terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Educação pelos Pares

Prólogo:
Ontem, teve lugar na Universidade de Cabo Verde, Campus de Palmarejo, um Seminário sobre a Educação pelos Pares, de que dá notícia o Portal da mesma universidade, sob o título:
Porque se trata de uma interesante metodologia de abordagem de questões educacionais, reproduzimos um texto sobre a matéria publicado por Maria Rosário Pinheiro no blog de educação para a saúde, denominado "Saúde com estilo 2005", no seguinte endereço: http://saudecomestilo2005.blogspot.com/2005/11/educao-pelos-pares.html
Boa leitura.
BV


Educação pelos Pares: uma metodologia utilizada na Educação para a Saúde
Por Maria Rosário Pinheiro, Projecto Falsas Crenças, 2005

A Educação pelos Pares ou Peer Education é um conceito conhecido a nível mundial, sendo uma metodologia bastante utilizada, desenvolvida e divulgada em Programas de Promoção e Educação para a Saúde (ex: programas de educação sexual e prevenção e abuso de droga).
O que se entende por Educação pelos Pares ou Peer Education?
É uma abordagem pela qual uma minoria de pares representativos de um grupo ou população intencionalmente tenta informar e influenciar a maioria (Europeer, 1998).
Daí se considerar de forma simples que a educação pelos pares é a “comunicação par a par”. Portanto, o conceito “Peer Education” significa que aqueles que pertencem ao mesmo grupo ou estatuto social, educam-se mutuamente ( Europeer, 1998).
A educação de pares é uma metodologia que permite simultaneamente promover a aprendizagem e o desenvolvimento do outro (educatividade) e de si mesmo (educabilidade) através do desenvolvimento de acções racionais, intencionais, sistemáticas, fundamentais e técnicas. (Maria Rosário Pinheiro, Projecto Falsas Crenças, 2005)

Porque é que a Educação pelos Pares é vantajosa?
Como é sabido, o grupo de pares exerce uma forte influência social sobre os jovens desempenhando um papel fundamental no processo de construção e consolidação da identidade e autonomia dos mesmos, partilhando ideias, atitudes, valores e comportamentos.Neste sentido, os pares surgem como um recurso humano inestimável que permite uma adaptação das mensagens de prevenção e promoção e das actividades a cada cultura, estilo de vida, nível ou grupo social e idade, uma vez que, como afirmam Turner & Shepherd (1999, citados por Matos, s/d, apud Moura, Armanda, 2005) conhecem as problemáticas, os cenários e os actores activos, tornando-se muitas vezes mais eficazes do que os profissionais na transmissão da informação.
Segundo Senderowitz (1998, citado por Costa, 2001, apud Moura, Armanda, 2005), os educadores de pares podem, por um lado, enriquecer os programas trazendo ideias enérgicas, novas e vitais, por outro publicitar as actividade desenvolvidas, ajudando os seus pares a se interessarem e envolverem.
Visão semelhante possui Alice Alves (1999), considerando que a formação pelos pares (com o professor ou outro técnico na retaguarda) é uma aposta actual da pedagogia uma vez que facilita a relação horizontal, ao nível da linguagem, dos interesses, das vivências que são comuns.A criação da Carta de Ottawa, (importante documento no âmbito da promoção da saúde) em 1986 levou a que, entre outras coisas, a OMS posteriormente reconhecesse e considerasse a Educação pelos Pares como uma metodologia altamente eficaz na modificação dos comportamentos.

Quais os fundamentos da Educação pelos Pares?

• Os amigos procuram conselhos entre os amigos e são influenciados pelas expectativas, atitudes e comportamentos do grupo a que querem pertencer. (Lindsey, 1997)
• A informação, particularmente a informação significativa, é mais facilmente partilhada entre pessoas de uma idade próxima. (Mellanby, Rees &Tripp, 2000)
• As pessoas são persuasíveis por alguém ligeiramente superior mas não muito superior.
(Rogers, 1983)
• Os indivíduos necessitam da oportunidade de praticar comportamentos modelados e de serem reforçados pelos seus desempenhos para poderem modificar o seu comportamento.
(Bandura, 1986; Tuner & Shepherd, 1999)
Como conceber, planificar e desenvolver um projecto centrado na Educação pelos Pares?
1- Inicialmente é necessário definir a população alvo e efectuar um levantamento das necessidades dessa mesma população.Segundo Svenson e colaboradores (Peer to Peer Education, 1998) deve-se ainda:
2- Estruturar metas e desafios (definir os objectivos a alcançar, definir o modelo do projecto a seguir e determinar o modo de avaliação)
3- Iniciar o projecto:
a)Criar parcerias e angariar financiamentos
b)Elaborar um plano de acção
c)Seleccionar os educadores de pares, tendo por base alguns critérios essenciais: verificar se querem realmente integrar o projecto (voluntariado), devem ser aceites pelo grupo no qual se pretende intervir (grupo de pares educandos) e devem ser detentores de uma personalidade passível de se adequar à formação e às tarefas/actividades a desenvolver
d) Definir e criar as condições necessárias ao apoio das actividadese) Escolher o coordenador do projecto.

Quais as características que deve possuir um educador de pares?
Embora não haja um consenso europeu entre os vários especialistas no que se refere às características essenciais que um educador de pares deve possuir, Svenson e os seus colaboradores (Europear, 1998) reiteram alguns atributos:
1. capacidade de comunicação e assertividade
2. espírito inovador e abertura à mudança
3. capacidade para trabalhar em grupo e em equipa
4. respeito pelos outros e pela confidencialidade da informação5. interesse pelo tema do projecto ou intervenção específica

Abordagens da Educação pelos Pares:
(Svenson e colaboradores, 1998, Europeer)
1. Abordagem Pedagógica ou Educacional
2. Abordagem de Intervenção no Terreno
3. Abordagem de Difusão
4. Abordagem de Mobilização Comunitária
1. Abordagem Pedagógica ou Educacional:
• privilegia o cenário formal para apresentar a informação;• as sessões são fixas, tendo a duração de 1h-2h;
• utiliza técnicas didácticas e interactivas;
• a presença de adultos não é obrigatória;
• os educadores de pares possuem a mesma idade ou são ligeiramente mais velhos e podem não ter vivenciado as mesmas experiências;
• abordagem que privilegia a passagem da informação, a descodificação de mitos e noções erradas.
2. Abordagem de Intervenção no Terreno:
• privilegia o cenário não formal (centros de juventude, culturais, religiosos, etc);
• utiliza técnicas didácticas e interactivas;
• intervenção em grupos com características sociais (ex: minorias étnicas, jovens marginalizados);
• os educadores de pares geralmente pertencem a grupos sociais diferentes do grupo alvo, embora muitas vezes tenham a mesma idade, pertençam ao mesmo grupo étnico, partilhem a mesma linguagem e experiências, etc;
• abordagem centrada nos grupos ditos especiais que não gozam de uma abordagem formal educacional.
3. Abordagem de Difusão:
• privilegia a comunicação do tipo informal par a par ( “peer-to-peer”)
• os pares educadores partilham o mesmo grupo social dos pares educandos (grupo alvo)
• aproveita os contextos existentes (redes sociais e canais de comunicação) de modo a difundir a influência, mudança e inovação
• utiliza técnicas interactivas: discussão espontânea, peças de teatro e “sketches”, programas de rádio, quiosques de informação, festivais, etc.
• centra-se no princípio de que o grupo pode influenciar o grande grupo, a partir da partilha de informação, valores, ideias, atitudes e comportamentos.
• recorre e utiliza o líder de opinião.
4. Abordagem de Mobilização Comunitária:
• tem por cenário base a comunidade local (ex: comunidades étnicas, geográficas, escolares e religiosas)
• estabelece parcerias com as organizações da comunidade, líderes de opinião, jovens e profissionais
• os pares educadores representam a comunidade mais do que um projecto ou organização• é uma abordagem mais complexa do que as abordagens referidas anteriormente combinando em muitos caos aspectos destas três abordagens ( abordagem educacional, difusão e intervenção no terreno)

Educação de Pares na Educação para a Saúde
Os indivíduos possuem características, conhecimentos, atitudes e comportamentos comuns pelo que podem possuir o mesmo tipo de dificuldade e problemas na área da saúde.
(Maria Rosário Pinheiro, Projecto Falsas Crenças, 2005)

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Fundamentos, normas e práxis da avaliação de desempenho docente em Cabo Verde

Há dois dias, animei uma jornada de reflexão sobre os fundamentos, normas e praxes da avaliação de desempenho do pessoal docente dos estabelecimentos públicos do ensino básico e secundário e da alfabetização e educação de adultos em Cabo Verde, organizada pela Delegação da Praia do Ministério da Educação e Ensino Superior.
Tratou-se de um evento importante cuja sessão de abertura foi presidida pelo Secretário de Estado da Educação, que dissertou sobre os objectivos, os efeitos e a experiência da avaliação de desempenho do pessoal docente, exortando os participantes a contribuir para o seu melhoramento.
Quanto a mim, salientei o facto de o sistema de avaliação de desempenho em Cabo Verde, que possui não poucas virtualidades, nem sempre ter sido implementado de forma adequada, devido ao seu deficiente conhecimento por parte dos gestores e docentes. Sem que se possa esperar que essa avaliação por si só conduza à almejada qualidade da educação, pois que são diversos os factores que concorrem para a realização desse desiderato, salientei, ao longo do encontro, a necessidade de se encarar essa avaliação no quadro de uma abordagem sistémica da educação e no âmbito do chamado processo cíclico da gestão educacional, no qual o planeamento, a organização, a liderança, a execução e a avaliação do serviço educativo devem conjugar-se de modo a que possa ser maximizada a qualidade da educação.
Nesse sentido, importa generalizar as boas práticas de avaliação existentes, tirar o máximo partido das potencialidades e inovações que o sistema incorpora e procurar aperfeiçoá-lo no quotidiano mediante a implementação criativa dos princípios que o enformam, designadamente: o carácter contínuo e sistemático da avaliação, a conjugação do rigor com a flexibilidade, a equidade, a transparência, a participação e o envolvimento dos avaliados, a valorização da autoavaliação, a imparcialidade e as garantias de justiça e defesa, etc.
Alertei para os perigos que derivam da tentação de, acriticamente, imitar modelos de outros países e ainda para a tendência, não menos gravosa, de se pôr de lado um modelo sem conhecer as suas potencialidades e sem o implementar adequadamente.
Em seguida, apresento o apontamento que elaborei para o encontro, ciente de que não traduz cabalmente nem a apresentação feita nem a riqueza dos contributos colhidos durante a discussão do tema.

FUNDAMENTOS, NORMAS E PRAXES DA AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO PESSOAL DOCENTE DOS ESTABELECIMENTOS PÚBLICOS DO ENSINO BÁSICO, SECUNDÁRIO E DA ALFABETIZAÇÃO E EDUCAÇÃO DE ADULTOS


1. Conceito de profissão

Porque o que está em causa é a avaliação de um profissional, comecemos por revisitar o conceito de profissão.

O que vem a ser uma profissão? Podemos encarar o conceito de profissão no sentido amplo de "ocupação" ou "emprego" ou segundo uma abordagem que coloque ênfase nos atributos consubstanciadores das profissões hodiernas, como o fzem vários autores, como Carlos Fontes (in http://educar.no.sapo.pt/PROFS2.htm), que aqui seguimos de perto.

Tais atributos transformaram-se em requisitos para todas as actividades humanas que tenham como objectivo constituírem-se numa profissão, tendo para o efeito que possuir:

a) Um saber especializado, aliado a práticas específicas que o profissional necessita de dominar, adquiridas através de uma formação profissional estruturada;

b) Uma orientação ou perspectiva de serviço, posto que o profissional afirma-se perante os outros porque exerce a sua actividade por motivos que não se esgotam nos seus interesses particulares;

c) Um código deontológico, que se expressa no facto de que o exercício de qualquer profissão tende a ser orientado por um conjunto de deveres, obrigações, práticas e responsabilidades que são específicos dessa profissão, para além dos deveres gerais que são mais ou menos comuns a diversas classes profissionais;

d) Uma dimensão associativa ou corporativa, pois que uma profissão tende a desenvolver-se no sentido de engendrar, com maior ou menor grau de formalização, “espírito de corpo” ou mesmo uma associação profissional, cujo objectivo seria, entre outros, o de manter e velar pela ocupação dos padrões estabelecidos entre os seus membros.

Se há autores que têm reagido contra esta tipificação, tomada de empréstimo às profissões liberais, por a mesma ser demasiado estática, esquecendo-se as transformações que nas mesmas ocorreram, nomeadamente a sua integração em organizações burocráticas, nas quais os profissionais perderam grande parte da sua autonomia, não é menos verdade que tais atributos tendem a caracterizar, cada vez mais, a vida profissional na actualidade.

2. A heterogeneidade da profissão docente

O docente é uma das várias profissões que encontramos no sistema educativo. Porém, a profissão docente apresenta uma grande diversidade, em função dos níveis ou subsistemas educativos, havendo em cada subsistema várias categorias hierarquizadas, em decorrência das qualificações dos agentes docentes e das especificidades do seu conteúdo funcional.

Dada a heterogeneidade da profissão docente, em termos de níveis, habilitações, requisitos e conteúdos funcionais, há quem resista em aceitar o conceito de “profissão”, preferindo que se fale, em termos genéricos, da “função docente”, na qual se enquadrariam profissionais de diferentes níveis (docente do ensino básico, docente do ensino secundário, docente do ensino superior), subdivididos em diferentes categorias, todos eles incumbidos da missão de educar, ou seja, de promover o desenvolvimento intelectual, cultural, moral, e social dos indivíduos, de modo a capacitá-los para a vida activa.

Em cada um dos níveis, costuma fazer-se a destrinça dos docentes segundo as suas qualificações, distinguindo-se, assim, no ensino básico e secundário, os chamados “professores profissionalizados” (os quais, por possuírem as qualificações profissionais exigidas para o exercício da docência nos respectivos níveis, podem exercê-las em regime de carreira, isto é, por nomeação, que confere vínculo definitivo ou vitalício) e os docentes não profissionalizados (os quais só podem exercer funções docentes em regime de emprego, ou seja, mediante contrato a termo de um ano, renovável, por lhes faltarem as qualificações necessárias). É certo que encontramos professores devidamente qualificados em regime de emprego (por opção própria ou razões de natureza gerencial), assim como professores insuficientemente qualificados em regime de carreira (são as carreiras horizontais do chamado quadro transitório).

No ensino superior, há diferenciação entre professores (categorias de docentes com as qualificações exigidas para, eventualmente, integrarem a carreira universitária ou de ensino superior) e assistentes (docentes que, sem possuírem as qualificações profissionais exigidas para a carreira, preenchem os requisitos mínimos para o desempenho de funções docentes de menor complexidade, em regra, em regime de emprego).

3. Conceito e requisitos da profissão docente

De acordo com o Estatuto do Pessoal Docente aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 2/2004, de 29 de Março, “entende-se por pessoal docente aquele que, nos termos do presente Estatuto, possui as qualificações profissionais adequadas para o exercício de funções de docência ou de ensino, com carácter permanente, sequencial e sistemático”.

Esta definição caracteriza-se pela sua grande generalidade, que permite enquadrar as diversas categorias de professores ou docentes abrangidos pelo Estatuto (os docentes dos estabelecimentos públicos dos diferentes níveis de ensino, exceptuando os de nível médio e superior)

Mas como todas as profissões, as profissões docentes possuem as suas especificidades. Assim, é ponto assente que a qualquer profissão docente requer, essencialmente, dois tipos de qualificações:

* As qualificações científicas ou académicas, que têm a ver com o domínio dos saberes que serão objecto de “apropriação” pelos alunos durante o processo educativo ou de ensino-aprendizagem;

* As qualificações pedagógicas, que implicam o domínio das metodologias e técnicas para o exercício da actividade profissional.

Apenas as últimas qualificações são teoricamente exclusivas do docente, enquanto educador e formador. Assim, por exemplo, não são as qualificações científicas que diferenciam um engenheiro químico de um professor de física, mas, essencialmente, as qualificações pedagógicas.

4. Requisitos e competências de gestão ou de natureza gerencial

Hoje em dia, o docente não se apresenta como um mero “dador” de aulas ou “transmissor” de conhecimentos.

“Aprender a aprender” e “aprender aprendendo” são formulações que não constituem meras retóricas, mas que devem traduzir uma orientação quanto às metodologias e tecnologias mais adequadas ao sucesso das aprendizagens.

Desde sempre, o professor foi (e, porventura, continua a ser) o principal agente educativo e promotor das aprendizagens dos seus alunos, mas nunca foi nem é o único “instrutor”, “educador” e “formador” dos mesmos, intervindo no processo educativo muitos outros agentes (alunos, pais, família, vizinhos, igrejas, comunicação social, etc.), consciente ou inconscientemente, por palavras, imagens, sons, actos e omissões…

Na verdade,
a) “Ninguém é totalmente sábio nem totalmente ignorante”, pelo que “todos educam”, na asserção de Paulo Freire;
b) Nós aprendemos ou devemos “aprender nos livros e na experiência dos outros, aprender junto do nosso povo, aprender sempre”, na abordagem de Amílcar Cabral;
c) A educação realiza-se na escola mas para além dela, “ao longo a vida”, segundo Delors.

A educação moderna, na era das TIC e num mundo cada vez mais globalizado em que vivemos, o professor tem necessidade de desenvolver a sua função de “gestor” e animador do processo de aprendizagem, no qual, além dos seus próprios alunos, participa, como vimos, uma rede mais ou menos complexa de agentes, na esteira do que se designa por “aprendizagem social” ou em “rede colaborativa”.

Daí o enfatizar-se a dimensão gerencial do processo de aprendizagem que o docente tem de assumir e desenvolver com o seu grupo de alunos, procurando promover a integração harmoniosa dos saberes, valores e competências provindos de diversas fontes (manuais, aulas, relações sociais, etc.).

Mas a dimensão gerencial da actividade docente não se esgota nas relações que estabelece directamente com os seus educandos.

Efectiva-se e desenvolve-se na perspectiva da participação do docente na gestão da organização/instituição escolar a que pertence. Para além de um direito e um dever que decorrem do Estatuto do Pessoal Docente (EPD), como veremos adiante, a participação dos docentes (e, já agora, dos demais agentes educativos) no processo de gestão escolar constitui uma premissa necessária quer para a maximização das possibilidades de sucesso da escola a que pertence, quer para a satisfação cabal das necessidades de sua realização enquanto indivíduos, profissionais e membros da sociedade.

A abordagem da dimensão gerencial da função docente justifica-se ainda porque vários professores são chamados a exercer, cumulativamente ou a tempo inteiro, funções específicas de gestão, cujo desempenho é objecto de avaliação.

Assim, se, na avaliação de desempenho dos professores afectos à actividade docente, existem aspectos que apresentam algum conteúdo gerencial, já a avaliação dos docentes incumbidos especialmente de funções de gestão (directores e membros dos conselhos directivos das escolas secundárias, gestores e coordenadores do ensino básico) obedece a critérios próprios, como iremos salientar.

Estamos a entrar no cerne da avaliação de desempenho dos docentes.

5. Correlação entre o conteúdo funcional e a avaliação de desempenho

Quando se refere à avaliação de desempenho do pessoal docente, do que se fala propriamente?

É do senso comum que não se deve avaliar o desempenho de um docente fora do que constitui, legalmente, o seu conteúdo funcional, ou seja da actividade que desenvolve na fruição dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres.

Que direitos são esses? São os que constam do artigo 5º do EPD, a saber:
1) Os direitos gerais estabelecidos para a generalidade dos funcionários e demais agentes da Administração Pública;
2) Os direitos profissionais decorrentes do seu próprio Estatuto, a saber:
a) Participar no funcionamento do sistema educativo e na vida da escola;
b) Participar na orientação pedagógica dos estabelecimentos de ensino;
c) Participar em experiências de inovação pedagógica;
d) Eleger e ser eleito para os órgãos de gestão das escolas, nos termos previstos na lei;
e) Ter aceso à formação com vista à actualização e reforço dos conhecimentos e evolução na carreira;
f) Dispor dos apoios e recursos necessários ao bom exercício da profissão;
g) Dispor de segurança social e na actividade profissional, nos termos da lei;

E de que deveres se trata? Trata-se dos deveres a que se refere o artigo 6º do EPD, a saber:
1) Os deveres estabelecidos para os funcionários e demais agentes do Estado em geral;
2) Os deveres profissionais decorrentes do seu Estatuto, nos termos do qual o desempenho do docente deve orientar-se para níveis de excelência, consistindo no seguinte:
a) Contribuir para a formação e realização integral dos alunos;
b) Manter um comportamento exemplar perante alunos e menores em geral, abstendo-se, nomeadamente, de estabelecer relações sexuais ou amorosas com os mesmos ou de os assediar sexualmente;
c) Colaborar com todos os intervenientes do processo educativo, favorecendo a criação e o desenvolvimento de relações de respeito mútuo, em especial entre docentes, alunos, encarregados de educação e pessoal não docente.
d) Participar na organização e assegurar a realização das actividades educativas;
e) Gerir o processo de ensino-aprendizagem, no âmbito dos programas definidos;
f) Enriquecer e partilhar os recursos educativos, bem como utilizar novos meios de ensino que lhes sejam propostos, numa perspectiva de abertura à inovação e de reforço da qualidade da educação e do ensino;
g) Co-responsabilizar-se pela preservação e uso adequado de equipamentos e instalações e propor medidas de melhoramento e renovação;
h) Participar, de forma empenhada, nas acções de formação contínua organizadas pelo departamento governamental responsável pela educação ou em quaisquer outras iniciativas de capacitação ou actualização profissional que lhe disserem respeito, quer na qualidade de formador, quer na de formando;
i) Assegurar a realização de actividades educativas de acompanhamento de alunos, destinadas a suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente;
j) Cooperar com os restantes intervenientes do processo educativo na detecção da existência de casos de crianças ou jovens com necessidade educativas especiais;
k) Manter os órgãos de gestão das escolas informadas sobre os problemas que se detectem no funcionamento das escolas e dos cursos;
l) Participar nos actos constitutivos dos órgãos de gestão das escolas.


6. Objectivos e incidência da avaliação de desempenho

Assim como os demais funcionários, os docentes dos estabelecimentos de educação pré-escolar, básica, secundária e da educação de adultos estão sujeitos a uma avaliação de desempenho que, nos termos do respectivo Estatuto (artº 29º), deve nortear-se pelos seguintes objectivos:
a) Melhorar a qualidade da educação e do ensino ministrados;
b) Adequar a organização do sistema educativo às necessidades educacionais;
c) Melhorar a prestação pedagógica e a qualidade profissional dos docentes;
d) Valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos docentes.

Segundo o EPD (artigo 30º), a avaliação de desempenho do pessoal incide sobre a actividade profissional desenvolvida pelos docentes na educação e no ensino, tendo em conta as suas qualificações profissionais e científicas e é reportada a períodos de tempo específicos.

7. Tipos de avaliação de desempenho

O EPD distingue dois tipos ou processos de avaliação de desempenho do pessoal docente:
a) O processo comum de avaliação;
b) O processo especial de avaliação.

Assim, o processo comum de avaliação de desempenho efectua-se, anualmente e em relação ao ano lectivo anterior, tendo lugar nos meses de Julho a Setembro. É dele, especialmente, de que nos ocupamos.

O processo especial de avaliação visa proporcionar aos docentes:
a) A possibilidade de acelerar a promoção na carreira por força da especialização;
b) A correcção de classificação negativa na avaliação de desempenho.

Conforme o EPD, os docentes interessados podem requerer a abertura de processo especial caso frequentem com êxito de cursos de especialização ou tenham obtido uma classificação negativa na avaliação de desempenho. Neste último caso, pressupõe-se que, subsequentemente a uma avaliação negativa, se verifiquem factos susceptíveis de fundamentar a alteração do juízo anteriormente feito sobre o desempenho do docente. Assim, o regulamento de avaliação de desempenho estabelece que entre a data da classificação negativa e a do pedido de abertura do processo especial deve decorrer, pelo menos, seis meses.

A lei e o regulamento não desenvolvem o processo especial de avaliação, que não tem sido implementado, o que não nos causa admiração. Na verdade, sempre considerámos que o mesmo teria pouca exequibilidade, à luz das normas gerais e praxes actuais de gestão de recursos humanos na Administração Pública.

8. Normas regulamentares e instrumentos de avaliação

As normas gerais relativas à avaliação de desempenho constantes do Estatuto do Pessoal Docente são retomadas e desenvolvidas no regulamento de avaliação, que já foi objecto de referências pontuais.

Este regulamento, aprovado pelo Decreto-regulamentar nº 10/2000, de 4 de Setembro, estabelece que a avaliação de despenho do docente é de carácter contínuo e sistemático, sem prejuízo da avaliação anual, que tem lugar, ordinariamente, entre Julho e Setembro, por iniciativa do órgão de direcção do respectivo estabelecimento de ensino, que deve ter em conta o parecer do correlativo órgão de gestão pedagógica (Núcleo Pedagógico, Conselho Pedagógico) ou por iniciativa do próprio professor que, neste caso, e no momento adequado (até 20 de Junho), deve desencadear o processo, através de um relatório de autoavaliação que será objecto de apreciação e decisão pelo órgão de gestão da respectiva escola.

O diploma prevê ainda dispositivos diferenciados de avaliação dos professores investidos em actividades lectivas e dos afectos às actividades de gestão e coordenação.

Algumas das particularidades deste diploma residem: no facto de prever amplas garantias ao avaliado, que pode assim accionar vários mecanismos de modo a lograr uma avaliação justa; na circunstância de que o docente terá a classificação de Bom caso não tiver sido avaliado por razões que não lhe sejam imputáveis. Neste caso, nem o docente fica sem avaliação nem lhe é atribuída a classificação máxima, restando-lhe sempre a possibilidade de ele propor para si mesmo uma avaliação de Muito Bom em face do silêncio da Administração, desde que se julgue no direito de ter uma avaliação superior.

O que nos preocupa, sobremaneira, quando nos confrontamos com a praxe de avaliação de desempenho do pessoal docente, é o facto de, de um modo geral, os professores (e não só) conhecerem apenas as fichas de avaliação que lhes são distribuídas para preenchimento ou assinatura, no fim de cada ano, revelando um desconhecimento completo do regulamento dessa avaliação, que acabámos de apresentar em traços gerais, acabando as fichas por serem mal interpretadas ou aplicadas.

Por isso mesmo, importa que analisemos, com mais detalhe, o conteúdo do regulamento de avaliação de desempenho do pessoal docente: as normas e os instrumentos ou fichas que o compõem (vide regulamento e fichas em anexo).

Além do que referimos acima, eis os aspectos relevantes do regulamento, em termos de metódica processual:

* O diploma regulamentar prevê dispositivos e instrumentos diferenciados de avaliação dos professores investidos em actividades lectivas e dos afectos às actividades de gestão e coordenação a nível do ensino básico e secundário e da alfabetização/educação de adultos:
a) A avaliação dos docentes e animadores é feita pelos respectivos directores e gestores de escolas ou coordenadores da Alfabetização, com base numa ficha própria;
b) Os directores, gestores, coordenadores da alfabetização e coordenadores pedagógicos concelhios são avaliados pelo Delegado, com base numa ficha própria, com as devidas garantias processuais;
* Note-se, porém, que a conhecida ficha de avaliação anual é apenas o documento final onde devem constar os dados do balanço do desempenho do docente ao longo do ano;
* Deve haver também um registo de avaliação contínua, onde devem constar os dados da avaliação do desempenho do docente no quotidiano da sua acção;
* O docente deve ter acesso, caso o solicitar, aos registos da sua avaliação, com o direito de solicitar a rectificação dos dados que deles constarem;
* Quer tenha lugar por iniciativa do avaliado, quer por iniciativa da entidade administrativa competente, a avaliação deve ser sempre precedida de pronunciamento ou parecer fundamento do órgão de gestão pedagógica das escolas (Conselho Pedagógico, Núcleo Pedagógico) ou dos Orientadores Pedagógicos das estruturas de alfabetização/educação de adultos, sob pena de poder suscitada a sua revogação ou anulação;
* A avaliação de desempenho deve ser dada a conhecer ao avaliado em entrevista individual, devendo o avaliado manifestar por escrito a sua concordância ou não (a recusa em tomar conhecimento da avaliação deve ser testemunhada por duas pessoas, sendo tal circunstância averbada no processo);
* Da avaliação feita cabe reclamação perante o avaliador, no prazo de cinco dias, devendo o avaliado fundamentar devidamente o pedido de alteração das apreciações/classificações atribuídas;
* Havendo reclamação, esta é levada ao órgão ou entidade responsável pela gestão/orientação pedagógica para parecer, após o que é proferida decisão fundamentada;
* Havendo concordância do avaliado, o processo é enviado ao delegado do Ministério para homologação;
* Havendo discordância com a avaliação feita pela entidade competente, o avaliado pode interpor recurso perante a Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário;
* Não havendo recurso, o processo é submetido à homologação do Delegado do Ministério;
* Se o Delegado não homologar a avaliação, deve, por despacho fundamentado, devolver o processo à escola para, no prazo de cinco dias, proceder à rectificação da avaliação, após a audição do órgão ou entidade responsável pela gestão/orientação pedagógica;
* Se a entidade avaliadora mantiver a sua posição, o delegado pode homologar ou modificar a classificação, devendo, no último caso, dar a conhecer a sua decisão ao avaliado, para efeitos de manifestação de concordância ou de interposição de recurso hierárquico para a DGEBS ou a DGAEA, no prazo de cinco dias;
* A entidade competente ausculta a IGE, que emitirá parecer no prazo de quinze dias;
* Recebido o parecer da IGE, a DGEBS/DGAEA decide o recurso no prazo de cinco dias;
* O avaliado pode, no caso de discordar da decisão de recurso, interpor recurso hierárquico necessário junto do membro do Governo responsável pela educação, no prazo de 30 dias;
* Da decisão ministerial sobre o recurso, cabe recurso contencioso nos termos da lei (junto do Supremo Tribunal);
* Até 20 de Setembro, as delegações enviam os processos de avaliação, acompanhados de um mapa geral, à IGE, para a verificação da regularidade dos mesmos;
* Verificada a regularidade dos processos de avaliação docente, a IGE envia-os ao serviço central de gestão dos recursos humanos para efeitos de inclusão nos processos individuais;
* A pedido do avaliado, o serviço de recursos humanos pode emitir certidão da classificação de desempenho ou mandar extrair cópia do processo de avaliação, cabendo ao interessado suportar os encargos inerentes
Como se vê, o sistema de avaliação, cujos traços apresentamos, procura, através das garantias que proprociona aos avaliados, contribuir para que a avaliação seja justa e objectiva, eliminando ou reduzindo ao máximo a carga de subjectividade na sua realização.

9. Breve referência às fichas de avaliação anual
A avaliação anual do exercício das funções docentes (incluindo a modalidade de autoavaliação) é feita em função de 6 factores de avaliação, que são objecto de apresentação detalhada na respectiva ficha, de modelo I, a saber:
a) Qualidade do processo de ensino-aprendizagem;
b) Aperfeiçoamento profissional;
c) Inovação pedagógica;
d) Responsabilidade;
e) Relações humanas no trabalho;
f) Actividades não lectivas.
A avaliação anual do exercício das funções de gestão e coordenação (incluindo a modalidade de autoavaliação) é feita em função de 7 factores de avaliação, que são objecto de desenvolvimento na respectiva ficha, de modelo II, a saber:
a) Qualidade do trabalho;
b) Aperfeiçoamento profissional;
c) Iniciativa;
d) Responsabilidade;
e) Relações humanas no trabalho;
f) Espírito de equipa;
g) Capacidade para dirigir e coordenar.

O desempenho em cada um dos domínios (factores) é objecto de graduação em quatro escalas ascendentes, com um intervalo de 5 pontos, num total de 20 pontos. Entretanto, cada um dos factores possui um coeficiente ou ponderação, em função da relevância que lhes é atribuída. Assim, na avaliação docente, a qualidade do processo de ensino-aprendizagem tem maior peso ou coeficiente (3 x), contra 2 para os factores Responsabilidade e Actividades não lectivas e 1 para os restantes. No total, a avaliação é de 100 pontos.

10. Nota Final:
Embora não figure como norma regulamentar, é de boa praxe que o desempenho do pessoal docente seja objecto de um balanço no seio dos professores, que poderão opinar, por exemplo, sobre os que mais se destacaram durante o ano.
Se for dada a conhecer, discutida ou mesmo publicada a nível da escola, a avaliação de desempenho pode tornar-se num instrumento capaz de contribuir para generalização das boas práticas e para a consecução dos objectivos para que propende




Praia, 16 de Dezembro de 2008
Bartolomeu Varela
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sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A Universidade de Cabo Verde comemora o seu II aniversário com o lançamento oficial dos primeiros cursos superiores profissionalizantes


1. Enquadramento e objectivos dos Cursos Superiores Profissionalizantes

No âmbito da sua missão e fins estatutários, a Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) desenvolve, em paralelo com as suas actividades de formação graduada e pós-graduada, um Programa de Formação Pós-Secundária Profissionalizante, constituído por um vasto leque de projectos de formação, cujo objectivo é contribuir para o desenvolvimento da capacidade empreendedora da sociedade cabo-verdiana e da competitividade da economia nacional, num quadro de concertação de estratégias e de desenvolvimento de parcerias com outras instituições de ensino e de formação, empresas, ordens e associações profissionais, etc.
Com esta iniciativa, a Uni-CV propugna contribuir para o combate ao abandono precoce do ensino, promover a formação contínua e a requalificação profissional, preparar o público-alvo para lidar com as transformações tecnológicas e organizacionais e, ainda, dar ao tecido económico e administrativo uma clara mais-valia.

O Programa de Formação Pós-Secundária da Uni-CV é executado, essencialmente, através de Cursos de Estudos Superiores Profissionalizantes (CESP), que constituem um subsistema de ensino universitário de curta duração, de organização flexível e desconcentrada, de modo a cobrir, progressivamente, as diferentes regiões do país.

O Programa visa, assim, promover, através do alargamento das possibilidade de acesso a saberes e competências de índole aplicada, a qualificação para o exercício de diversas profissões que se afiguram como imprescindíveis para a satisfação das necessidades de transformação socio-económica do país e de realização pessoal, social e profissional dos cidadãos, em particular de uma expressiva camada de jovens saídos do ensino secundário.

Os CESP constituem, também, uma forma adequada de assegurar a igualdade de oportunidades de acesso a uma qualificação profissional de nível superior, apresentando-se como uma alternativa credível susceptível de cativar mais jovens e adultos para o sistema de educação e formação profissional.

No quadro dos CESP, é fortemente incentivado e estimulado o espírito empreendedor dos formandos, para o que deverão apoiar-se em mecanismos ou estruturas de ligação das acções de formação científica e tecnologia à prática real ou simulada de actividades de índole profissional.

2. Duração e organização curricular

Os Cursos de Estudos Superiores Profissionalizantes (CESP) são percursos formativos pós-secundários, de duração média de catorze (14) meses, com uma carga horária de 1.200 a 1500 horas, que incluem componentes de formação geral e científica, de formação tecnológica, e de formação em contexto de trabalho (estágios em empresas ou organismos públicos).

Os planos de estudos e os programas curriculares dos CESP estruturam-se em três componentes essenciais, a saber:

a) A componente de formação geral e científica, que visa proporcionar o acesso a conhecimentos de natureza científica que fundamentam as tecnologias próprias da área de formação, assim como desenvolver atitudes e comportamentos adequados a profissionais com elevado nível de qualificação profissional e adaptabilidade ao mundo do trabalho e da empresa;
b) A componente de formação tecnológica, que integra domínios de natureza tecnológica orientados para a compreensão das actividades práticas e para a resolução de problemas do âmbito do exercício profissional;

c) A componente de formação em contexto de trabalho, que propicia a aplicação dos conhecimentos e saberes adquiridos às actividades práticas do respectivo perfil profissional e execução de actividades sob orientação, utilizando as técnicas, os equipamentos e os materiais que se integram nos processos de produção de bens ou prestação de serviços.

3. Certificação e creditação

Além de conferirem diplomas e certificados de Estudos Superiores Profissionalizantes, de nível equivalente aos cursos de formação profissional de nível IV, a que se refere o artigo 25º do Decreto-Lei nº 37/2003, de 6 de Outubro, que visam preparar os diplomados para uma integração vantajosa no mercado de trabalho, os referidos cursos conferem créditos para efeitos de eventual prosseguimento dos estudos conducentes à obtenção do grau académico de licenciatura, nas áreas de conhecimento correspondentes.

4. Principais Ofertas Formativas

Sem prejuízo de outras a serem analisadas, em função dos contextos e das necessidades efectivas de formação, a Uni-CV preconiza a organização e a implementação, nos próximos anos, de cursos de estudos superiores profissionalizantes (CESP) em diversas áreas, designadamente:

Micro-Irrigação e Novas Tecnologias de Produção Agrícola
Organização e Gestão de Eventos
Topografia e Desenho Assistido por Computador
Animação turística
Desenvolvimento Local
Gestão e Acompanhamento de Obras
Instalação e manutenção de Redes e Sistemas Informáticos
Tecnologia Mecatrónica
Manutenção Industrial (Manutenção de Equipamentos Hospitalares e Hoteleiros)
Tecnologias de Programação de Sistemas de Informação
Tecnologias de electricidade electrónica;
Banca e Seguros;
Secretariado Executivo;
Agro-Negócios e Desenvolvimento Rural
Organização e Planificação do Trabalho; Organização e Manutenção dos Sistemas de
Transporte;
Administração e Gestão Hoteleira;
Técnicas de Contabilidade
Desenvolvimento Social e Comunitário
Mestre do alto Pescador
Bio-diagnóstico
Instalações Eléctricas e Automação Industrial
Instalações solares
Manutenção de Instalações Técnicas e da qualidade do ar interior em edifícios

5. Potenciais destinatários
Os Cursos Superiores Profissionalizantes, que integram o Programa de Formação Pós-Secundária da Universidade de Cabo Verde, são destinados:

a) Aos titulares de um curso de ensino secundário ou habilitação legalmente equivalente;
b) Aos titulares de uma qualificação profissional de nível III;
c) Aos titulares de um curso de estudos superiores profissionalizantes ou de um grau ou diploma de ensino superior que pretendam a sua requalificação profissional;

Podem ainda candidatar-se os indivíduos com idade igual ou superior a 25 anos, aos quais, com base na experiência, a Uni-CV reconheça, nos termos da lei, capacidades e competências para o ingresso no CESP em causa.


6. Parcerias para os CESP

O Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), através da rede de Centros de Formação Profissional, e as Escolas Secundárias e Técnicas, apresentam-se como os principais parceiros no desenvolvimento das ofertas formativas profissionalizantes, a serem desenvolvidas através dos CESP.

De igual modo, e tendo em vista a integração no mercado de emprego e a formação em contexto de trabalho, a Uni-CV celebra acordos ou outras formas de parceria com empresas e outras entidades empregadoras, associações empresariais ou socioprofissionais e outras organizações vocacionadas.

7. Oferta formativa para o ano lectivo 2008/2009

O Programa de Formação Pós-Secundária da Uni-CV, anunciado hoje, durante o acto central de comemoração do II Aniversário da Uni-CV, presidido pelo Primeiro-Ministro de Cabo Verde, Dr. José Maria Neves, arranca, no corrente ano lectivo (2008/2009), com os seguintes cursos, a serem frequentados por cerca de 600 alunos:

i. Topografia e Desenho Assistido por Computador
ii. Gestão e Acompanhamento de Obras
iii. Manutenção de Equipamentos Hospitalares e Hoteleiros
iv. Técnicas de Contabilidade e Gestão
v. Agro-Negócios e Desenvolvimento Rural
vi. Desenvolvimento Social e Comunitário
vii. Instalação e Manutenção de Redes e Sistemas Informáticos
viii. Tecnologia Mecatrónica
ix. Mestre do Alto Pescador
x. Bio-Diagnóstico
xi. Micro -irrigação e novas Tecnologias de produção Agrícola

No imediato, isto é, de Novembro deste ano a Janeiro de 2009, deverão ter início os primeiros seis cursos acabados de referir, ficando o arranque dos demais dependente da confirmação do respectivo financiamento.

8. IEFP, principal parceiro no arranque dos CESP
Porque a formação profissional de nível IV se enquadra-se no ambicioso programa de formação profissionalizante previsto no Plano Estratégico da Formação Profissional 2006-2010, o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) é o principal parceiro da Uni-CV na implementação destes cursos, mediante a disponibilização de instalações e o co-fianciamento dos encargos com os formadores, nos termos do Protocolo e do Contrato de Parceria assinados no início do acto central de comemoração do 2º aniversário da Uni-CV, entre o Reitor da Universidade e a Directora-Geral do IEFP.

domingo, 9 de novembro de 2008

Universidade, universalidade e apartidarismo

Na semana finda, a Universidade de Cabo Verde foi alvo de graves e falsas acusações por parte de dois jornais cabo-verdianos, conhecidos pelo seu alinhamento político-partidário com a oposição ao actual Governo, alinhamento que, de per si, não está em causa, por ser expressão da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa, que têm guarida na Constituição do país.

O que, sim, está em causa é a falsidade das acusações segundo as quais a direcção da Universidade Pública teria integrado na carreira docente altas figuras políticas da situação, como a última Ministra da Educação e Ensino Superior, Filomena Martins, e o actual Primeiro-Ministro, José Maria Neves, assim como promovido outros docentes, como o ex-Presidente do ISE, António Lobo de Pina, segundo critérios político-partidários.

Dando de barato que esses jornais não agiram por má fé, mas sim na crença de que suas fontes eram credíveis, nem por isso tais jornais deixaram de prestar um mau serviço aos cabo-verdianos (e não só) quando, ainda que involuntariamente, descambaram na calúnia, lavrando o seu próprio descrédito, quando bem poderiam evitar isso e seguir a via da verdade dos factos, que estaria ao seu alcance, bastando que seguissem as regras de oiro do jornalismo sério: a observância do princípio do contraditório, ouvindo a outra parte (a Uni-CV, no caso) e a investigação cuidada, ainda que sumária, das denúncias.

Por esta altura, já terão sido desmentidos os factos publicados pelos jornais em causa:

Filomena Martins não só não foi integrada, como docente, na Uni-CV como nem sequer concorreu às vagas postas recentemente a concurso. Convenhamos que, caso assim quisesse, ela teria direito a concorrer a essas vagas, como o fizeram centenas de quadros, nacionais e estrangeiros, cabendo ao competente júri decidir soberanamente acerca do seu perfil.

José Maria Neves também não foi integrado como docente da Uni-CV, precisamente porque tal não era necessário: professor de nomeação definitiva do extinto Instituto Superior de Educação, vários anos antes de chegar ao cargo de Primeiro-Ministro, tinha o direito de, nessa qualidade, transitar, sem favor, para a Uni-CV, como, de resto, aconteceu com todos os demais colegas professores do ISE. Para isso, nem era necessário requerer a transição. Esta ocorre, nos termos e por força da lei, com a salvaguarda dos direitos adquiridos.

António Pina transitou para a Uni-CV como Assistente, categoria profissional em que se encontra contratado.

Os casos de ascensão a categoria superior ocorreram com a observância rigorosa da lei, seja pela via da posse de grau académico superior, seja pela via da promoção ordinária. Para a Uni-CV, os contemplados são simplesmente docentes, em nada relevando a sua cor política.

É preciso que, de uma vez por todas, se entenda que a Universidade Pública não é coutada de nenhum partido político: assumindo, consequentemente os princípios da universalidade e do apartidarismo, a Uni-CV é uma universidade aberta a todos os que, pelo mérito e dentro da legalidade, desejem contribuir para que ela possa levar a bom termo a sua missão: proporcionar um ensino superior de elevada qualidade, à altura da ambição do país e das exigências do seu desenvolvimento sustentável.

Estará fadada ao fracasso toda a tentativa de instrumentalização e banalização políticas da Uni-CV. Tentativas do género serão firmemente denunciadas e combatidas, sob pena de ficar seriamente comprometida a referida missão.

Efectivamente, Cabo Verde precisa de uma universidade pública para todos os cabo-verdianos, sem discriminação de espécie alguma.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Inovações no ensino básico e no sistema educativo em Cabo Verde

A qualidade da educação, em todos os níveis do sistema educativo, é ou deve ser uma aposta permanente dos poderes públicos, da Administração Educativa e das comunidades escolares e, do mesmo passo, uma reividicação sempre actual das famílias e da sociedade em geral, tanto em Cabo Verde como pelo mundo fora.
Trata-se de uma aposta e reivindicação permanentes, porquanto a educação, como qualquer obra humana, é, sempre, uma tarefa inacabada, um projecto em construção. A conquista, num dado contexto, de certos patamares ou indicadores de excelência na prestação do serviço educativo não deve justificar uma postura contemplativa e de auto-satisfação por parte dos gestores e agentes educativos, devendo traduzir-se, antes, na procura interessada, persistente e sistemática de novas formas de acrescentar valor ao serviço educativo que há-de ser prestado nos momentos seguintes, sob pena de o mesmo serviço deixar de corresponder às exigências do processo de transformação social ou, dito de outro modo, às demandas no sentido da satisfação das necessidades humanas, sempre crescentes. De contrário, a excelência de hoje transforma-se em mediocriadade de amanhã e o país, no seu todo, perde qualidade e capacidade competitiva no mundo. Eis porque parar em educação significa regredir no processo de desenvolvimento!
E é por ter tomado conhecimento, entre outras, de duas mudanças positivas na educaçao básica em Cabo Verde que faço este registo, que tem a pretensão de aplaudir as medidas tomadas, incentivando os decisores, gestores e agentes educativos a prosseguir na via da criação de condições para a introdução de inovações cada vez mais significativas nesse subsistema de ensino que tem um papel crucial na preparação para o exercício da cidadania e a integração na vida activa.
Refiro-me, entretanto, a medidas que pecam pela sua adopção tardia. De todo o modo, mais vale tarde do que nunca, como sói dizer-se. Uma dessas medidas é a generalização do acesso ao ensino básico com a idade de 6 anos, independentemente da frequência da educação pré-escolar, acabando-se, assim, com a penalização injusta das crianças que, por não terem tido o privilégio de frequentar jardins-de-infância (normalmente devido a carências socio-económicas das suas famílias), eram obrigadas a entrar no ensino básico com 7 anos de idade (e não com 6 anos, como as que frequentavam a educação pré-escolar), com consequências nefastas no seu percurso escolar. Efectivamente, ao ingressarem com 7 anos, sem terem tido qualquer preparação (propedêutica) para a entrada na escola, esses alunos perdiam um precioso ano, sem que pudessem recuperar o tempo perdido, com a agravante de entrarem na escola na situação de desvantagem em relação aos que frequentaram o jardim. Teve-se de esperar por quase duas décadas para se corrigir essa injustiça. Mas valeu.
A outra medida, tomada a título de experiência-piloto, consiste na superação da mono-docência na 3ª fase do ensino básico (5º e 6º anos), confiando a dois (ou mais) docentes a organização conjunta do ensino-aprendizagem em duas (ou mais) turmas, em regime de alternância de horários, cabendo a cada um deles a leccionação de áreas disciplinares específicas, em função da sua formação e experiência. Deste modo, promove-se a qualificação ou "especialização" de docentes, com possíveis vantagens em termos de qualidade das aprendizagens dos alunos, do mesmo passo que se vai preparando os discentes para o ingresso no nível de ensino subsequente (o secundário ou liceal), onde vigora a "pluri-docência" (em que a cada docente é confiada, em regra, uma só disciplina).
Inúmeras outras medidas se impõem, para a melhoria do ensino básico em Cabo Verde: introdução do cabo-verdiano como língua de escolarização, a par da língua portuguesa; iniciação às TIC; introdução de línguas estrangeiras; aprimoramento das metodologias de iniciação à leitura e ao cálculo; ligação das aprendizagens com o desenvolvimento de competências para a vida; modernização e adequação dos sistemas de avaliação, etc, etc.
Acredito que, aos poucos, mas sem parar, encontraremos respostas efectivas aos desafios de inovação educacional! E se falamos, aqui e agora, da necessidade de inovações contínuas no ensino básico, com igual ou maior razão devemos falar de mudanças educacionais requeridas nos demais níveis de ensino, mediante uma abordagem global, integrada e sistemática da problemática da educação e dos desafios da sua modernização e qualificação, tendo em vista a elevação do nível de qualificação e de empreendedorismo dos cidadãos cabo-verdianos.
Praia, Outubro de 2008.
Bartolomeu Varela

domingo, 3 de agosto de 2008

Nem tudo o que é Ensino Superior é Universidade!

Li, há dias, num dos semanários da capital cabo-verdiana, uma reportagem em que é dada a conhecer ao público alguma celeuma criada (diga-se de passagem, intempestivamente) a propósito de uma proposta de estatuto de pessoal docente da Universidade de Cabo Verde, lançada à discussão pela reitoria da mesma universidade. Chamaram-me a atenção algumas afirmações bombásticas de um dos docentes entrevistados, para quem a qualidade, um dos valores que a proposta de diploma propugna, é “uma falsa questão” pois, “se a Uni-CV hoje existe é graças ao ISE e ao ISECMAR” e que “em todo o processo de construção da Uni-CV não há nada de novo, tudo foi feito até aqui pelos docentes do ISE” (sic).

Todos os que acompanham, com interesse, a evolução da educação em Cabo Verde reconhecem o contributo do ISE para o desenvolvimento do ensino superior público (e não só) neste país. Tampouco ignoram o papel desempenhado, nesse sentido, por outros institutos públicos de ensino superior, assim como o potencial humano, científico, tecnológico e logístico que os diversos institutos, sem excepção, encerram, razão por que os mesmos se constituem em unidades associadas da universidade pública, nos termos da lei.

Mas o docente em questão, porventura involuntariamente, confunde alguma opinião pública menos esclarecida quando afirma que, em todo o processo de implementação da universidade pública, não há nada de novo, atribuindo, em exclusivo, ao ISE os louros de tudo quanto foi feito até aqui. Para esse docente, além do trabalho do ISE (que reconheço como meritório), nada existe, afirmação infundada e que, levada às últimas consequências, significaria que a Reitoria, o Governo, os demais institutos, as muitas universidades que colaboram com a Uni-CV nada têm feito nesse processo.

Assim, pergunto:
- Não teve importância a medida legislativa que transformou o ISE de uma instituição que se limitava a formar professores do ensino secundário para uma instituição de formação de quadros superiores em diversas áreas de conhecimento?
- Os trabalhos de desenvolvimento curricular dos novos cursos e de reconfiguração curricular dos cursos que vinham sendo ministrados não têm valor nenhum?
- Não constitui nada de novo a criação de mais de uma dezena de cursos de licenciatura e diversos cursos de mestrado em áreas de interesse relevante para o desenvolvimento do país, nomeadamente a nível das ciências e tecnologias básicas e das engenharias?
- Não significa nada a vinda a Cabo Verde, com frequência, de docentes altamente qualificados, de várias universidades parceiras, para a leccionação nos cursos de mestrado?
- Que dizer a propósito das deslocações frequentes de professores universitários de Portugal, Brasil e outros países para o suprimento de lacunas existentes a nível do corpo docente do ISE e outros institutos? Não têm relevância?
- A melhoria das condições de leccionação, designadamente com o apetrechamento de laboratórios e a instalação de equipamentos informáticos, nada significa?
- Não valem para nada os estudos estratégicos sobre o desenvolvimento da universidade pública, as propostas de diplomas legais elaboradas pela reitoria da Uni-CV (incluindo o estatuto de pessoal docente submetido à discussão), o orçamento integrado da Universidade e os diversos projectos de investimento no ensino superior público?
- Os programas de pós-graduação (mestrado e doutoramento) em preparação de modo a capacitar docentes em exercício nos institutos não têm relevância?

Bem, fiquemos por estas questões, em relação às quais, estou convicto, dificilmente se responderá de forma negativa (ou seja, que isso tudo não é “nada de novo”), sob pena de se cair no ridículo.
Estamos, todavia, todos, de acordo que é preciso fazer-se muito mais, desde que todos e cada um (docentes, trabalhadores, estudantes, dirigentes universitários, governantes) façam a sua parte, cumprindo o papel que lhes cabe na autêntica epopeia que é construir no chão das ilhas uma universidade de excelência, à nossa dimensão e de acordo com as nossas ambições de progresso!

Mas o que me preocupa, sobremaneira, é a confusão que parece existir, nalguns círculos, entre ensino superior e universidade. Convenhamos que não foi à toa que se criou uma universidade pública em Cabo Verde. Além das vantagens e do efeito sinergético decorrentes da integração, numa só instituição (a Uni-CV) do potencial existente a nível de cada um dos institutos, a universidade representa um salto qualitativo no processo de qualificação dos recursos humanos de que o país necessita para o seu desenvolvimento. Se toda a universidade é um estabelecimento de ensino superior, nem todo o estabelecimento de ensino superior constitui uma universidade.

Efectivamente, a universidade não se define apenas pela tendência em abarcar as diversas áreas de conhecimento, através de unidades orgânicas próprias e especializadas. A universidade vale, em especial, pela excelência das actividades académicas, que devem propiciar condições para o desenvolvimento das competências científicas, tecnológicas, culturais e profissionais de que uma sociedade precisa para atingir elevados padrões de progresso, num quadro em que a aprendizagem se desenvolve através da ligação do ensino à investigação e as competências adquiridas não ficam circunscritas aos muros da instituição de ensino mas tendem a ser utilizadas para o desenvolvimento da capacidade empreendedora da sociedade cabo-verdiana.
Em suma, a universidade, mormente uma universidade moderna, estriba-se numa tríade em que o ensino, a investigação e a extensão se conjugam para transformar a academia num instrumento de promoção de competências para a vida, de valorização dos indivíduos e de transformação social.

Pela sua missão e pela responsabilidade social que lhe é inerente, a universidade é um projecto de grande alcance estratégico, que é implementado no quadro de um processo em que se torna mister uma esclarecida visão de futuro, a par de acções consequentes e sistemáticas destinadas a materializá-la no quotidiano. Posto que a universidade de excelência é para um futuro que começa hoje!
Bartolomeu Varela

domingo, 6 de abril de 2008

Universidade de Cabo Verde: Modelos, visões e perspectivas contrastantes


Há dias, cruzei-me com um ex-membro do Governo responsável pelo sector da educação, com quem troquei breves palavras de simpatia que, logo, me pareceram azedar, da parte dele, quando soube que eu, enquanto Administrador-Geral, intregava a equipa dirigente da Universidade de Cabo Verde. "Ah! O que vocês estão a fazer não vale; esse modelo de universidade não vale, vai acabar com o ensino superior privado (sic!); a criação da Universidade, com a extinção dos actuais institutos públicos de ensino superior, é uma grande asneira! Vamos acabar com este modelo de universidade".

Face ao manancial de afirmações bombásticas e ameaçadoras do meu interlocutor, limitei-me a perguntar-lhe, de forma serena: "Mas você conhece o diploma legal que cria a Uni-CV? Conhece os princípios ou documentos estruturantes do projecto da universidade pública?"

Respondeu que não, ao que retorqui: "Talvez, se os conhecesse, veria que o que se está a fazer é a construção de uma universidade de excelência, captando-se, para o efeito, o potencial científico, tecnológico, humano, patrimonial e logísitico existente a nível dos actuais institutos públicos de ensino superior, os quais, transitoriamente (durante dois anos, em princípio) integram o Conselho da Universidade, até que se criem unidades próprias (departamentos, escolas superores, centros de investigação, etc), altura em que tais institutos se extinguirão, emergindo então"...

O ex-governante não me deixou prosseguir: "Ah! Isso não vale! ... "Eu vou acabar com isso quando... se eu for Poder". Brinquei: "Não vai conseguir!" E acrescentei: "Mas se chegar ao poder, terá pela frente uma universidade pública que, pela qualidade e relevância das suas actividades académicas, só merecerá apoio governamental, tanto mais que ..."

Interrompeu-me, novamente: "Eu vou acabar com isso, é uma asneira!". Então propus-lhe: "Porque não marcamos um encontro, os dois, para pormos na mesa os nossos modelos, visões e perspectivas de desenvolvimento da universidade pública e, desta arte, analisarmos, serenamente, a sua consistência e, quem sabe, desfazermos preconceitos, encontrarmos pontos de afinidades e contributos válidos"... Sou, novamente, interrompido: "não vale a pena, isso não serve; eu já disse isso ao Reitor. Eu vou acabar com isso!". Bem, não dava para continuar a conversa, até porque, na altura, tínhamos os nossos afazeres, pelo que, afavelmente, nos despedimos.

Fiquei com um nó na garganta, mas, sobretudo, com pena: há um ex-membro do Governo responsável pela educação que, ávido de voltar ao posto governamental, prefere ficar com os seus preconceitos e, com base neles, demarcar-se de algo que nem sequer conhece; tampouco pretende conhecer e discutir os princípios enformadores da estratégia de desenvolvimento da universidade pública, porventura com receio de constatar que não possui melhor alternativa que aquela que se está a construir; apenas diz e repete, como nessa história do anarquista típico: "não me importa o que estão a fazer, mas sou contra e, quando eu for poder, vou acabar com isso"!

Confio, todavia, que os políticos cabo-verdianos, na sua esmagadora maioria, da situação e da oposição, entendem que a universidade pública deve estar resguardada dos efeitos maléficos das estratégias de luta, a todo o custo, pelo poder. Com efeito, o interesse nacional exige que a universidade pública não seja mera caixa de ressonância dos interesses específicos dos partidos políticos, sejam eles do governo ou que aspiram a governar; que, nos seus projectos de organização e gestão e nas actividades de ensino, investigação e extensão que desenvolve, a universidade integre e potencie a expressão plural das opiniões e perspectivas de desenvolvimento científico, tecnológico e socio-económico, submetendo-as a uma análise que evidencie o que realmente serve a causa do progresso sustentável da nação cabo-verdiana.

Bartolomeu Varela

segunda-feira, 17 de março de 2008

No Dia do Pai, fala o filho!

Tomei parte, há dois dias, na festa comemorativa do Dia do Pai, organizada pela Escola do Ensino Básico “Eugénio Tavares”, frequentada pelo meu filho mais novo, o Márcio. Foi uma tarde extraordinária, durante a qual os pais dos alunos da escola, com quatro dias de antecedência em relação ao dia de São José, foram homenageados através de um programa de actividades que tinha de tudo um pouco: brincadeiras e jogos improvisados, com a participação dos filhos, pais, mães e outros convivas; cerimonial de homenagem ao pai, em que os filhos impuseram fitas e entregaram prendas aos respectivos pais; sessão de filme seguida de debate; lanche ao sabor de coisas da terra, como o saboroso cuscuz com leite, etc.


O filme “Ser e Ter” reportava aspectos interessantes da obra educativa desenvolvida algures numa certa aldeia de certo país. Pleno de ensinamentos importantes sobre a ciência e a arte de educar, o filme foi seguido de um debate, animado pela pedagoga Filomena, convidada para o evento.

Não me refiro aqui às sábias palavras da Filomena, que interpelou a assistência sobre o que é “Ser” pai e o que este deve “Ter” para o poder ser verdadeiramente. Permitam-me que partilhe convosco parte das opiniões expendidas, num português correcto, pela segunda figura do debate, o meu filho Márcio, de 6 anos: “o pai deve ter amor”… “deve ter carinho para o filho”, mas este “deve ser obediente” para com o pai.

Não que me surpreendesse a capacidade de reflexão do meu filho “caçula”! As palavras que ele proferiu são simples e até parecem banais. Mas será que todos os pais avaliam, na sua justa medida, o alcance do “amor” e do “carinho” na educação dos filhos? E que dizer da dimensão axiológica da educação que o Márcio expressou ao trazer para o debate o dever de “obediência” aos pais, muitas vezes esquecido ou relegado a um plano secundário?

Enfim, os filhos devem ser escutados a sério, não acham? Não apenas no Dia do Pai, mas todos os dias.

Bartolomeu

domingo, 6 de janeiro de 2008

A Gestão Segundo Bill Gates


Li, há poucos meses, o livro de Dês Dearlove, que leva o título em epígrafe. Porque o achei interessante, decidi redigir este texto, na tentativa de resumir a obra. Porque o faço? Por entender que os gestores de sucesso devem começar a ser formados na escola, ainda que seja a “escola da vida”, em cada contexto, a "moldar” o perfil desses gestores, seguindo a tese muito em voga, hoje em dia, da “formação ao longo da vida”.

Personalidade fenomenal e mesmo genial da economia moderna, Bill Gates é, também, o homem mais rico do mundo e, sobretudo, o maior dos magnatas tecno-sábios. Efectivamente, destaca-se na história recente do mundo da tecnologia e da economia não apenas pela sua imensa riqueza, mas especialmente pelo seu brilhantismo técnico, uma notável visão para os negócios, um obsessivo desejo e uma enorme capacidade de vencer. Tem marcado a diferença por um estilo de liderança radicalmente diferente de tudo o que o mundo empresarial conheceu até agora. O que Bill Gates oferece aos líderes empresariais do futuro é um novo modelo que reúne características e habilidades muito mais adequadas aos desafios do século XXI.

Se nas escolas de Economia e Gestão não abundam pistas sobre as técnicas de gestão e de liderança de Gates, encontramos, no entanto, trabalhos que ajudam a entrar por dentro dos segredos do sucesso do chamado gigante da Microsoft Corporation. Tal é o caso do livro “A Gestão Segundo Bill Gates”, de Des Dearlove, que não só revela os segredos do notável êxito de Gates como também resume as lições universais e identifica as estratégias que podem ser aplicadas em qualquer outro negócio ou carreira. Passo a apresentar os capítulos deste livro, nos quais o seu autor tenta desvendar os 10 segredos do sucesso do líder mais rico do mundo:

Um: “Esteja no lugar certo no momento certo”. Não se trata apenas de um “golpe de sorte” o que aconteceu com Bill Gates: foram necessários mais de seis meses de árduo trabalho para vislumbrar a importância do negócio com a IBM a partir do qual conseguiu mudar a história da informática a nível do utilizador individual. É preciso, com o trabalho, maximizar as hipóteses de “ter” sorte. E, uma vez bafejado pela sorte, há que mantê-la, não a deixar escapar, o que implica estar e agir na hora certa. Quantas oportunidades não são perdidas porque não se sabe procurar, aproveitar ou manter a sorte (que pode não bater várias vezes à mesma porta)?

Dois: “Apaixone-se pela tecnologia”. O continuado êxito da Microsoft deveu-se grandemente ao conhecimento tecnológico de Bill Gates, que mantém o controlo sobre as decisões-chave neste domínio, prevendo mais claramente que os seus concorrentes a direcção futura da tecnologia e, deste modo, ganhando capacidade competitiva par liderar nessa direcção.

Três: “Não faça prisioneiros”. Implacável e feroz na concorrência, Bill Gates é um negociador duro e sem contemplações, um mestre em vencer os adversários. Podendo ser apresentadas inúmeras técnicas para vencer a concorrência, o certo é que só podem considerar-se válidas aquelas que ajudem efectivamente a a fazer melhor que os concorrentes, produzindo bens ou prestando serviços que melhor satisfaçam as expctativas e necessidades dos clientes. Bill Gates têm vencido pela qualidade superior dos produtos que apresenta no mercado.

Quatro: “Contrate sempre pessoas muito inteligentes”. Desde o início, Bill Gates apostou em ter sempre na empresa as melhores cabeças, tendo recrutado muitos dos mais brilhantes estudantes saídos das universidades, atraídos pela perspectiva de trabalhar e procurar o sucesso integrando-se numa equipa dos melhores. E para manter os melhores, Bill Gates não paga os mais elevados salários. Em contrapartida, através da possibilidade que dá aos seus trabalhadores de adquirirem acções da bem sucedida Microsoft, a empresa de Bill Gates tem feito mais milionários que qualquer outra no mundo.

Cinco: “Aprenda a sobreviver”. Para tanto, Bill Gates criou uma máquina de aprendizagem extraordinária, no entendimento de que é pela aprendizagem que se evita a repetição ou mesmo a comissão de um erro. A própria sede da Microsoft é organizada como um verdadeiro campus universitário, onde estão criadas as condições para que os trabalhadores invistam na sua aprendizagem como condição de sucesso da empresa e de si próprios.

Seis: “Não espere agradecimentos”. Receber elogios do concorrente pode ser um mau sinal (sinal de hipocrisia, de que as coisas podem não estar a andar bem), pois é mais comum que a fama atraia “infâmias” do adversário. Na verdade, o sucesso provoca “inimigos”, que acabam por constituir um “incentivo” a fazer melhor, para se manter na liderança.

Sete: “Assuma uma postura visionária”. Uma lúcida visão de futuro, assente num profundo entendimento da tecnologia e da maneira peculiar de sintetizar os dados, tem dado a Bill Gates uma aptidão especial para identificar e localizar as tendências futuras, definir e conduzir a estratégia da Microsoft.

Oito: “Cubra todos os campos”. A capacidade para gerir um grande número de projectos simultaneamente tem sido um dos segredos do sucesso de Bill Gates, que é bem o exemplo do homem multifuncional, capaz de explorar novos mercados e novas aplicações de software, sem deixar escapar a próxima “grande aposta”.

Nove: “Construa unidades de negócio pequenas como bytes”. Bill Gates procura e consegue manter o ambiente de optimização empresarial através da subdivisão da Microsoft em unidades mais pequenas, o que sucede com frequência e lhe permite assegurar a pulso o controlo da empresa, aprimorar a comunicação interna, promover a eficiência e a eficácia de cada uma das unidades e, em consequência, do conjunto.

Dez: “Nunca, mas nunca mesmo, tire os olhos da bola”. Bill Gates costuma dizer que é dominado pelo “receio latente” de que pode perder a sua próxima grande ocasião. Para que tal não aconteça, desenvolve a capacidade de antevisão, tomando em devido tempo as decisões necessárias para que não caia nos erros de outras empresas da área dos computadores, como a IBM e a Apple.
Bartolomeu Varela
Fonte: A Gestão segundo Bill Gates, de Des Dearlove. 1ª edição: Fevereiro de 2007, Casa das Letras, Rua Bento Jesus Caraças, 17, 1495-686 Cruz Quebrada- Portugal .

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