do nº 1 do artº 52º dos Estatutos da Uni-CV, aprovados pelo Decreto-Lei nº 53/2006, de 20 de Novembro, ao abrigo dos quais o ISE e o ISECMAR se constituíram em unidades associadas da Uni-CV, com as seguintes particularidades:

- Os respectivos presidentes são membros do Conselho da Uni-CV no período de transição;
- A criação dos novos cursos, o provimento e o desenvolvimento profissional do pessoal em regime de carreira, a construção de infra-estruturas e a realização de investimentos são feitos no quadro da Uni-CV;
- Os actos de gestão praticados nos termos acabados de referir são feitos por despacho conjunto do Reitor e dos dirigentes máximos desses institutos.

4. Ora, apesar de ser um instituto público de ensino/formação sob a superintendência do membro do Governo responsável pela educação, o IP não pôde associar-se à Uni-CV nos mesmos termos que o ISE e o ISECMAR, em virtude de não ser um instituto do ensino superior.

5. Esclareçamos melhor o figurino jurídico do IP, para melhor compreensão das vias pelas quais deve equacionar-se o desenvolvimento institucional do IP, particularmente no que concerne à actualização da sua missão:

5.1- A Lei de Bases do Sistema Educativo (lei nº 103/III/90, de 29 de Dezembro, na redacção dada pela Lei nº 113/V/99, de 18 de Outubro), estabelece, no nº 2 do seu artº 64º, que “a formação inicial de educadores de infância e de professores do ensino básico será feita em instituições próprias do ensino médio”, ao contrário do que preconiza em relação aos docentes do ensino secundário (geral, técnico e artístico), os quais são formados em instituições próprias do ensino superior (nºs 3 e 4 do citado artº 64º).

5.2- Em conformidade com a LBSE, o Estatuto Orgânico do IP, aprovado pelo Decreto-Regulamentar nº 12/94, de 29 de Dezembro), define este instituto como um “estabelecimento de formação de nível médio (cf. artº 1º), atribuindo-lhe a missão de “promover a formação de profissionais de educação para o ensino básico com elevado nível de preparação nos aspectos científico, pedagógico, técnico, cultural e pessoal” (cf. alínea a) do artº 2º). NB Esta missão interpela à reflexão sobre o risco de esgotamento parcial (a prazo não longínquo) da capacidade de resposta do IP, em face da complexidade da formação de docentes para uma escolaridade básica que se generaliza e se quer de maior qualidade, face às exigências do exercício da cidadania e da integração na vida activa, na perspectiva da realização pessoal profissional e social dos cidadãos cabo-verdianos.

6. Ora, mantendo-se inalterado o status jurídico do IP, não podia este associar-se à Uni-CV, no período de transição a que se referem os Estatutos da Uni-CV (período de dois anos, prorrogável uma só vez) nos mesmos termos que o ISE e o ISECMAR, enquanto institutos públicos de ensino superior sob a superintendência do membro do Governo responsável pela educação.

7. Definido o problema (óbice legal de um instituto público de formação de docentes do ensino básico se constituir em estabelecimento de ensino superior), a solução do problema passa, obviamente, pela revisão do quadro legal vigente, de modo a superar-se o obstáculo.

8. Assim, caso se queira que o IP se associe à Uni-CV, nos mesmos termos que o ISE e o ISECMAR, já no período de transição da Uni-CV, é mister que, no plano jurídico, se tomem duas medidas, a saber:

8.1.Revisão do nº 2 do artº 64º da LBSE, de modo a se permitir que a “formação inicial de educadores de infância e de professores do ensino básico será feita em instituições próprias do ensino superior” ou, em alternativa, “em instituições próprias do ensino médio ou superior”. Esta alternativa (formar profissionais de ensino básico em instituições de nível médio ou superior) afigura-se engenhosa e de uma plasticidade tal que permite ao Estado deixar em aberto a possibilidade de, a par de escolas ou instituições de nível superior, haver instituições de nível médio a ministrar formação de profissionais para a educação básica. Na verdade, parece razoável que, num contexto temporal de transição, docentes e outros profissionais de educação básica afectos a determinado nível de escolaridade básica (por exemplo, do 1º ao 6º ano) continuem a ser formados em instituições de nível médio, enquanto que os que exercem a outro nível da escolaridade obrigatória (por exemplo, o denominado tronco comum do actual ensino secundário, que deverá generalizar-se, integrando a chamada escolaridade obrigatória de 8 anos) sejam formados em estabelecimento de nível superior. Este cenário alternativo de revisão da LBSE pode levar ou não à alteração do actual figurino do IP, tudo dependendo da opção política que prevalecer.

8.2.Revisão do Estatuto Orgânico do IP, aprovado pelo Decreto-Regulamentar nº 12/94, de 29 de Dezembro, no sentido de este instituto passar a definir-se como “estabelecimento de nível superior”. Note-se que esta alteração de figurino jurídico, ao possibilitar que o IP se integre na Uni-CV, como unidade associada, nos mesmos termos que o ISE e o ISECMAR, não significa, necessariamente, que o IP deixe de formar professores para os diversos níveis do ensino básico, com a possibilidade de atribuir diplomas conferentes de graus de nível superior e bem assim de diplomas não conferentes de graus, como, aliás, é frequente encontrar-se em educação comparada (NOTA: a Uni-CV, sendo uma instituição de ensino superior atribui diplomas ou certificados não conferentes de graus académicos). Certo é, todavia, que a revisão do Estatuto Orgânico do IP nos moldes referidos não impede que se opte pela existência de escolas públicas ou privadas de nível médio para a formação de professores e outros profissionais para o ensino básico.

9. Em alternativa às medidas assinaladas no ponto anterior, existe ainda a possibilidade de revisão pontual dos Estatutos da Uni-CV, nos seus artigos 50º a 52º, no sentido de se permitir que sejam unidades associadas da universidade os “institutos públicos de educação ou ensino que se encontram sob a superintendência do membro do governo responsável pela educação”.

Desta forma, o IP teria, em relação à Uni-CV, o mesmo status jurídico do ISE e do ISECMAR. Esta alternativa estaria em conformidade com a opção estratégica da Uni-CV em tirar partido das potencialidades existentes nesses institutos (e não só) para se transformar, cada vez mais, numa universidade em rede, acessível aos cidadãos dos diversos pontos do país (e não só). Por outro lado, permitiria optimizar as condições para o desenvolvimento das chamadas “formações pós-secundárias curtas”, área em que o IP já detém um reconhecido potencial.

De notar que esta alternativa não violaria a LBSE, na qual se estabelece que a formação de docentes e outros profissionais do ensino básico se realiza em instituições de nível médio. Efectivamente, a Uni-CV pode criar unidades de ensino (nomeadamente escolas) de diversos níveis, conferentes ou não de grau académico.

9. Mas os Estatutos da Uni-CV prevêem outros cenários de associação, com diferentes figurinos da entidade associada à universidade pública.

9.1. Um desses cenários, aplicável apenas no período de transição, não se ajusta ao figurino actual do IP, enquanto instituto de formação média. É o regulado no nº 2 do artº 50º, em que a unidade associada é um instituto de ensino superior público na dependência de outros departamentos governamentais, que não o da educação. Ao abrigo desse dispositivo legal, o INIDA associou-se a Uni-CV, prevendo-se que também o faça o INAG.

9.2. Outro cenário de associação, diferente do regulado para o período de transição da Uni-CV, é o que aparece explicitado no artigo 33º dos Estatutos da Uni-CV, que assim reza:

“1. As unidades associadas têm funções de ensino, investigação e extensão, cooperando com a Uni-CV em função da pertinência e adequação dos seus fins aos prosseguidos pela universidade, embora não integrem a orgânica da universidade.

2. Salvo o disposto no presente diploma, as unidades associadas mantêm com a Uni-CV relações de parceria institucional nos termos dos respectivos contratos de associação, assinados entre o Reitor e os respectivos dirigentes máximos.

3. Os contratos de associação a que se refere o número anterior definem as formas de colaboração, podendo incluir a possibilidade de partilha do pessoal docente e investigador e demais recursos, tendo em vista a boa prossecução de objectivos comuns”.

Note-se que esta norma não impõe como condição para se associar à Uni-CV que a instituição (necessariamente prossecutora de fins educativos) seja de nível superior. Assim, quer se proceda à revisão da LBSE e do Estatuto Orgânico do IP, quer não se vá para esse caminho, é possível, do ponto de vista jurídico, corporizar-se um determinado modelo de associação à Uni-CV, antes ou (sobretudo) depois do período de transição.

Efectivamente, é nosso parecer que esta norma não é aplicável apenas ao período subsequente ao da transição.

Também deve aplicar-se, inequivocamente, no período de transição, ainda que mediante um processo próprio de formalização da associação, que deverá traduzir-se na criação de uma modalidade específica e diferente de associação, sem prejuízo da excelência dos propósitos a serem acordados.

É certo que as normas transitórias dos Estatutos, constantes dos artigos 49º a 52º, por serem normas especiais, derrogam, em princípio, as normas gerais que disponham de modo diferente. O próprio artigo 49º dos Estatutos da Uni-CV, ao estabelecer que “as normas constantes do presente diploma referentes à estrutura e ao funcionamento da Uni-CV são objecto de adaptações nos termos dos artigos seguintes”, induz a essa interpretação.

Assim, quando, nos artigos 50º a 52º, os Estatutos da Uni-CV regulam a figura das unidades associadas em termos diferentes dos constantes das normas gerais (em que se inclui o artigo 33º), poderia entender-se que o legislador quis que, em relação ao figurino de associação com a Uni-CV no período transitório, deve prevalecer as normas constantes dos mencionados artigos 50º a 52º e não a do artigo 33º.

Com o devido respeito por eventual opinião contrária, entendemos que seria inútil tal interpretação. Não faz sentido que, por via dessa interpretação, se intente impedir a Uni-CV de, através de contratos de associação, estabelecer relações de parceria institucional com instituições (nacionais ou, mesmo, estrangeiras) que prossigam fins idênticos aos da universidade pública, sem se integrarem na orgânica desta. Se tal acontecesse, estar-se-ia a limitar a autonomia da Uni-CV e, designadamente, a faculdade que a lei lhe confere de “celebrar convénios, protocolos, contratos e outros acordos com instituições públicas ou privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais (nº 3 do artº 2º dos Estatutos da Uni-CV).

Assim, caso a Uni-CV e o IP entenderem por bem celebrar contratos de associação ao abrigo do artº 33º dos Estatutos da Uni-CV, podem fazê-lo, normalmente, tanto no período subsequente ao da transição, quer mesmo no período de transição.

Acontece, no entanto, que a associação do IP, neste cenário, processar-se-ia em moldes diferentes dos do ISE e do ISECMAR, ou seja:

- O presidente do IP não seria membro de pleno direito do Conselho da Uni-CV no período de transição;
- Não se aplicariam as regras relativas à criação dos novos cursos, ao provimento e ao desenvolvimento profissional do pessoal em regime de carreira, à construção de infra-estruturas e à realização de investimentos;

Poderá alegar-se que, ao abrigo do artigo 33º dos Estatutos da Uni-CV, o IP seria uma espécie de “filho de um Deus menor”, ao apresentar-se com um figurino jurídico diferente do dos demais institutos públicos de formação ligados sector da educação
Interessar-lhe-ia tal estatuto, neste momento?

Advertimos, entretanto, que, em condições normais e, em especial, no período subsequente ao da transição, esse vai ser o figurino geral de associação, pelo que não se colocará propriamente um problema se o mesmo for aplicado ao IP, quer no período de transição, quer no futuro (caso o IP se mantiver com personalidade jurídica e autonomia próprias, ou seja separado da Uni-CV).

10. Com efeito (e embora o nosso propósito seja introduzir ao debate sobre os pressupostos jurídicos da integração do IP na Uni-CV), devemos alertar para a possibilidade de o Estado pretender que, a par da Universidade Pública, exista, autonomamente, uma escola nacional de educação vocacionada especialmente para a formação de profissionais para a educação básica (professores, educadores de infância, gestores, supervisores, inspectores, etc.), nível de ensino de carácter obrigatório e tendencialmente gratuito, por imperativo constitucional.

11. Em suma, destacam-se duas vias conceptuais de participação do IP na universidade pública, a saber:

a) Constituir-se o IP em unidade associada da Uni-CV, já na fase de transição da Uni-CV, ao abrigo dos artºs 50º a 52º dos Estatutos da UniCV, ou seja, nos mesmos termos que o ISE e o ISECMAR, e na perspectiva da sua integração plena na universidade pública, após a transição (implica a revisão do quadro legal vigente);

b) Constituir-se o IP em unidade associada da Uni-CV, ao abrigo do artº 33º do Estatutos da Uni-CV, através de um contrato (de associação) que estabeleça as formas de parceria na realização de cursos, actividades de investigação e extensão (não implica a revisão do quadro legal vigente)…


12. A via de integração plena na Uni-CV, por implicar alteração do quadro legal, passa, em última instância, por uma decisão política, que deve ser suportada, obviamente, por cenários e estudos que assegurem a viabilidade e a sustentabilidade da opção.

13. Entretanto, entendemos que deve desmistificar-se a questão dos custos de associação à Uni-CV. Não no sentido de negar ou minimizar a sua indiscutível importância, mas de demonstrar, com dados objectivos, quais os custos da opção e as possibilidades de serem financiados de modo sustentável.

É, todavia, nossa convicção que a lógica do modelo universitário que se está a seguir é a de aproveitamento de sinergias, mediante a utilização racional e a rentabilização dos recursos.

A Uni-CV, através de uma lúcida reengenharia de processos de gestão, será, seguramente, menos dispendiosa que o conjunto das instituições públicas de formação pós-secundária e superior existentes funcionando nas actuais condições, ou seja, de forma autónoma. Mas esta é uma hipótese que se deverá confirmar (ou infirmar) com estudos (dados e números, que falarão por si).

Praia, 4 de Outubro de 2007.

Bartolomeu Varela
*Texto de base da Comunicação no Fórum “Pensar o Instituto Pedagógico – Melhorar para Servir”, proferida em 4.10.2007.

segunda-feira, 30 de julho de 2007

AS PARCERIAS NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM CABO VERDE: UMA APOSTA PARA O SUCESSO! *


1. Aposta na Formação: alternativa a uma educação fracassada ou um novo paradigma de Qualificação dos Recursos Humanos?

Para alguns, a ênfase que vem sendo colocada na Formação Profissional, enquanto aposta estratégica e via incontornável para a modernização das economias e o fomento da empregabilidade, não deixa de representar a confissão implícita de um fracasso ou, ao menos, de uma crise monumental: a crise dos sistemas educativos.

Na verdade, entendem, a Educação de sucesso implica e envolve preparação para o exercício de uma profissão, ou seja, tem como fim último a Formação Profissional. Nesta perspectiva, a necessidade de criar um sistema de Formação Profissional dever-se-á ao facto de que o sistema educativo não satisfaz às demandas da economia e da sociedade, não preparando adequadamente para a vida activa…

Realmente, na sua concepção mais avançada, a Educação é um processo através do qual os indivíduos, através do acesso ao conhecimento e ao saber, adquirem competências para a vida. Daí que, facilmente, se dê conta de que a educação implica a formação. Assim o foi desde o surgimento da sociedade humana, havendo mesmo quem defenda que a educação-formação está na origem do surgimento do próprio homem como entidade distinta dos restantes animais. A luta conjunta dos homens primitivos para a sobrevivência; a invenção de signos linguísticos e sua utilização na comunicação; a descoberta e a utilização do fogo (para alimentação, aquecimento, iluminação, etc.), a descoberta e a prática da agricultura e da pecuária – tais são alguns factos históricos que, tendo conduzido à promoção da humanidade, só foram possíveis através da praxe educacional, que há de prosseguir, por via da tradição, de geração para geração…

Hodiernamente, as teses mais avançadas sobre a educação convergem no sentido de que uma educação pautada pela excelência tem que cumprir cinco funções essenciais, que desenvolvemos noutro local, a saber:
a) Desenvolver intelectual, moral e socialmente os alunos, sejam eles crianças ou adultos;
b) Promover o desenvolvimento da cultura geral;
c) Desenvolver e promover a aquisição de mecanismos ou automatismos básicos de aprendizagem; d) Formar e capacitar para a vida activa e para o exercício da cidadania;e) Promover a orientação vocacional e preparar os cidadãos para o exercício de uma profissão.

A última função da educação reconduz-nos à questão inicial: a formação profissional será componente ou corolário de uma educação bem sucedida.

As políticas de educação e de formação, concebidas e implementadas por departamentos governamentais diferentes, têm levado, amiúde, à exacerbação das disparidades entre a educação e a formação, quando as mesmas não podem ser consideradas como mundos à parte, “a se”, mas sim como actividades afins ou, no mínimo, absolutamente complementares.

As acções e medidas de política no sentido de se promover uma articulação estreita entre a educação e a formação; as reformas conducentes à criação de condições para que o chamado sistema de ensino formal, sobretudo a nível secundário ou pós-secundário, desenvolva a componente da formação técnicoprofissional; o estabelecimento de mecanismos de transição e de de equivalências entre o sistema formal de ensino e o sistema de formação profissional – tais são algumas das opções de políticas públicas que traduzem um novo paradigma de abordagem da problemática de qualificação dos recursos humanos.

É esse o paradigma adoptado em Cabo Verde.

À luz desse paradigma, importa que se avance em duas direcções que não são opostas mas convergem no mesmo sentido:

Por um lado, importa que as reformas educativas aprofundem o significado pleno da abordagem por competências, fazendo com que as escolas, no desenvolvimento da acção educativa, saibam:

- Aliar o saber universal ao conhecimento aprofundado e progressivo da realidade em que os educandos se inserem e que deverão transformar;

- Assegurar a ligação entre a teoria (o conhecimento científico), a pesquisa e a prática, relevando a utilidade, a validade e pertinência social dos saberes;

- Potenciar a inovação e a aprendizagem social;

- Colocar, em suma, a necessária ênfase nas seguintes regras de ouro da aprendizagem que são “aprender a aprender”, “aprender a ser”, “aprender a empreender” e “aprender a desaprender”!...

Por outro lado, o sistema de formação profissional, que se orienta no sentido do desenvolvimento da capacidade empreendedora dos indivíduos, deve articular-se com o sistema educativo, quer na perspectiva da transição entre os dois sistemas, quer no sentido da complementaridade de ambos…

A esta luz, a formação profissional apresenta-se como uma opção ou uma via credível para o sucesso dos indivíduos, tanto no plano pessoal como no social …

2. As parcerias e sua relevância na Formação Profissional

As parcerias nacionais e internacionais, nas suas diversas combinações (parcerias entre organizações públicas; parcerias entre entidades privadas e parcerias entre organizações públicas e privadas) encontram-se muito em voga, na actualidade.

Em Cabo Verde, as parceiras público-privadas, que se assentam numa tradição secular em processo de profunda mutação (o chamado “djunta mó”) não resultam apenas de uma tomada de consciência (porventura tardia) de que é impossível aos poderes públicos, de forma isolada, fazerem face e com sucesso, aos desafios inerentes ao processo de transformação e de desenvolvimento do país.

Tais parcerias constituem, na verdade, uma exigência natural do processo de desenvolvimento, só possível se assumido pela sociedade, no seu todo…

No domínio da formação profissional, as parcerias (envolvendo o Estado, as autarquias, as empresas, os formandos e outras entidades) estão largamente acolhidas no ordenamento jurídico e têm estado presentes em diversos programas e projectos de governação e de gestão empresarial. Este facto deriva do reconhecimento da necessidade da Formação Profissional, enquanto via incontornável para que, mediante a transformação do homem cabo-verdiano em capital humano, se alcancem objectivos estratégicos, a saber:

a) Desenvolver a capacidade empreendedora da sociedade;
b) Garantir a performance da economia;
c) Promover o sucesso dos empreendimentos e negócios;
d) Assegurar a empregabilidade e a competitividade dos indivíduos no mercado de trabalho;
e) Garantir a sustentabilidade do progresso;
f) Promover a realização pessoal e social dos indivíduos.

É, com efeito, pela via da Formação Profissional que se criam condições para que se logre a eficiência e a eficácia da economia e das empresas, condição necessária para que se possam gerar empregos que assegurem a realização pessoal e social dos indivíduos, nomeadamente dos que procuram o primeiro emprego ou optimizar as condições de sua integração no mundo laboral, cada vez mais exigente e competitivo.

A aposta estratégica na Formação Profissional só será bem sucedida na medida em que for assumida como desafio de toda a sociedade e, em particular, das empresas.

Ora bem, o sucesso dos empreendimentos e negócios é largamente tributário da qualidade da Formação Profissional.

Interessa, pois, aos empresários de sucesso que apostem na qualificação e no aperfeiçoamento permanentes dos recursos humanos.

Se a excelência nos negócios constitui um desafio permanente, tal excelência só é possível através da Qualificação, razão por que a Formação Profissional encontra ou deve encontrar nas empresas os seus mais fiéis e dilectos promotores….

Fiquemos, no entanto, cientes do seguinte: as parcerias não são sinónimas de dádivas. As parcerias implicam partilha: dar e receber. Por mais filantrópica que seja uma empresa ou instituição, a sua participação num projecto, como parceira, não é propriamente desinteressada. Existe sempre a expectativa de um retorno, mesmo que a motivação não seja a obtenção de dinheiro! É esse interesse, quer sob a forma de lucro económico ou de lucro social (ampliação do prestígio no meio, angariação de simpatia ou boa imagem, satisfação de realizar algo socialmente útil, etc), que serve de leitmotiv para a participação num dado projecto. Assim, o simples desejo de fazer de uma escola degradada uma escola nova e bem sucedida é já, de per si, um interesse, uma motivação suficientemente forte para justificar a parceria de uma empresa.

Daí que a estratégia de mobilização dos parceiras deva ser aprimorada, utilizando-se, para o efeito, princípios, regras e técnicas, que são, de há muito, objecto de estudo. Não vamos alongar-nos nesta matéria, mas sempre diremos que o envolvimento do parceiro deve fazer-se em relação a todas as etapas do processo em que ele, de algum modo, participa: da concepção de um projecto à sua implementação, gestão e avaliação. Assim se valorizará o parceiro que não se sentirá suficientemente motivado em “dar” ou “financiar” algo. Se é parceiro, deve ser parte do processo, de forma tão abrangente quanto possível ou recomendável!...

Cabo Verde apostou, decidida e irreversivelmente, no desenvolvimento de uma economia de base privada. Assim, se ao Estado incumbe regular o mercado, estimular e promover os empreendimentos (induzindo, desta forma, à empregabilidade), cabe às empresas, em última instância, assegurar que a economia se desenvolva de forma sustentável e, desta forma, garantir o sucesso da luta contra a pobreza e o desemprego, os dois maiores problemas nacionais. Porém o sucesso das empresas está largamente da aposta consequente que fizerem na formação do seu pessoal, ou seja, na Formação Profissional.

Como dizia Bill Gates, a maior riqueza da sua poderosa Microsoft Corporation, era o pessoal da empresa, devidamente qualificado e altamente motivado, e não os biliões que obtinha dos negócios. Pois, afinal, os biliões são criados pelo trabalho competente e inovador do seu pessoal…


Bartolomeu Varela
* Extractos de uma conferência proferida no “Centro de Formação Profissional da Variante”, de São Domingos, no dia 14 de Julho último, no âmbito da comemoração do primeiro aniversário desta instituição de formação.


sexta-feira, 27 de julho de 2007

Ei-los que partem… os finalistas!


“Flores da nossa luta, razão do nosso combate… O mais maravilhoso que há no mundo. Devemos dar-lhes o melhor que temos”! Assim se referia Amílcar Cabral às crianças, no seu tempo, que é também o nosso tempo, tanto mais que as suas palavras expressam um pensamento e uma orientação que continuam actuais.

Assim pensava eu quando assistia, dias atrás, a uma festa de finalistas do jardim infantil que o meu filho Márcio frequentou nos últimos dois anos, cumprindo uma etapa importante da sua vida: a de socialização no ambiente educativo extra-familiar e de propedêutica para a iniciação escolar propriamente dita, que tem lugar no ensino básico.

Gostei, particularmente, da opção feita em relação ao traje para a festa dos finalistas: em vez de trajes de um dia que, depois, são deitados fora, os finalistas apresentaram-se vestidos com o uniforme que vão utilizar, daqui a meses, como alunos do ensino básico, o que representa uma poupança aos bolsos das famílias. Bela ideia, sem dúvida!

Todos dizemos que virou moda a festa de finalista, não sendo poucos os que criticam esta moda, que outrora só era praticada no fim do ensino secundário ou, sobretudo, de um curso superior!

O cabo-verdiano gosta de festas! É isso que, segundo outros, explica tanta festa de finalistas!
Realmente, o cabo-verdiano adora festas: o nascimento de um filho, o 7º dia do nascimento (“Dia do Sete” ou de “Guarda-cabeça”, para esconjurar perigos ocultos!), casamento, baptizado, regresso de emigrante, dia de município, dia de santo padroeiro de freguesia, dia de Natal, dia de Fim-de-Ano, dia de Páscoa… Já imaginou em quantas festas o cabo-verdiano participa em cada ano?

Não há dúvida que, não poucas vezes, há um enorme exagero nos gastos com festas! Mas convenhamos que é também com festas (dentro dos limites, é claro) que se constrói a felicidade! A alegria de viver, bem patente nas festas, pode ser um lenitivo ou um incentivo para enfrentar as dificuldades da vida e obter, pelo trabalho honesto, recursos para serem investidos em muitos projectos, incluindo … novas festas!

Mas voltemos à festa de finalistas do jardim do meu filho caçula (ver imagem neste blog).

Simples moda ou expressão da cultura de um povo dado a festas, foi maravilhoso assistir a essa festa de finalistas e, assim, poder testemunhar como os pupilos daquele jardim-de-infância e candidatos ao ensino básico encaravam esse dia de finalista, que marca uma etapa importante na sua vida: muito entusiasmo, muita alegria e, vejam lá, muita seriedade!

Deixá-los festejar, porque não lhes falece motivo para tanto!- pensava eu, enquanto assumia o papel de repórter da festinha, além do de pai!

Vencendo a primeira etapa, irão vencer as outras, com novas festas de finalistas a coroar os êxitos académicos! Festas que valem sempre a pena, sobretudo se o culminar de cada etapa se traduzir em ganhos efectivos, em prol do progresso social e individual, prova final do sucesso da obra educativa que se desenvolve em Cabo Verde.

Ei-los que partem, os finalistas, para novas etapas e novos desafios na sua vida académica e social, em que a alegria de viver deve estar presente, a par de uma postura responsável que deve caracterizar a vida estudantil e, em geral, a vida societária.

Bartolomeu Varela

terça-feira, 8 de maio de 2007

Educação em Direitos Humanos: de que se trata?

Educação em Direitos Humanos parte de três pontos essenciais: primeiro, é uma educação de natureza permanente, continuada e global. Segundo, é uma educação necessariamente voltada para a mudança. Terceiro, é uma "inculcação" de valores, para atingir corações e mentes e não apenas instrução, meramente transmissora de conhecimentos. Acrescente-se, ainda, e isto não é menos importante, que ou esta educação é compartilhada por aqueles que estão envolvidos no processo educacional – os educadores e os educandos - ou ela não será educação e muito menos educação em direitos humanos. Estes pontos são premissas: a educação continuada, a educação para a mudança e a educação compreensiva (no sentido de ser compartilhada e de atingir tanto a razão quanto a emoção). Clique no título para ter acesso ao texto completo, um artigo de Maria Victoria Benevide.

terça-feira, 1 de maio de 2007

Educação para Cidadania no Currículo

A escola é um lugar ou, melhor, uma instituição de aprendizagem e convivência social que deve oferecer, a quem a ela acede, não apenas um espaço físico e um espaço organizacional, mas também, e sobretudo, um espaço relacional, de convivência, cooperação e de resolução de conflitos, de desenvolvimento de competências para o exercício da cidadania. Ao integrar a Educação para a Cidadania no currículo escolar, propugna-se que a escola ensine os alunos a fazer uso do conhecimento e da informação para a compreensão da realidade, posto que o conhecimento ajuda a promover cidadãos mais participativos e interventores na sociedade.

Clique no título para ter acesso ao texto completo.

Finlândia: um exemplo de um sistema de ensino nórdico

É impossível não tomar como referência o sistema de ensino de um país cujas tradições democráticas devem ser um exemplo para todos os países europeus, e não só, e cujo nível de literacia da população ascende, virtualmente, aos 100%.

Clique no título para ter acesso ao texto completo.

Finlândia é nota dez em educação

Finlândia é nota dez em educação! Veja como o país produziu o sistema educativo mais eficiente do mundo numa resportagem de Carmen Morán, Enviada especial a Helsinque, para o EL PAÍS, em 23 de dezembro, 2004 ".

REORGANIZAÇÃO CURRICULAR DO ENSINO BÁSICO

É intenção deste texto trazer à reflexão e ao debate algumas ideias sobre os princípios e os desafios que acompanham a actual reorganização curricular do ensino básico em Portugal, e que coincidem com um modelo caracterizado pela concepção de currículo como projecto, isto é, como algo que se afasta das meras prescrições programáticas do país...
Clique no título para ter acesso ao texto completo, um trabalho de Carlinda Leite

Perrenoud - Dez novas competências para uma nova profissão

Para Perrenoud, eis as dez mais importantes competências profissionais para os professores:
Organizar e estimular situações de aprendizagem; gerar a progressão das aprendizagens; Conceber e fazer com que os dispositivos de diferenciação evoluam; envolver os alunos em suas aprendizagens e no trabalho; trabalhar em equipa; participar da gestão da escola; informar e envolver os pais; utilizar as novas tecnologias; enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; gerar sua própria formação contínua.

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Perrenoud - Construindo competências

Competência é a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, capacidades, informações etc) para solucionar com pertinência e eficácia uma série de situações - diz Perrenoud.
Leia esta entrevista, de manifesta actualidade (basta um clique no título para ter acesso ao texto completo)

terça-feira, 3 de abril de 2007

Breve reflexão sobre o ensino privado em Cabo Verde



I. A massificação do ensino à escala planetária e as exigências das reformas educativas

Encarado, defendido e promovido à escala planetária como um dos mais importantes Direitos Humanos, o direito à educação tem ganho efectividade crescente, encontrando consagração no ordenamento constitucional de numerosos países como um Direito Fundamental dos cidadãos.

Na verdade, a massificação da educação é um fenómeno mundial que deriva do reconhecimento da educação/formação como uma condição imprescindível ao progresso material ou, dito de outro modo, como uma exigência incontornável para a promoção de um efectivo desenvolvimento humano.

Tal fenómeno tem levado a reformas profundas dos sistemas educativos, de modo a assegurar-se a garantia do acesso equitativo aos diversos níveis de ensino de forma sustentável e com níveis elevados de qualidade.
Alguns princípios e opções têm marcado os processos de reforma das políticas educativas à escala planetária, a saber:
a) O reconhecimento de que a obra educativa não é tarefa exclusiva do Estado mas de toda a sociedade;
b) A comparticipação crescente da sociedade no financiamento e na gestão da educação;
c) A coexistência nos sistemas educativos de dois subsistemas paralelos e complementares, a cargo, dos sectores público e privado (incluindo-se no sector privado o papel das cooperativas);
d) A consideração do ensino privado como uma alternativa credível ao ensino público e um valioso complemento deste, capaz não apenas de oferecer à sociedade um serviço educativo ao nível do praticado nos estabelecimentos públicos mas também de criar ofertas formativas inovadoras, de modo a criar-se uma competitividade sadia e a fazer com que toda a sociedade saia a ganhar com a diversidade de ofertas e a elevação desejada do nível geral do ensino praticado.

II. A massificação do acesso ao ensino em Cabo Verde e o contributo do ensino privado

Cabo Verde não tem estado alheio ao processo de massificação do ensino e aos desafios que coloca, nomeadamente em termos de resposta sustentável e com a necessária qualidade às demandas. Por outras palavras, “um dos maiores problemas do Sistema Educativo Cabo-verdiano reside no enorme desfasamento existente entre as expectativas sociais, em termos de procura social da educação, e a capacidade do mesmo Sistema em dar resposta a essas expectativas[1]”.

Mas o cerne da questão não reside somente na garantia do acesso à educação, desde a educação pré-escolar ao ensino superior, tarefa de per si colossal, pelos investimentos que implica em diversas direcções (criação de infra-estruturas; qualificação do pessoal docente, técnico, administrativo e auxiliar; adequação dos curricula e materiais didácticos, etc.).

Com efeito, se à luz do ordenamento jurídico cabo-verdiano, a educação ascende à categoria de direito público subjectivo (o direito individual de fruição da educação), importa que a democratização do acesso à educação seja acompanhada da garantia de prestação de um serviço educativo pautado pela excelência. Dito de outro modo, no contexto actual e nos próximos anos, Cabo Verde deve preocupar-se não só em garantir aos seus cidadãos o acesso equitativo à educação mas sobretudo proporcionar o acesso equitativo de todos a uma educação de qualidade e pautada pelo princípio da pertinência social das aprendizagens.

Vencer os grandes desafios da educação constitui um desiderato que a todos (toda a sociedade) concerne, tendo em conta o seu papel decisivo nos processos de transformação social no sentido da modernidade, do desenvolvimento e do progresso.

A aposta num modelo de desenvolvimento de Cabo Verde promotor da livre iniciativa dos cidadãos não poderia deixar de se reflectir, de modo consequente, na abertura da educação, nos diversos níveis, à iniciativa privada, que deve ser encorajada e apoiada, mas também avaliada no seu desempenho, de modo a acautelar-se a qualidade do serviço educativo prestado à sociedade.

Conhecendo-se a opção constitucional no sentido de o Estado assegurar um ensino básico obrigatório e tendencialmente gratuito e sabendo-se que a mesma opção é seguida a nível da alfabetização e educação de adultos, tendo em vista a meta da erradicação do analfabetismo, admite-se que apenas estes dois subsistemas oferecem, à partida, menor campo de actuação ao sector privado, se bem que a este não esteja vedado apresentar ofertas educativas a esses níveis. Aliás, como se sabe, existe, ainda que mui escassa, iniciativa privada no ensino básico.
Já a outros níveis, o ensino privado vem ganhando espaço significativo, a ponto de as estatísticas apontarem para uma participação algo expressiva de entidades privadas na educação pré-escolar, no ensino secundário e no ensino superior.

Entretanto, apesar de ser de criação muito mais recente que o ensino secundário privado, o ensino superior privado [2] tem vindo a conhecer uma grande expansão: no ano lectivo 2002/2003, abarcava um total de 44% dos estudantes e de 42% dos cursos de nível superior, à escala nacional, contribuindo para se acentuar progressivamente a diminuição da percentagem da frequência no exterior de cursos de graduação a nível do bacharelato e da licenciatura, seguindo uma tendência inversamente proporcional ao crescimento previsto do ensino superior em Cabo Verde, na sua totalidade, de acordo com os cenários projectados no Plano Estratégico da Educação. É assim que, neste particular, se registou uma situação de equilíbrio no ano lectivo 2004/2005 para, a partir de então, se registar uma maior frequência do ensino superior no território nacional.

Sem que seja nosso propósito deter-nos na explicação das causas da tendência para uma situação actual de relativo equilíbrio entre os sectores público e privado de ensino superior, em termos de oferta e frequência de cursos, é evidente que a diferença no acesso ao ensino secundário público e privado (este representava, em 2002/2003, cerca de 13% do total dos efectivos) tem a ver com a tendência para a progressiva generalização do ensino secundário público, devido, por um lado, ao aumento considerável do número de estabelecimentos públicos de ensino secundário e, por outro lado, à manutenção de um regime de propinas que, embora considerado gravoso por alguns sectores, está, entretanto, longe de corresponder aos custos reais desse nível de ensino, parâmetro que serve de base ao estabelecimento de propinas no ensino secundário.

Assim, por via de condicionalismos vários, o ensino privado, sobretudo a nível secundário, tem assumido, essencialmente, um papel de “complemento” do secundário público, não chegando ainda a uma situação de verdadeira “paridade” com este último, como já se verifica a nível superior. Retomamos este assunto mais adiante.

III. Considerações gerais sobre o enquadramento jurídico do ensino privado

A expansão da educação, embora se tenha feito acompanhar da regulação jurídica de uma série de questões relacionadas com a obra educativa, protagonizada por instituições e agentes vocacionados dos sectores público e privado, não conduziu ainda à regulação cabal de uma série de questões, de entre as quais avultam as que se pretendem com o funcionamento do sector privado do ensino.

Em todo o caso, passos importantes foram dados, a começar pela ordem constitucional vigente, que consagra normativos que fundamentam e legitimam a iniciativa privada no ensino a todos os níveis, como referimos acima.

A seguir à Constituição, destaca-se, pela sua hierarquia e importância, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), enquanto referência incontornável para a conformação e a garantia efectiva do Direito à Educação[3]. Posicionando-se logo a seguir às normas constitucionais, como acaba de ser dito, esta lei serve de referência às demais leis e normas relativas à educação em Cabo Verde, pelo que o seu estudo aprofundado se reveste da maior importância.

Estruturante do sistema educativo cabo-verdiano, a LBSE dispõe, no nº 6 do seu artigo 76º, que as condições e critérios a que deve obedecer o funcionamento do ensino privado devem constar de um diploma próprio (o “estatuto do ensino privado”), nos termos do qual é autorizado o exercício privado do ensino.

Acontece, entretanto, que o Estatuto do Ensino Privado aprovado Decreto-Lei nº 17/96, de 3 de Junho só contemplou o ensino privado ministrado nos estabelecimentos de educação e de ensino dos níveis pré-escolar, básico e secundário, não regulando os níveis médio e superior.

Esta situação manteve-se inalterado até que, em Outubro de 2005, o Governo fez publicar o Decreto-Lei nº 65/2005, de 24 de Outubro, que define um conjunto de regras a que devem obedecer, transitoriamente, a criação e o funcionamento de estabelecimento de ensino superior privado, deferindo-se para um futuro breve a aprovação do Estatuto do Ensino Superior Privado[4].

Assim, durante um interregno de quase uma década, registou-se um vazio de regulação jurídica do ensino superior privado. Na ausência de um “estatuto do ensino superior privado”, o Governo entendeu por bem seguir duas vias diferentes para obviar a instalação de instituições de ensino superior privado em Cabo Verde:
a) No caso da Universidade Jean Piaget, com sede na capital, o Governo utilizou a via legislativa para, por um lado, definir os princípios de actuação da Universidade Jean Piaget de Cabo Verde e, por outro, autorizar o Instituto Jean Piaget a exercer actividade em Cabo Verde. Para o efeito, fez publicar, a 7 de Maio de 2001, os Decretos-Leis nºs 11 e 12/2001, respectivamente;
b) No caso do Instituto Superior Isidoro da Graça, com sede em Mindelo, o Governo utilizou a via administrativa para conceder a necessária autorização para o funcionamento desse instituto. Assim, pela Resolução nº 12/2003, de 9 de Junho, do Conselho de Ministros, é autorizada a Graça Empreendimentos, SA, a exercer ensino superior privado em Cabo Verde através do Instituto de Estudos Superiores Isidoro da Graça (IESIG).

Porque duas opções diferentes? Eis a questão que se nos coloca. E qual das duas será a melhor?

A resposta cabal a estas questões exigiria longa dissertação, que não cabe lugar aqui e agora, pelo que, de forma sucinta, fiquemo-nos pelas seguintes notas:

- Em princípio, ambas as instituições deveriam ter sido criadas ou autorizadas a exercer actividade em Cabo Verde após a aprovação do Estatuto do Ensino Superior Privado ou da aprovação de um novo “Estatuto do Ensino Privado”, que contemplasse os diversos subsistemas de ensino, incluindo o superior, com as tais “regras de jogo” balizadoras da iniciativa privada no ensino;
- No caso da Universidade Jean Piaget, na falta de norma legal habilitante no Estatuto do Ensino Privado, o legislador terá procurado uma saída airosa, ao proceder à autorização do seu funcionamento em Cabo Verde mediante um diploma legal, onde vêm plasmados os princípios a que deve obedecer a actuação da referida instituição no país;
- Em relação ao caso IESIG, aparentemente, o Governo seguiu a via recomendada pela doutrina: a autorização para a actuação de uma determinada entidade privada releva da competência administrativa do Governo, pelo que a Resolução seria a forma de acto apropriada. Simplesmente, não há exercício de competência administrativa sem suporte legal e, no caso em apreço, o Governo não tinha uma lei habilitante para proferir a referida resolução.

Concluindo, os estabelecimentos de ensino superior privado surgidos no primeiro lustro desta década foram criados através de autorizações casuísticas concedidas pelo Governo, quando seria mais salutar, e mais condizente com os princípios por que se rege um Estado de Direito Democrático, que os princípios e regras básicos norteadores do processo de criação, organização e funcionamento do ensino superior privado fossem preestabelecidos, mediante diploma próprio que, deste modo, conformaria, de forma clara e transparente, as “regras de jogo” a que deveriam sujeitar-se todos os promotores do ensino privado.

Em todo o caso, registe-se, como nota positiva, o facto de o actual Governo ter preenchido o vazio jurídico outrora existente, estabelecendo a normalidade possível na regulação do subsistema do ensino superior, que continua a padecer da falta de um regime jurídico geral consentâneo com a realidade e as exigências de desenvolvimento do país e as tendências da hodiernidade.

Nos pontos que se seguem, analisamos a legislação por que se rege o ensino privado a diversos níveis.

IV. Regime jurídico da educação privada a nível pré-escolar, básico e secundário[5]

Após uma década de aplicação, o Estatuto do Ensino Privado aprovado pelo Decreto-Lei nº 17/96, a 3 de Junho, revelou-se desajustado à realidade do sistema educativo cabo-verdiano, em muitos aspectos, confirmando-se insuficiente face às novas exigências.

Assim, reconhecida a relevância do papel dos estabelecimentos de ensino privado, que ampliam as possibilidades de acesso à educação e formação dos cabo-verdianos, complementando o papel do Estado na realização de um dos mais importantes direitos humanos (o direito à educação), foi aprovado o Decreto-Lei nº 32/2007, de 3 de Setembro, que instituiu o novo Estatuto do Ensino Privado de nível não superior, ou seja, aplicável aos estabelecimentos de ensino pré-escolar, básico e secundário, compreendendo, em relação a este último, as vias do ensino geral e do ensino técnico.
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Nos termos do diploma, considera-se: ensino privado o que é ministrado por pessoas singulares, cooperativas e outras pessoas colectivas privadas; estabelecimentos de ensino privado as instituições criadas por pessoas singulares, cooperativas ou outras pessoas colectivas privadas para ministrar o ensino colectivo privado, incluindo-se as instituições criadas por organizações religiosas para ministrar o ensino colectivo privado.

O diploma não se aplica aos estabelecimentos de ensino superior, ao ensino individual e doméstico e ao ensino religioso, nem tampouco ao ensino ministrado em escolas de formação de quadros de partidos políticos, de organizações políticas e de organizações religiosas. O diploma não se aplica igualmente aos estabelecimentos de ensino de Estados estrangeiros, nos quais sejam ministrados programas não aprovados pelo Ministério da Educação; às actividades de cariz social desenvolvidas, pelos centros de juventude, Câmaras Municipais e Organizações Não-Governamentais (ONG’s), aos estabelecimentos em que se ministre ensino intensivo, que é objecto de regulamentação própria, ou simples treinamento em qualquer técnica ou arte, o ensino prático das línguas, a formação profissional ou a extensão cultural.

Nos termos deste diploma, a criação de estabelecimentos de ensino privado depende de despacho do membro do Governo responsável pela área da Educação, precedendo o parecer da Direcção-Geral do Ensino, da Inspecção-Geral da Educação e da Delegações do Ministério da Educação das respectivas áreas.

Sem prejuízo da sua competência fiscalizadora geral, as escolas privadas que Beneficiam de qualquer dos apoios previstos na presente secção ficam especialmente sujeitos a inspecção pedagógica, financeira e administrativa do Estado, através da Inspecção-Geral da Educação

O Estado pode celebrar contratos com estabelecimentos de ensino privado que se localizam em zonas carenciadas de escolas públicas e se integram nos objectivos gerais da política e acção educativas do sistema. O Estado pode igualmente celebrar contratos com estabelecimentos de ensino privado localizados em zonas não carenciadas de escolas públicas, desde que se integrem nos objectivos referidos na última parte do número anterior.

Pode, ainda, o Estado celebrar contratos com estabelecimentos de ensino privado em que sejam ministradas matérias diferentes das dos programas oficiais, no quadro de experiências pedagógicas, ou que se proponham a criação de cursos com planos próprios. Os contratos especificarão os direitos e as obrigações recíprocas, em particular as obrigações da escola, como contrapartida dos apoios recebidos.

Distinguem-se no diploma em apreço dois tipos de contratos que o Estado pode celebrar com estabelecimentos de ensino privado: de associação e de patrocínio. Tais contratos podem ter duração plurianual e abranger alguns ou todos os níveis ou modalidades de ensino ministrados na escola.

Os contratos de associação têm por fim assegurar a frequência do ensino nas mesmas condições do ensino público e constituem o Estado na obrigação de conceder às escolas privadas abrangidas um subsídio de funcionamento anual, cuja fixação e actualização são feitas por portaria conjunta dos Membros do Governo responsáveis pelas áreas da Educação e das Finanças.

No caso do Ensino Básico obrigatório, são obrigações dos estabelecimentos de ensino privado outorgantes nos contratos de Associação: garantir a sua gratuitidade, nas mesmas condições do ensino público; divulgar o regime do contrato e a gratuitidade do ensino ministrado; garantir, até ao limite da lotação, a matrícula aos interessados, preferindo sucessivamente os alunos que pertencem ao mesmo agregado familiar, os residentes na área e os de menor idade; prestar contas ao serviço competente do Ministério da Educação, através de balanço e contas anuais, dos recursos públicos que lhes forem afectos.

Os contratos de patrocínio são celebrados entre o Estado e entidades titulares de escolas privadas quando a acção pedagógica, o interesse pelos cursos, o nível dos programas, os métodos e os meios de ensino e a categoria do pessoal docente o justifiquem. O objectivo dos contratos de patrocínio é estimular e apoiar o ensino privado em domínios não abrangidos ou insuficientemente abrangidos pelo ensino público, nomeadamente a criação de cursos com planos próprios e a inovação pedagógica.

No âmbito dos contratos de patrocínio, o Estado pode, em função da relevância dos cursos, obrigar-se, nomeadamente, a reconhecer o valor oficial dos títulos e diplomas emitidos pelas escolas; definir a equivalência dos cursos ministrados a cursos oficiais; definir as regras de transferências dos alunos para outros cursos; acompanhar a acção pedagógica das escolas; suportar uma percentagem das despesas de funcionamento das escolas.

Pelos contratos de patrocínio, as escolas abrangidas obrigam-se a divulgar o regime do contrato e, quando seja o caso, a estabelecer as propinas e mensalidades nos termos acordados e entregar no ao serviço responsável pela elaboração e execução de orçamento da Educação balancetes trimestrais e o balanço e contas anuais.

Independentemente da celebração de contratos e dos apoios estabelecidos nos mesmos, o departamento governamental responsável pela área da Educação pode conceder às escolas privadas que se integram nos objectivos do sistema educativo, além de apoios de natureza pedagógica subsídios especiais de arranque, de apetrechamento e outros devidamente justificados. Pode ainda o referido departamento governamental pode integrar os docentes do ensino privado em acções de formação profissional de docentes, desde que reúnam as mesmas condições exigidas aos docentes do ensino público. Os apoios e subsídios referidos devem ser requeridos ao serviço responsável pela elaboração e execução do orçamento da Educação até 31 de Março de cada ano, com vista ao ano escolar seguinte.

As escolas privadas que ministrem ensino colectivo que se enquadre nos objectivos do sistema educativo, podem ser consideradas pessoas colectivas de utilidade pública, a seu pedido ou por iniciativa do ministério da educação.

Os estabelecimentos de ensino privado, devem elaborar os seus estatutos, que, no respeito da lei, defina, os seus objectivos, a estrutura orgânica, o seu modelo de organização e a distribuição de competência pelos respectivos órgãos. Os estatutos das escolas privadas são homologados pelo membro do Governo responsável pela educação.

Os critérios e o processo de avaliação dos alunos do ensino básico obedecem ao regime em vigor nos estabelecimentos públicos. Para a certificação do 1º, 2º e 3º ciclo do ensino secundário, as provas gerais internas e as provas de recurso são validadas pelos serviços centrais competentes do departamento que tutela a área da educação. A certificação de conclusão do 3º ciclo do ensino secundário geral e técnico nas escolas secundárias privadas obtém-se mediante prestação de provas de exames nacionais nas disciplinas nucleares correspondentes ao plano de estudos de cada área. A realização de provas de exames nacionais é feita nas escolas privadas sob a superintendência de um júri constituído pela Direcção-Geral do Ensino.

A gestão pedagógica e administrativa dos estabelecimentos do ensino privado é assegurada obrigatoriamente pelos seguintes órgãos, cuja inexistência inabilita tais estabelecimentos de funcionar: um Órgão Directivo; um Órgão Pedagógico; um Órgão de Disciplina.

O pessoal docente das escolas privadas exerce uma função de interesse público, tem os direitos previstos na legislação do trabalho aplicável e está sujeito aos deveres inerentes ao exercício da função docente.

As convenções colectivas de trabalho do pessoal docente das escolas privadas devem ter na devida conta a função de interesse público que ele exerce e a conveniência de harmonizar as suas carreiras com as do ensino público.

Os docentes das escolas privadas devem possuir habilitações académicas adequadas ao respectivo nível de ensino ou curso e fazer prova de sanidade física e mental. A idade mínima para o exercício de funções docentes em escolas privadas é de 18 anos.

Os 25% mínimos do corpo docente exigidos nas escolas privadas exercem função a tempo integral. Exclusivamente para este efeito, é aplicável a carga horária semanal o previsto no Estatuto do Pessoal Docente, aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 2/2004 de 29 de Março.

As habilitações académicas e profissionais a exigir aos docentes das escolas privadas relativamente aos diversos níveis de ensino são as exigidas aos docentes das escolas públicas.
Não podem exercer funções docentes nas escolas privadas os indivíduos que tenham sido condenados, por sentença transitada em julgado, em penas inibitórias do exercício de funções publicas, nos termos da legislação penal.

É permitida a acumulação de funções docentes em escolas privadas, sem prejuízo do estipulado no contrato de trabalho ou regulamente do pessoal.

Pode ser permitida a acumulação de funções em escolas privadas e escolas públicas, desde que não resulte daí prejuízo para o exercício público da função docente, não podendo em caso algum ser superior a 12 tempos semanais.

A acumulação de funções no ensino público e privado está sujeita a autorização do Director-Geral do Ensino e deve ser solicitada até 31 de Outubro cada ano.

O Estatuto permite a mobilidade de docentes do ensino básico e secundário entre o ensino privado e o ensino público e vice-versa, nos termos previstos na lei. Permite igualmente a transferência de matrícula dos alunos entre escolas privadas, e entre estas e as escolas públicas, nos mesmos termos que essas transferências se fazem entre as escolas públicas.

Os alunos das escolas privadas estão sujeitos ao pagamento de propinas de matrícula e frequência. Podem ter direito à isenção ou à redução de propinas, de acordo com os subsídios recebidos pelas escolas, nos termos previstos neste diploma, ou nas condições estabelecidas pelos respectivos estabelecimentos de ensino privado.

Os professores, os membros das direcções pedagógicas e as entidades proprietárias respondem disciplinarmente pela observância das normas legais aplicáveis às escolas privadas, incorrendo, em caso de incumprimento das mesmas, em diferentes sanções, designadamente advertência, coima, suspensão do exercício de funções, proibição do exercício de funções, suspensão de funcionamento por um período de um a dois anos lectivos e encerramento definitivo da escola aplicáveis, nalguns casos, pela entidade proprietária e, noutros, pelo Inspector-Geral ou pelo próprio Ministro da Educação.


V. Ensino privado de nível superior[6]

O Estatuto do Ensino Privado aprovado pelo Decreto-Lei nº 17/96, de 3 de Junho só contemplava o ensino privado ministrado nos estabelecimentos de educação e de ensino dos níveis pré-escolar, básico e secundário, não regulando o nível superior.

Assim, durante o interregno de quase uma década, registou-se um vazio de regulação jurídica do ensino superior privado. Na ausência de um “estatuto do ensino superior privado”, o Governo entendeu por bem seguir duas vias diferentes para obviar a instalação de instituições de ensino superior privado em Cabo Verde. Com efeito:

a) No caso da Universidade Jean Piaget, com sede na capital, o Governo utilizou a via legislativa para, por um lado, definir os princípios de actuação da Universidade Jean Piaget de Cabo Verde e, por outro, autorizar o Instituto Jean Piaget a exercer actividade em Cabo Verde. Para o efeito, fez publicar, a 7 de Maio de 2001, os Decretos-Leis nºs 11 e 12/2001, respectivamente;

b) No caso do Instituto Superior Isidoro da Graça, com sede em Mindelo, o Governo utilizou a via administrativa para conceder a necessária autorização para o funcionamento desse instituto. Assim, pela Resolução nº 12/2003, de 9 de Junho, do Conselho de Ministros, é autorizada a Graça Empreendimentos, SA, a exercer ensino superior privado em Cabo Verde através do Instituto de Estudos Superiores Isidoro da Graça (IESIG).
Porque duas opções diferentes? Eis a questão que se nos coloca. E qual das duas será a melhor? A resposta cabal a estas questões exigiria longa dissertação, que não cabe lugar aqui e agora, pelo que, de forma sucinta, fiquemo-nos pelas seguintes notas:
- Em princípio, ambas as instituições deveriam ter sido criadas ou autorizadas a exercer actividade em Cabo Verde após a aprovação do Estatuto do Ensino Superior Privado ou da aprovação de um novo “Estatuto do Ensino Privado”, que contemplasse os diversos subsistemas de ensino, incluindo o superior, com as tais “regras de jogo” balizadoras da iniciativa privada no ensino;
- No caso da Universidade Jean Piaget, na falta de norma legal habilitante no Estatuto do Ensino Privado, o legislador terá procurado uma saída airosa, ao proceder à autorização do seu funcionamento em Cabo Verde mediante um diploma legal, onde vêm plasmados os princípios a que deve obedecer a actuação da referida instituição no país;
- Em relação ao caso IESIG, aparentemente, o Governo seguiu a via recomendada pela doutrina: a autorização para a actuação de uma determinada entidade privada releva da competência administrativa do Governo, pelo que a Resolução seria a forma de acto apropriada. Simplesmente, não há exercício de competência administrativa sem suporte legal e, no caso em apreço, o Governo não tinha uma lei habilitante para proferir a referida resolução.
Entretanto, a prática de concessão de autorizações casuísticas para o funcionamento de instituições privadas de ensino superior, sem a prévia definição dos princípios e regras básicos norteadores do processo de criação, organização e funcionamento do ensino superior privado, foi superada quando, em Outubro de 2005, o Governo fez publicar o Decreto-Lei nº 65/2005, de 24 de Outubro, que definiu um conjunto de regras a que deviam obedecer, transitoriamente, a criação e o funcionamento de estabelecimento de ensino superior privado, deferindo-se para um futuro breve a aprovação do Estatuto do Ensino Superior Privado.

Efectivamente, a 7 de Maio de 2007 foi publicado o Estatuto do Ensino Superior Privado e Cooperativo (Decreto-Lei nº 17/2007), que representa um passo importante na regulação do ensino superior em Cabo Verde, em particular a nível do sector privado, se bem que fosse recomendável que, a anteceder a publicação desse diploma, se tratasse de rever e desenvolver os princípios e regras conformadoras do regime jurídico geral do ensino superior, com base nas quais se aprovaria então o referido Estatuto.

Nos termos do Estatuto só podem ser instituições de ensino superior particular e cooperativo aquelas que forem reconhecidas como tais pelo membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior, estando, por isso, sujeita a beneplácito governamental a constituição de instituições de ensino superior, sendo condição para tal reconhecimento oficial a satisfação dos requisitos estabelecidos no estatuto.

O ensino superior particular prossegue os objectivos definidos na lei para o ensino superior e compreende o ensino universitário e o ensino politécnico. As instituições de ensino superior particular não podem ministrar outros níveis de ensino.

Cada instituição de ensino superior particular tem denominação própria e característica, resultante de patronímicos autorizados, que a identifique e que defina o âmbito da sua actividade.
A denominação de uma instituição de ensino superior particular não pode confundir-se com a de qualquer instituição, seja particular, cooperativa ou pública, nem originar equívoco sobre a natureza do ensino que pratica ou a qualificação institucional respectiva.
A denominação de cada instituição de ensino superior particular só pode ser utilizada depois de homologada pelo Membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior e assentada em registo próprio organizado pelo serviço competente.

As instituições de ensino superior particular devem fomentar a prática de investigação, não só como suporte essencial das actividades de ensino que realizam, mas também com o objectivo de contribuírem para o desenvolvimento científico e tecnológico em âmbito local e nacional.

As instituições de ensino superior particular devem ainda, abrir-se à prestação de serviços especializados susceptíveis de contribuir para a resolução de problemas de natureza socio-económica e, bem assim, manifestar disponibilidade para a realização de actividades de extensão científica e cultural.

As instituições de ensino superior particular podem organizar-se livremente para prosseguirem o seu projecto de ensino, investigação e promoção cultural, com respeito dos princípios estabelecidos na Constituição da República, na legislação aplicável e no presente estatuto.

As instituições de ensino superior particular gozam de autonomia científica e pedagógica.
Assim, no exercício da sua autonomia científica, compete às instituições de ensino superior particular:
a) A livre organização científica no âmbito do projecto institucional, que lhes haja sido estabelecido pela respectiva entidade instituidora;
b) A elaboração das propostas de planos de estudo respeitantes à organização curricular básica para cada um dos cursos ministrados;
c) A definição de componentes curriculares não incluídas na organização curricular básica legalmente definida para cada curso;
d) A selecção de docentes a propor, para efeitos de distribuição de serviço e eventual recrutamento, observados os requisitos estabelecidos pelo presente diploma;
e) A proposta de criação de centros de estudo e de investigação;
f) A fixação, sem discriminações, de requisitos de ingresso dos alunos, para além dos requisitos gerais de acesso ao ensino superior.

No exercício da sua autonomia pedagógica, compete às instituições de ensino superior particular, em relação a cada curso ministrado, a livre adopção de métodos de ensino – aprendizagem e a escolha de regimes de frequência e de avaliação a adoptar, nos termos da lei.

Cada instituição de ensino superior particular deve ser dotada, pela respectiva entidade titular, de um estatuto que, no respeito da lei, defina os seus objectivos, a sua estrutura orgânica, o seu modelo de organização e a distribuição de competências pelos respectivos órgãos.

Os estatutos das instituições de ensino superior particular (e respectivas alterações) são homologados por despacho do membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior e publicados no Boletim Oficial.

No âmbito das suas autonomias, as instituições de ensino superior particular mantêm entre si e com as demais escolas e instituições científicas e culturais do país, relações de cooperação.
As instituições de ensino superior particular podem, igualmente, promover o intercâmbio científico e cultural com entidades estrangeiras e internacionais.
As instituições de ensino superior particular, no âmbito da cooperação que estabeleçam entre si, podem associar-se para a realização de projectos com interesse mútuo.

A constituição de instituições de ensino superior particular deve orientar-se pelos seguintes objectivos:
a) Contribuir para dar expressão prática aos preceitos das liberdades de aprender, de educar e de ensinar, previstos no artigo 49º da Constituição da República;
b) Promover o acréscimo do pluralismo global do sistema de ensino;
c) Contribuir para a democraticidade do sistema de ensino, favorecendo o acesso ao ensino superior;
d) Participar do esforço de qualificação dos recursos humanos necessários ao desenvolvimento do país;
e) Favorecer os índices de inovação, de modernização e de progresso científico, técnico e tecnológico;

Tendo em vista a consecução dos objectivos referidos no artigo anterior e no respeito pela liberdade de criação de instituições de ensino superior particular, incumbe ao Estado:
a) Zelar pela garantia de um elevado nível científico, cultural e pedagógico das actividades das instituições de ensino superior particular;
b) Garantir todas as condições de integração e correspondente participação activa dessas instituições no sistema educativo;
c) Assegurar condições equitativas de concorrência, no âmbito do sistema educativo.
d) Verificar a satisfação dos requisitos estabelecidos para o reconhecimento oficial das instituições, para a entrada em funcionamento de cursos e para o reconhecimento de graus;
e) Apreciar o cumprimento das condições necessárias para a constituição de universidades, de instituições universitárias e de institutos politécnicos;
f) Organizar o registo de denominações e de todos os actos administrativos pertinentes sobre os quais tenham recaído decisões, provisórias ou definitivas, emitidas nos termos do presente estatuto;
g) Homologar os estatutos das instituições e proceder ao conveniente registo;
h) Fiscalizar o exacto cumprimento da lei e, em caso de infracção, aplicar as sanções nela cominadas.
i) Proporcionar apoio científico, técnico e pedagógico às instituições de ensino superior particular;
j) Apoiar o desenvolvimento de projectos educativos que considere relevantes, mediante esquemas de comparticipações contratualizadas em conformidade com a lei;
k) Celebrar contratos-programa com entidades titulares de instituições de ensino superior particular, orientados para a prossecução de objectivos mutuamente acordados.

As instituições de ensino superior particular são independentes do Estado, pelo que da concessão de quaisquer benefícios ou regalias pelo governo não resultam poderes especiais de fiscalização e de controlo, para além dos previstos na lei ou acordados em contratos específicos.

Podem constituir instituições de ensino superior as pessoas colectivas de direito privado constituídas para o efeito, as quais tomam a designação de entidades titulares. No que se refere às cooperativas, só podem usar desta faculdade se preencherem os requisitos exigidos pela legislação cooperativa para que sejam qualificadas como cooperativas de ensino superior.

Quando a entidade que pretende constituir uma instituição de ensino superior particular tiver natureza fundacional, compete ao Ministério da Educação e Ensino Superior o seu reconhecimento, nos termos da Lei.

A constituição de uma instituição de ensino superior particular é requerida ao Ministro da Educação e Ensino Superior, pela respectiva entidade titular. Ao requerimento, junta-se um processo que deverá conter, designadamente:
a) A escritura da constituição e estatutos ou pacto social da entidade instituidora;
b) O currículo individual dos membros dos órgãos sociais da entidade instituidora;
c) A denominação da instituição de ensino, bem como as respectivas propostas de estatuto e regulamentos considerados pertinentes;
d) A fundamentação do projecto educativo;
e) Os protocolos de colaboração para apoio científico pedagógico se existirem;
f) A afirmação de disponibilidade de um Conselho estratégico que integre, pelo menos, um elemento doutorado ou mestre em cada uma das áreas científicas em que se prevê desenvolver o projecto educativo, todos eles devidamente identificados e com residência permanente em Cabo Verde.
g) Um plano estratégico de desenvolvimento institucional subscrito pelo Conselho a que se refere a alínea anterior.

O requerimento de constituição de uma instituição de ensino superior privado deve ser apresentado com, pelo menos, 12 meses de antecedência da data prevista para a entrada em funcionamento dos primeiros cursos formais ministrados pela instituição. Segue-se o
Prazo de 3 meses para apreciação do requerimento pelo competente serviço do Ministério que tutela a área da Educação e Ensino Superior, o qual, se for caso disso, pode notificar a entidade requerente para efeitos de junção de elementos em falta no processo. Neste caso, se a entidade requerente não suprir os elementos em falta após 3 meses, o processo é liminarmente arquivado.

Uma instituição de ensino superior particular pode constituir-se sob a forma de universidade desde que, no desenvolvimento do seu projecto educativo, assegure o cumprimento dos seguintes aspectos:
a) Exprimir, no seu projecto institucional, condições de efectiva prossecução dos objectivos educacionais, científicos e culturais do ensino superior universitário;
b) Ministrar, no seu conjunto, o mínimo de quatro cursos de licenciatura de duas áreas científicas diferentes;
c) Dispor, em cada área científica, de um corpo docente que satisfaça as exigências de qualificação académica legalmente previstas, para ministrar cursos de ensino superior universitário.

Uma universidade de ensino particular só pode ministrar cursos de ensino politécnico se dispuser, na sua composição estrutural, de uma unidade orgânica autónoma vocacionada para esta modalidade de ensino.

Uma instituição de ensino superior particular pode constituir-se sob forma de instituto universitário desde que, no desenvolvimento do seu projecto educativo, assegure o cumprimento dos seguintes requisitos:
a) Exprimir, no seu projecto institucional, condições de efectiva prossecução dos objectivos educacionais, científicos e culturais do ensino superior universitário;
b) Ministrar cursos de licenciatura com uma vocação dominante ou com um grau de pluridisciplinaridade limitada;
c) Dispor, em cada área científica, de um corpo docente que satisfaça as exigências de qualificação académica legalmente previstas, para ministrar cursos de ensino superior universitário.
Um instituto universitário de ensino particular só pode ministrar cursos de ensino politécnico se dispuser, na sua composição estrutural, de uma unidade orgânica autónoma vocacionada para esta modalidade de ensino.

Uma instituição de ensino superior particular pode constituir-se sob forma de instituto politécnico desde que, no desenvolvimento do seu projecto educativo, assegure o cumprimento dos seguintes requisitos:
a) Exprimir, no seu projecto institucional, condições de efectiva prossecução dos objectivos educacionais, científicos e culturais do ensino superior politécnico;
b) Ministrar, no seu conjunto, o mínimo de dois cursos que não conferem grau de licenciatura em duas áreas de formação distintas;
c) Dispor de um corpo docente que satisfaça as exigências de qualificação académica legalmente previstas, para ministrar cursos de ensino superior politécnico.

Durante o período de instalação, o reconhecimento oficial das instituições de ensino superior particular tem carácter provisório.

Não obstante a observância dos fundamentos admitidos na lei geral, o reconhecimento oficial pode ser revogado, quando se verifiquem algumas das seguintes situações:
a) O reconhecimento ter sido obtido por meio de falsas declarações ou por outros meios ilícitos;
b) A instituição de ensino superior particular cessar ou suspender a sua actividade, sem ter dado conhecimento prévio à entidade competente e sem desta ter obtido a necessária aquiescência para cessação ou para a suspensão provisória de funcionamento;
c) Deixar de verificar-se algum dos requisitos ou condições exigidas para efeito de concessão do reconhecimento oficial;
d) Verificar-se incumprimento das leis e regulamentos que regulam a actividade do ensino superior particular.
Quando for revogado o reconhecimento oficial de um estabelecimento de ensino superior particular, a entidade competente, sem necessidade de recurso prévio a meios contenciosos, toma as medidas adequadas, nomeadamente no que respeita à salvaguarda dos interesses legítimos dos alunos do estabelecimento de ensino particular.

Nos casos em que instituição de ensino privado funcione em contravenção com disposições legais previstas no Estatuto, o membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior comunica o facto ao Ministério Público para que este promova o encerramento compulsivo dessa instituição.
Neste caso, o Ministro da Educação e Ensino Superior toma as providências necessárias à salvaguarda dos interesses dos alunos.
O processo de encerramento compulsivo de uma instituição não prejudica o apuramento da responsabilidade civil e criminal que couber.

As entidades titulares de instituições de ensino superior particular oficialmente reconhecidas podem requerer a entrada em funcionamento dos cursos que não tenham sido objecto de autorização no acto de constituição da respectiva instituição de ensino.
O pedido de entrada em funcionamento de um curso deve ser apresentado com uma antecedência mínima de seis meses em relação à data prevista para o seu início.
As entidades titulares de instituições de ensino superior particular ficam obrigadas de mandar publicar no Boletim Oficial a descrição sumária dos cursos e os respectivos planos de estudo.

Para efeitos de entrada em funcionamento de um curso, o processo relativo a instituição com reconhecimento oficial provisório deve incluir, obrigatoriamente:
a) Objectivos do curso, traduzidos em valores, conhecimentos, capacidades e competências a adquirirem;
b) Organização curricular básica do curso;
c) Espaço curriculares a preencher, de forma variável, por livre deliberação institucional;
d) Justificação da lógica dessa organização curricular;
e) Unidades de crédito correspondentes às áreas científicas integrantes dessa organização curricular básica;
f) Regimes de avaliação e frequência;
g) Relação dos professores que vão ministrar o 1.º ano do curso, acompanhada dos respectivos curriculum vitae;
h) Número máximo de alunos em cada curso, para efeitos de admissão e para efeitos de frequência.

Para efeitos de entrada em funcionamento de um curso, o processo relativo a instituição com reconhecimento oficial definitivo deve incluir, obrigatoriamente:
a) Objectivos do curso traduzidos em valores, conhecimentos, capacidades e competências a adquirirem;
b) Organização curricular básica do curso;
c) Unidades de crédito correspondentes às áreas científicas integrantes dessa organização curricular básica;
d) Número máximo de alunos em cada curso, para efeitos de admissão e para efeitos de frequência.

A decisão sobre a entrada em funcionamento de um curso orienta-se pelos seguintes parâmetros:
a) Enquadramento nos critérios de regulação global do sistema de ensino superior;
b) Conformidade da proposta apresentada aos critérios legalmente definidos para reconhecimento da validade científica e pedagógica dos cursos.
c) Existência de recursos materiais e físicos adequados ao desenvolvimento do curso.

A entrada em funcionamento de um curso considera-se autorizada se, no prazo máximo de seis meses, não for proferida decisão sobre o respectivo requerimento.

Os requisitos de composição do corpo docente que ministra os cursos de graduação organizados pelas instituições de ensino superior particular são, em tudo, idênticos aos que forem definidos para o ensino superior público, em função da modalidade de ensino praticada, da área científica correspondente e do número de alunos inscritos.

De igual modo, os requisitos que viabilizam a organização dos cursos de mestrado e programas de doutoramento por parte da instituição de ensino superior particular são idênticos aos definidos para o ensino público, dependendo do potencial científico disponível e das condições ambientais em matéria de equipamentos e outros recursos necessários.

As instituições de ensino superior particular com reconhecimento oficial definitivo podem organizar mestrados e doutoramentos em domínios científicos das áreas de conhecimento respectivas, nos termos previstos no Estatuto.

Mediante prévia autorização do membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior, uma instituição pode ministrar cursos para os quais obteve autorização de funcionamento em apenas um só concelho diferente daquele que referiu no seu processo de constituição e de autorização de funcionamento.

Os graus académicos concedidos e os diplomas atribuídos por instituição com reconhecimento oficial definitivo são automaticamente reconhecidos.

As entidades titulares de instituições de ensino superior particular com reconhecimento oficial provisório podem requerer o reconhecimento de graus e diplomas correspondentes aos cursos nelas ministrados.
Para o efeito, essas entidades devem apresentar requerimento dirigido ao membro do Governo responsável pela Educação e Ensino Superior, a partir da conclusão do segundo ano lectivo de funcionamento do curso, caso se pretenda ver reconhecido o grau de licenciado.

Nos termos do Estatuto, a entrada em funcionamento de novos cursos (ou seja, dos que não constarem do processo de constituição da instituição de ensino superior que os vai ministrar) depende do seu registo por parte do competente serviço do Ministério da Educação e Ensino Superior, mediante requerimento da entidade titular, acompanhado de processo do qual constam obrigatoriamente a denominação da instituição que vai ministrar o curso, a identificação do curso a ministrar, incluindo a respectiva organização curricular básica e a data previsível da sua entrada em funcionamento.

A entidade titular de uma instituição de ensino superior pode requerer ao membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior o encerramento da instituição ou a suspensão dos cursos ministrados.

O encerramento e a suspensão dos cursos operam-se através da suspensão das matrículas no primeiro ano de cada curso, concretizando-se apenas no final do período correspondente ao curso de maior duração acrescentado de dois anos, salvo casos excepcionais devidamente fundamentados e reconhecidos como tal por despacho do Membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior.
A entidade titular deve comunicar ao membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior a intenção de suspender as matrículas, com a antecedência mínima de um ano, relativamente àquele em que pretenda iniciar a suspensão dos ingressos.

A extinção ou dissolução da entidade titular de uma instituição de ensino superior particular pode acarretar o encerramento desta.
A formalização do encerramento de uma instituição de ensino superior particular, nos termos do número anterior, é feita por despacho do membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior.
O despacho ministerial deve acautelar, na medida do possível, o mecanismo de encerramento atrás referido.

As entidades titulares de instituições de ensino superior particular, com reconhecimento oficial definitivo, e que se dediquem, em exclusivo, a actividades de ensino e investigação científica e tecnológica, adquirem automaticamente a natureza de pessoa colectiva de utilidade pública com dispensa do registo e das demais obrigações previstas na lei.
As que tiverem reconhecimento oficial provisório gozam, enquanto tal, das prerrogativas de pessoa colectiva de utilidade pública.
Caso se tratar de entidades sem fins lucrativos, nomeadamente as de natureza fundacional, cooperativa ou de solidariedade social, beneficiam das isenções fiscais previstas na lei.

As entidades titulares de instituições de ensino superior particular que, atenta a natureza do interesse público dessas instituições, optem por aplicar integralmente na sua valorização e na concessão de benefícios sociais aos seus colaboradores e alunos os excedentes financeiros da sua exploração, deduzidos os valores investidos, são consideradas, para todos os efeitos legais, entidades sem fins lucrativos, devendo tal opção ser manifestada, expressamente, nos estatutos da entidade titular. O direito a tal opção é atribuído apenas às entidades titulares que se dediquem, em exclusivo, a actividades de ensino e de investigação científica e tecnológica.

No que tange à organização e funcionamento das instituições de ensino superior privado, o Estatuto estabelece que, além das entidades titulares, tais instituições devem possuir um conjunto de órgãos necessários, o que não impede que possam dotar-se de outros, caso assim o entenderem.

Assim, as instituições universitárias de ensino superior particular dispõem, obrigatoriamente, dos seguintes órgãos: a) Reitor, no caso de se tratar de universidade ou instituto universitário; b) Órgão colegial científico; c) Órgão colegial pedagógico; d) Órgão colegial disciplinar.

As instituições politécnicas de ensino superior particular dispõem, obrigatoriamente, dos seguintes órgãos:
a) Presidente, no caso de se tratar de instituto politécnico; b) Órgão colegial científico; c) Órgão colegial pedagógico; d) Órgão colegial disciplinar.

As instituições de ensino superior particular podem optar por constituir o órgão pedagógico como secção autónoma do órgão científico, sem prejuízo de, desse órgão pedagógico participarem discentes, até um terço dos seus elementos. As instituições de ensino superior particular podem ainda constituir o órgão disciplinar como secção autónoma do órgão pedagógico.

As competências das entidades titulares e dos órgãos necessárias são definidas no Estatuto.

Referindo-se ao corpo docente, o Estatuto estabelece que, para o exercício da actividade docente nas instituições de ensino superior particular são exigíveis os requisitos habilitacionais ou curriculares legalmente definidos para a docência no ensino público.
[7]
Nos termos do diploma, após o período de instalação, as instituições de ensino superior particular devem dispor de um quadro docente próprio que integre, pelo menos, um doutor em regime de tempo integral por cada duzentos alunos, quando se trate de instituição que confira o grau de licenciado e esteja autorizada a conferir os graus de mestre e/ou doutor, ou um mestre em idêntico regime, por cada cem alunos, quando se trate de instituição que não confira o grau de licenciatura.

Durante o período de instalação, o Membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior pode autorizar o funcionamento de cursos em condições de menor exigência habilitacional do corpo docente.

A carreira docente dos professores do ensino superior particular desenvolve-se em duas ou três categorias que, sucessivamente, lhes vão conferindo maior grau de polivalência no que respeita à realização das funções que configuram o perfil profissional da actividade docente no ensino superior.
As funções dos professores das categorias a que se refere o número anterior podem também ser exercidas por docentes equiparados aos respectivos professores que disponham de currículo académico e/ou profissional reconhecido como relevante para o efeito, por deliberação do órgão científico da instituição.
Os professores e os docentes equiparados a que se refere o número anterior podem ser coadjuvados, no exercício de funções lectivas, por docentes habilitados com curso superior adequado, em situação de pré-carreira, durante um período estabelecido para obtenção do grau académico de ingresso na carreira. Nos casos em que a carreira se desenvolve em duas categorias, os graus académicos de ingresso na carreira são o mestrado ou o doutoramento, consoante se trate de docência no ensino politécnico ou no ensino universitário. Nos casos em que a carreira se desenvolve em três categorias, os graus académicos referidos no número anterior são, respectivamente, a licenciatura e o mestrado.

As funções docentes nas instituições de ensino superior particular podem ainda, com respeito da lei, ser exercidas por docentes de outras instituições, públicas ou privadas, em regime de acumulação.
Em relação a qualquer desses docentes, a acumulação não pode exceder, no universo das instituições em que é praticada, metade do número máximo de horas lectivas a que, nos termos da lei, o mesmo é obrigado na instituição de origem.

Quando se verificar mobilidade docente entre o ensino superior público e o ensino superior particular, ela não pode prejudicar direitos adquiridos, designadamente a contagem de tempo de serviço e a situação em carreira.

O acesso dos alunos aos cursos do ensino superior particular está sujeito às condições legalmente fixadas para o ensino superior.
O ingresso nos cursos do ensino superior particular está ainda sujeita às condições fixadas por cada instituição para a matrícula, a inscrição e a frequência dos alunos.

São permitidas transferências de alunos entre instituições de ensino superior particular e de ensino público, desde que respeitadas as condições para o efeito legalmente fixadas.
Da mesma forma, são autorizadas mudanças de curso, desde que observadas as normas fixadas para a matrícula, a inscrição e a frequência do novo curso.

As mudanças de curso ou as transferências de alunos não conferem à partida a estes qualquer direito ou garantia de reconhecimento ou de equivalência de disciplinas entretanto realizadas.
Nenhum aluno pode estar matriculado, simultaneamente, em mais de um curso de ensino superior.

As exigências de nível científico e pedagógico dos cursos ministrados pelas instituições de ensino superior particular devem respeitar os parâmetros definidos para o sistema nacional de ensino superior.
As instituições de ensino superior particular e os cursos por elas ministrados submetem-se à avaliação prevista em lei própria.

As infracções às normas contidas no presente estatuto, cometidas pelas entidades titulares ou pelos órgãos de decisão das instituições de ensino superior particular, dão lugar a aplicação das sanções previstas no Estatuto, designadamente coimas entre 2.000.000$00 e 5.000.000$00; suspensão da admissão de novos ingressos no 1º ano curricular dos cursos ministrados; suspensão de funcionamento dos cursos; encerramento compulsivo das instituições.

A aplicação de qualquer sanção é sempre precedida de processo instituído pelo competente órgão do Membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior, no qual são ouvidos, consoante os casos, os órgãos da administração da entidade titular e órgãos da direcção das instituições de ensino.
A competência para aplicar as sanções previstas no presente artigo pertence ao Ministro da Educação e Ensino Superior, e da respectiva decisão cabe recurso contencioso administrativo. O produto de coimas aplicadas reverte para a Acção Social Escolar do Ensino Superior.

O encerramento de uma instituição de ensino superior particular determina o termo do seu funcionamento legalizado.
O despacho do membro do Governo que tutela a área da Educação e Ensino Superior que determinar o encerramento de uma instituição de ensino superior particular fixa a entidade a cuja guarda é entregue a documentação fundamental da instituição encerrada, entendendo-se como tal documentação a que corresponda a interesses perenes e, nomeadamente, a livros de actas dos órgãos de direcção, escrituração da instituição, contratos de professores, livros de serviço docente, livros de termos e processos de alunos. Essa entidade é, em princípio, uma instituição de ensino superior que ministre a mesma modalidade de ensino. A essa entidade incumbe, a partir da data de recepção da documentação, a emissão de quaisquer documentos que vierem a ser requeridos, relativos ao período de funcionamento da instituição encerrada.



VI. O regime jurídico de gestão privada de estabelecimentos públicos

Se é certo que, até ao momento, só os estabelecimentos de ensino privado de nível não superior são contemplados com um Estatuto regulador dos princípios, regras e condições a que ficam sujeitos sua criação e funcionamento em Cabo Verde, o mesmo já não se poderá dizer em relação ao quadro jurídico que permita a gestão privada de estabelecimentos de ensino públicos.
Se bem que, nesta matéria, a regulação não abarque todos os níveis, por razões que são, aliás, óbvias, tanto o ensino secundário como o ensino superior são contemplados.

Assim, os princípios básicos da gestão privada de estabelecimentos de ensino superior são regulados pela Lei nº 97/V/99, de 22 de Março, que preconiza:
- A possibilidade de, por Resolução do Governo, ser submetido o estabelecimento público a regras de gestão empresarial e entregue tal gestão a pessoas colectivas privadas idóneas;
- A obrigatoriedade de as entidades gestoras assegurarem o acesso ao ensino nos termos dos demais estabelecimentos públicos;
- A submissão da gestão privada aos termos definidos nos respectivos contratos de gestão, cuja celebração é precedida de concurso público ou, excepcionalmente, de ajuste directo;
- O apoio estatal à entidade gestora, em temos de equipamentos e instalações, formação e investigação científica, compensação da obrigatoriedade de prestação de serviço educativo nas mesma condições do ensino público, etc.

Por outro lado, a possibilidade de gestão privada de estabelecimentos públicos do ensino secundário é consagrada em termos idênticos aos prescritos em relação ao ensino superior, conforme o disposto nº art. 11º do Decreto-Lei nº 20/2002, de 19 de Agosto.

Entre nós, não existe, todavia, tradição de gestão privada de estabelecimentos públicos, verificando-se a única excepção a nível superior: é o caso do ISCEE (Instituto Superior de Ciências Económicas e Empresariais (ISCEE), criado pela Resolução nº 46/98, de 28 de Setembro e cujos Estatutos foram aprovados pelo Decreto-Lei nº 52/98, de 26 de Outubro. Ainda que sem um instrumento contratual devidamente aprovado, o ISCEE tem uma gestão privada, assegurada por personalidades da sociedade civil. Os Cursos Superiores de Gestão e Marketing e de Contabilidade, ministrados pelo ISCEE, foram aprovados pelo D.-Lei 26/95, de 22 de Maio.

A nível secundário, tem-se limitado a experiências incipientes, como a celebração de parcerias entre escolas públicas e entidades privadas para o aproveitamento de espaços públicos com vista à oferta de “ensino recorrente” a adultos, nomeadamente a estudantes que perderam o direito de frequência do ensino secundário público. Duas modalidades são conhecidas, todas elas padecendo de insuficiências e lacunas: criação de “escolas privadas” a partir de espaços públicos, leccionadas, na maior parte dos casos, por professores do ensino público; criação de cursos pós-laborais, formalmente de natureza pública, mas assumindo contornos em que dificilmente se consegue discernir e separar o interesse público do privado.


VII. Pontos fortes e oportunidades de melhoria do Ensino Privado

O diagnóstico do funcionamento do ensino privado em Cabo Verde apresenta, a par de insuficiências a serem superadas, uma série de evidências positivas que constituem um potencial importante para a promoção de melhorias ainda mais significativas no futuro próximo. Vejamos alguns desses pontos fortes:

1. A pertinência social do ensino privado

Procura-se o ensino privado porque se revela de utilidade na perspectiva de valorização pessoal, social e profissional dos que o frequentam. Com efeito, os estabelecimentos de ensino privado, a diversos níveis, têm permitido maior democratização no acesso ao conhecimento e ao saber, contribuindo para a integração no mercado de emprego, a melhoria de evolução profissional nas carreiras ou ainda a prossecução da formação nos níveis subsequentes, quer na perspectiva académica, quer na de habilitação profissional. O reforço da pertinência social do ensino privado, como do ensino público, deve passar pela maior interligação entre os sistemas de planeamento socio-económico, educativo e de formação profissional, de modo a que educação e a formação possam constituir-se, cada vez mais, em factores de inovação científico-tecnológica, de transformação e progresso sustentável do país.

2. O papel de alternativa ou de complemento em relação ao ensino público

O ensino privado a nível superior tem constituído uma alternativa ao sector público, que não consegue dar resposta cabal à demanda de ensino superior ou universitário, em virtude da massificação do ensino secundário em Cabo Verde.

Se esse papel de alternativa existe, igualmente, a outros níveis (posto que tem havido procura dos estabelecimentos privados de educação e ensino a nível pré-escolar, secundário e, com menos expressão, na educação básica), esse papel tende a ser subvalorizado, senão mesmo menosprezado, em certos círculos, nomeadamente quando se afirma, de forma algo depreciativa, que o ensino secundário privado é ainda um “mero complemento” ou “apêndice” do Ensino Público e não uma verdadeira e credível alternativa ao mesmo.

Na verdade, mesmo num contexto de verdadeira explosão da frequência do Ensino Secundário Público, o acesso e a permanência têm sido condicionados em função de critérios como os da idade e nº de reprovações, levando a que alguns milhares de jovens e adultos tenham ainda que recorrer a escolas privadas por perda ou falta de requisitos para frequentarem ou prosseguirem os estudos no ensino público. Imagine-se o que aconteceria se não existissem as Escolas Secundárias Privadas e se estas não desempenhassem esse papel socialmente relevante!

Mas, ao falar-se de mero papel de complemento, muitas vezes se ignora que o próprio sistema de financiamento do ensino público não favorece a concorrência, pelo que esse papel de complemento já é importante. Com efeito, atente-se no facto de o ensino básico ser de oferta maciça e gratuita pelo Estado e de os estabelecimentos públicos de ensino secundário e ensino superior praticarem um regime de propinas que, não obstante as críticas que possam ser feitas, têm um valor relativamente simbólico e longe de cobrir as despesas públicas de formação per capita do aluno (mais de 50 contos no ensino secundário e, pelo menos, 200 contos no ensino superior), sem incluir as despesas públicas de investimento!

É caso para se dizer que ainda não existe igualdade de condições de verdadeira concorrência entre o público e o privado, não só a nível do ensino básico mas também a nível secundário e, em parte no ensino superior (que irá contar, em breve, com uma Universidade pública), sendo por isso absolutamente normal que o ensino privado tenha dificuldade em concorrer, em condições de igualdade e paridade, com o ensino público. Tem-se, assim, a alternativa possível.

Em prol da qualidade e da sustentabilidade do sistema educativo, importa que se avance na senda da procura de formas de cooperação entre o poder público e o sector privado, de modo a que as ofertas educativas e formativas resultem alargadas e socialmente credíveis.

3. A qualidade do ensino privado

Se há procura, por vezes crescente, do ensino privado é porque, em princípio, o serviço de educativo que ali se presta ao cliente é de qualidade e utilidade satisfatórias. De contrário, o cliente, que paga o serviço prestado, dificilmente recorreria a esse serviço.

Tem-se falado de défice de qualidade no Ensino Privado, mas é evidente que este problema, de que se tem apenas uma percepção empírica e não suficientemente fundamentada, coloca-se também no sector público da educação, tanto em Cabo Verde como em outros países, sobretudo, como acontece entre nós, quando a grande maioria dos professores do ensino privado provém do sector público do ensino.

É certo que não se pode ignorar a situação com que, por vezes, é confrontado o estabelecimento de Ensino Privado: porque os clientes pagam o serviço, esperam a devida contrapartida, a qual, para alguns, representa não apenas bom serviço educativo mas, sobretudo, a expectativa de receber do estabelecimento privado o respectivo diploma ou certificado, independentemente do investimento feito na aprendizagem ou da qualidade desta.

Todavia, a questão da eventual falta de rigor da avaliação da aprendizagem não seria apanágio apenas dos estabelecimentos privados mas do sistema educativo em geral (e não apenas em Cabo Verde), tanto mais que, entre nós, a maior parte dos professores do ensino privado provém do ensino público, em regime de acumulação de funções.

Por outro lado, a análise do desempenho de alunos do ensino médio (Instituto Pedagógico) e superior (ISE, UNIPIAGET, ISCEE, etc.), provenientes do ensino secundário privado parece demonstrar que o seu perfil de entrada não fica a dever-se ao daqueles que são oriundos do ensino público. O mesmo se dirá em relação ao sucesso escolar obtido no estrangeiro por parte de estudantes do ensino secundário diplomados por estabelecimentos privados!

A garantia da qualidade, tanto no Ensino Privado como no Ensino Público deve ser assegurada, antes de mais, pelos esforços conjugados de promoção da excelência do serviço educativo (por parte das instituições de ensino e da Administração Educativa), que inclui, entre outras medidas, o reforço dos meios ou mecanismos de controlo interno e externo, a implementar de forma sistemática, transparente e à luz dos normativos aplicáveis, na sua tríplice dimensão:

- Controlo ex-ante: tem lugar através da melhoria do quadro normativo por que se rege o ensino privado a diversos níveis, com a definição prévia e clara das “regras de jogo”, mediante a fiscalização prévia das condições de organização e funcionamento oferecidas pelas entidades promotoras, antes da concessão do respectivo alvará, e ainda através de acções de apoio técnico-pedagógico, com vista a prevenir fracassos ou insucessos;
- Controlo concomitante: garante-se, essencialmente, através de uma ligação permanente entre o ministério (e ou organismo de controlo/avaliação) e o estabelecimento de ensino privado, para que haja a necessária fluidez na comunicação, sem prejuízo da autonomia da instituição educativa; garante-se ainda esse controlo através do aprimoramento dos mecanismos de acompanhamento, seguimento e avaliação da eficiência e eficácia dos processos de ensino-aprendizagem e de gestão académica, para que se possa inteirar in loco e no momento das “boas práticas”, que importa sejam disseminadas, e se possa detectar em devido tempo as insuficiências, para serem colmatadas oportunamente;

- Controlo sucessivo: realiza-se através de inspecções, avaliações e auditorias externas periódicas que permitem aferir até que ponto o desempenho da instituição educativa privada se insere nos padrões de eficiência e eficácia razoavelmente aceites, à luz das normas por que se rege, e bem assim implementar formas de apoio institucional, técnico e logístico, em ordem à consolidação dos pontos fortes e à superação de insuficiências constatadas.

Por outro lado, é mister que se proceda ao aperfeiçoamento do quadro legal por que se rege o ensino privado e se implementem políticas de fomento e incentivo do ensino privado, de modo a reforçar a sua credibilidade, por via da melhoria contínua do ensino ministrado.

Por seu turno, com base na experiência desenvolvida, é sempre possível aos estabelecimentos de ensino privado, com esforço próprio, desenvolver a sua capacidade institucional, de organização e de prestação do serviço educativo, de modo a cumprirem, cabalmente, o lugar que lhes está reservado no Sistema Educativo.

Assim, está ao seu alcance a implementação de medidas no sentido da diversificação e elevação da qualidade das ofertas educativas, o que implica, entre outras medidas: a fundamentação das ofertas formativas nas necessidades e perspectivas de desenvolvimento socio-económico do país; o aprimoramento nos processos de recrutamento e actualização dos professores; a aposta permanente na inovação pedagógica, na pesquisa e na investigação; o apetrechamento com materiais didácticos adequados, nomeadamente bibliotecas, Internet, Laboratórios, etc. generalização das práticas de planificação, seguimento e avaliação das actividades pedagógicas; o envolvimento dos agentes educativos nos diversos níveis de gestão escolar, etc.


Praia, Março de 2008.
Bartolomeu Varela

Nota: Outros diplomas de interesse para o ensino superior privado:

Decreto-Lei 15/2000, de 13 de Março, que estabelece o regime de acesso e ingresso no ensino superior;

Decreto – Lei n.º 6/97, de 3 de Fevereiro – regula o regime jurídico do financiamento para a formação pós-secundária no país ou no estrangeiro;

Decreto-Lei nº 56/97, de 1 de Setembro – Regula a prestação de garantias para a formação de pós-graduação;

Decreto-Lei nº 7/97, de 3 de Fevereiro – Define o regime jurídico das bolsas-empréstimos;

Decreto-Lei nº 8/97, de 3 de Fevereiro – Estabelece uma linha de crédito bonificado para as bolsas de estudo;

Resolução nº 25/97, de 28 de Abril – Fixa o montante das bolsas-empréstimos;

Decreto-Lei nº 4/95, de 13 de Fevereiro – Cria o Fundo de Apoio ao Ensino e à Formação (FAEF), organismo do Estado que gere a concessão e o reembolso das bolsas de estudo para formação pós-secundária, no país e no estrangeiro.




[1] Citação de memória do antigo Ministro da Educação, Victor Borges.
[2] O ensino superior privado é obra do 3º milénio, posto que a primeira universidade do país, de natureza privada (a UNIVERSIDADE JEAN PIAGET) data de 2001.
[3] Cf. Lei nº 103/III/90, de 29 de Dezembro, na nova redacção dada pela Lei nº 113/V/99, de 18 de Outubro.
[4] No momento em que se publica este apontamento, recebemos a notícia da aprovação pelo Governo do Estatuto do Ensino Superior Privado e Cooperativo, ainda não publicado no Boletim Oficial. Trata-se de uma iniciativa positiva, mas que parece pecar pela sua inoportunidade: estando na agenda a revisão mis ou menos profunda da Lei de Bases do Sistema Educativo, incluindo a parte concernente ao subsistema de ensino superior, seria curial que este Estatuto aguardasse essa revisão de modo a ficar em sintonia com as opções a serem consagradas na Lei de Bases.
[5] Cf. Decreto-Lei nº 32/2007, de 3 de Setembro
[6] Cf. Decreto-Lei nº 17/2007, 7 de Maio

[7] Exclusivamente para os efeitos referidos aqui, considera-se tempo lectivo integral uma carga horária semanal de 8 a 12 horas.

Qualidade e Regulação da Educação - Práxis e perspetivas no contexto cabo-verdiano

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