Alguns aspectos da deontologia e da carreira profissionais do pessoal docente


1.A especificidade dos estatutos do pessoal docente

Em Cabo Verde, as instituições de educação e de ensino são servidas por diversas categorias de profissionais, de entre as quais encontramos os docentes dos diferentes níveis de ensino, cujo regime de carreira e deontologia profissionais vamos, de seguida, abordar brevemente, à luz do quadro legal vigente no país e aplicável aos docentes dos diferentes estabelecimentos públicos de educação e ensino, designadamente:

a) O Decreto-Legislativo nº 2/2004, de 29 de Março, que aprova o Estatuto do Pessoal Docente dos estabelecimentos de educação pré-escolar, básica, secundária e da alfabetização e educação de adultos – Este Estatuto é complementado pelos seguintes regulamentos: i) regulamento de avaliação de desempenho do pessoal docente, aprovado pelo Decreto-regulamentar 10/2000, de 4 de Setembro; ii) o regulamento dos concursos de ingresso e acesso às categorias do pessoal docente em regime de nomeação, aprovado pelo Decreto-regulamentar nº 10/2000, de 4 de Setembro; iii) os diplomas que estabelecem ou regulamentam os suplementos remuneratórios atribuídos ao pessoal docente (Decreto-Lei nº 49/96, de 18 de Novembro e Portaria nº 11/97, de 24 de Março);

b) Os Decretos-Legislativos nºs 1/99 e 2/99, ambos de 15 de Fevereiro, que aprovam, respectivamente, o Estatuto do Pessoal Docente do Ensino Superior e o Estatuto do Pessoal Investigador, sendo este ultimo susceptível de aplicação tanto nos estabelecimentos públicos de ensino superior como em outros organismos públicos que se dediquem à investigação;

c) O Decreto-Lei nº 82/2005, que aprova o Estatuto do Pessoal Docente do Instituto Pedagógico.

Refira-se que os diplomas acabados de citar consideram os docentes dos estabelecimentos públicos de educação ou ensino, a diversos níveis, ou seja, da educação pré-escolar ao ensino superior, como funcionários públicos[1], ainda que pertencentes a quadros privativos.

Assim, os Estatutos de Pessoal Docente (EPD’s) em vigor (e respectivos diplomas complementares ou regulamentares) caracterizam-se pela sua natureza de diplomas especiais.

Ora, segundo a lei e a doutrina, tais diplomas, enquanto leis especiais, aplicam-se, exclusivamente, às correspondentes categorias de pessoal docente dos estabelecimentos públicos ou estaduais. E como diplomas especiais que são, suas normas têm a prerrogativa de serem aplicadas com prioridade em relação às normas da lei geral da função pública que versem sobre as mesmas matérias dos Estatutos. Assim, por exemplo, se determinadas matérias, como férias, carga horária semanal, aposentação, por exemplo, são reguladas de modo diferente nesses estatutos e na legislação geral da função pública, prevalecem as normas desses estatutos, que, desta forma, derrogam as leis gerais.

Entretanto, a correlação entre os EPD’s, enquanto leis especiais, e a lei geral da função pública apresenta outro aspecto importante: o carácter supletivo da lei geral em relação às leis especiais. Isto quer dizer que, sempre que uma lei especial (um EPD) se mostrar insuficiente para regular todas as matérias relacionadas com o seu objecto de regulação (exs: formas e recrutamento ou de provimento; direitos e deveres; sistema remuneratório; regime das faltas, férias e licenças; regime disciplinar; desenvolvimento profissional na carreira; a avaliação de desempenho; processo de aposentação, etc.), recorre-se às normas da legislação geral..

Os Estatutos do Pessoal Docente são diplomas que, em desenvolvimento da Lei de Bases do Sistema Educativo, estabelecem normas que disciplinam as carreiras de pessoal docentes de diferentes níveis de ensino. Assim, atendendo à especificidade das carreiras em causa e tomando em conta factores como o nível de qualificação, a complexidade do ensino, o grau de desgaste psíquico, físico e fisiológico no exercício das profissões, etc.), as opções do legislador em relação a determinadas matérias variam tanto de estatuto para estatuto como em relação à legislação geral da função pública.

Vejamos, a título exemplificativo, como o que acabamos de referir se expressa nas seguintes matérias:

- Carga horária Semanal: enquanto os docentes da educação pré-escolar, básica, secundária e da alfabetização de adultos cumprem 27 horas de serviço semanal[2], os do IP têm 24 horas[3] e os do Ensino Superior 40 horas[4], a mesma carga horária que vigora na Função Pública em geral;
- Férias anuais: enquanto os docentes da educação pré-escolar, básica, secundária e da alfabetização de adultos, assim como os do IP, têm direito a 33 dias úteis de férias, enquanto que os do ensino superior têm direito a 22 dias úteis, o mesmo que os funcionários públicos em geral[5];
- Direito de aposentação: os docentes da educação pré-escolar, básica, da alfabetização e educação de adultos e do ensino secundário podem aposentar com 55 anos de idade ou 32 de serviço docente, os do IP aposentam aos 60 anos de idade ou com 34 anos de serviço, enquanto que os do ensino superior, assim como os funcionários em geral, aposentam com 60 anos de idade e 34 anos de serviço prestado ao Estado.
- Redução de carga horária semanal: os docentes da educação pré-escolar, básica, da alfabetização e educação de adultos e do ensino secundário têm direito a uma redução de 2, 4, 6 e 8 horas lectivas por semana, após 15, 20, 25 e 30 anos de serviço docente prestado[6], enquanto que esta prerrogativa não é reconhecida às demais categorias de agentes docentes em análise.

Refira-se, ainda, que, ao se comparar os EPD’s com a legislação geral da função pública, constata-se que os professores com os graus de bacharelato, licenciatura ou superiores na área do ensino auferem remuneração relativamente superior à maioria dos funcionários do quadro comum da Administração Pública com idênticos graus. É certo, porém, que determinadas categorias de pessoal da Função Pública, submetidas a estatutos especiais, têm remuneração comparativamente superior à de docentes com idênticas habilitações (pessoal do quadro privativo das finanças, pessoal médico, magistrados judiciais e do ministério público, etc.).

Em contrapartida, em termos de disciplina e desempenho, exige-se muito mais dos professores dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, básica, secundária e de educação de adultos que em relação aos demais funcionários da Administração Pública. Assim,
a) À luz deste EPD, as faltas ao serviço desses professores[7], quando injustificadas, são penalizadas de forma mais dura: 3 faltas seguidas ou 5 interpoladas podem implicar pena de suspensão (contra 5 seguidas ou 8 interpoladas em relação aos demais funcionários, para a mesma pena); 7 faltas seguidas ou 13 interpoladas podem implicar pena de inactividade (contra 8 faltas seguidas ou 12 interpoladas em relação aos demais funcionário para a mesma penas)[8];
b) Nos termos do mesmo EPD, o comportamento exigido ao professor, do ponto de vista ético ou da moral, é de maior rigor, a ponto de incorrer em demissão o agente docente que namorar ou tiver relações sexuais com alunos…
Este rigor em relação ao comportamento do professor tem a ver com a natureza da profissão docente, que além de um saber especializado, se rege por uma deontologia própria.

2. Conceito e relevância da deontologia profissional do pessoal docente

São inerentes aos paradigmas modernos ou emergentes de educação determinados códigos deontológicos que variam em função das profissões (gestores, inspectores, professores), mas que têm em comum o facto de tais códigos serem constituídos por normas de natureza eminentemente jurídica mas com uma forte dimensão de ordem ética e moral.

Na verdade, a definição de qualquer deontologia profissional deve ser construída mediante a conjugação dos deveres profissionais consagrados pelo ordenamento jurídico-estadual com os deveres profissionais que resultam de normas morais e de trato social, que a consciência colectiva reputa como sendo necessárias e, quiçá, indispensáveis a uma prática profissional salutar, em prol do interesse público.

A deontologia profissional do professor não foge à regra: o seu núcleo essencial é constituído pelas normas jurídicas que o Estado adopta para regular o exercício dessa profissão, especialmente em termos de deveres. No entanto, a esse núcleo essencial se associa, de forma harmónica, uma série de outras normas, de natureza técnica e de conteúdo moral e ético, que contribuem para moldar um código de conduta profissional próprio de um professor.

A deontologia profissional docente está intrinsecamente ligada à missão da educação: promover o desenvolvimento integral dos indivíduos, de modo a que, através de conhecimentos, atitudes e acções consequentes, possam, por um lado, contribuir para o bem comum e, por outro (e concomitantemente), para sua própria realização.

A missão de educar não se esgota, pois, no desenvolvimento de competências cognitivas, tendo, igualmente, dimensões éticas (traduzidas em valores, atitudes e comportamentos) que permitem contribuir para uma reprodução da sociedade e dos indivíduos numa escala sempre ascendente, ou seja, a perspectiva da sua realização crescente e da busca incessante de perfeição.

Encarada nas suas diversas e integradas dimensões, a educação é uma tarefa de toda a sociedade mas que apresenta desafios e responsabilidades específicas aos agentes educativos, em particular ao docente, a quem cabe contribuir, através do trabalho pedagógico, para que a educação cumpra as suas funções essenciais, a saber: o desenvolvimento intelectual, moral e social dos indivíduos; a promoção da cultura geral; o desenvolvimento dos automatismos básicos de aprendizagem; a preparação para o exercício da cidadania e a vida activa; a preparação e a orientação para o exercício ulterior de uma profissão.

Se é evidente a perspectiva axiológica da educação, não menos evidente será o papel daquele (referimo-nos ao professor) cuja profissão consiste organizar o processo de aprendizagem de modo tal que resulte a prestação de um serviço educativo de qualidade, que é aquele que garante a capacitação indivíduos de modo a contribuírem para o desenvolvimento sustentável da sociedade (que financia a educação, porque dela precisa) e para a sua própria realização individual e colectiva, enquanto membros da mesma sociedade.

Por ser uma profissional que orienta a sua acção no sentido de, em cooperação com os demais agentes educativos, promover a realização de uma acção educativa ao serviço de toda a sociedade, o professor possui um código de conduta profissional exigente, cujo núcleo essencial – os deveres profissionais – vem definido, como vimos, na legislação vigente, que vamos abordar nos seus traços essenciais.

3. Análise da deontologia profissional do professor à luz do direito vigente

Antes de mais, importa lembrar que ao professor, enquanto funcionário público, são aplicáveis as normas jurídicas por que se rege o funcionalismo público cabo-verdiano em geral, sem prejuízo das que lhe são específicas. Assim, a deontologia profissional do docente inclui, essencialmente, os deveres dos cidadãos, os deveres dos funcionários em geral, e os deveres especiais constantes dos respectivos Estatutos.

A deontologia profissional do professor não pode ser bem apreendida fora do quadro normativo por que se regem a sociedade e o sistema educativo, nem tampouco à margem das normas gerais da Administração Pública ou mesmo das que regulam aspectos essenciais da convivência social, pois que do conjunto das normas do ordenamento jurídico cabo-verdiano derivam princípios e normas de conduta que o docente deve, naturalmente, ter em devida conta no exercício da sua profissão. Assim, por exemplo, no exercício da sua profissão, o docente está vinculado à observância de um conjunto regras deontológicas como: a legalidade, a imparcialidade, o apartidarismo, a discrição, o sigilo profissional, a lealdade institucional, o zelo, a urbanidade, a exemplaridade e a probidade na vida privada, social e profissional, etc.

É certo que a deontologia profissional não se esgota nos deveres jurídicos, mas estes, como referimos, constituem o seu núcleo essencial, tanto mais que, enquanto normas jurídicas, são de cumprimento obrigatório, incorrendo o respectivo infractor em procedimento disciplinar.

3.1. Deveres específicos do docente

Na verdade, há um vasto conjunto de normas deontológicas que deve impregnar a actividade profissional do professor, tal como consta, aliás, do artigo 6º do EPD dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, básica, secundária e de educação de adultos, do artigo 53º do EPD do ensino superior e do artigo 5º do EPD do Instituto Pedagógico.

Limitando-nos ao primeiro dos estatutos referidos, a norma citada refere que, para além dos deveres gerais inerentes ao exercício da função pública – ou seja, dos deveres gerais dos funcionários da Administração Pública constantes do EDAAP (Estatuto Disciplinar dos Agentes da Administração Pública), o docente dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, básica, secundária e de educação de adultos possui deveres específicos, a saber:
a) Contribuir para a formação e realização integral dos alunos;
b) Manter um comportamento exemplar perante alunos e menores em geral, abstendo-se, nomeadamente, de estabelecer relações sexuais ou amorosas com os mesmos ou de os assediar sexualmente;
c) Colaborar com todos os intervenientes do processo educativo, favorecendo a criação e o desenvolvimento de relações de respeito mútuo, em especial entre docentes, alunos, encarregados de educação e pessoal não docente.
d) Participar na organização e assegurar a realização das actividades educativas;
e) Gerir o processo de ensino-aprendizagem, no âmbito dos programas definidos;
f) Enriquecer e partilhar os recursos educativos, bem como utilizar novos meios de ensino que lhes sejam propostos, numa perspectiva de abertura à inovação e de reforço da qualidade da educação e do ensino;
g) Co-responsabilizar-se pela preservação e uso adequado de equipamentos e instalações e propor medidas de melhoramento e renovação;
h) Participar, de forma empenhada, nas acções de formação contínua organizadas pelo departamento governamental responsável pela educação ou em quaisquer outras iniciativas de capacitação ou actualização profissional que lhe disserem respeito, quer na qualidade de formador, quer na de formando;
i) Assegurar a realização de actividades educativas de acompanhamento de alunos, destinadas a suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente;
j) Cooperar com os restantes intervenientes do processo educativo na detecção da existência de casos de crianças ou jovens com necessidade educativas especiais;
k) Manter os órgãos de gestão das escolas informadas sobre os problemas que se detectem no funcionamento das escolas e dos cursos;
l) Participar nos actos constitutivos dos órgãos de gestão das escolas.

NB: Os deveres específicos dos docentes de ensino superior público vêm detalhados no artigo 53º do respectivo Estatuto, enquanto que os do professor do Instituto Pedagógico constam do artigo 5º do seu EPD.

3.2. Deveres gerais do professor enquanto funcionário público

Como assinalámos, os professores dos diversos níveis, enquanto funcionários públicos, estão igualmente vinculados aos deveres que a lei impõe aos demais agentes da Administração Pública. Assim, os EPD’s que vimos analisando dispõem que são aplicáveis aos professores os deveres gerais dos funcionários, prescritos no artigo 3º do EDAAP. Assim, a observância da legalidade, a prossecução do interesse geral, a isenção, a imparcialidade, o apartidarismo, a lealdade institucional, a urbanidade, o respeito e a consideração dos outros, a probidade, o segredo profissional integram-se nos deveres gerais do funcionário público (logo, dos docentes dos estabelecimentos públicos de educação), que passamos a transcrever na íntegra:

a) Respeitar a Constituição, os símbolos nacionais, as instituições da república e respectivos titulares;
b) Respeitar e garantir o livre exercício dos direitos e liberdades e o cumprimento dos deveres constitucionais e legais dos cidadãos;
c) Estar ao serviço do interesse geral definido pelos órgãos competentes da Administração Pública, nos termos da lei e de harmonia com ordens e instruções legítimas dimanadas dos superiores hierárquicos;
d) Observar e fazer observar, rigorosamente, os regulamentos;
e) Assegurar a eficácia, o prestígio e a dignidade da Administração Pública, participar activamente na realização dos objectivos e defender os interesses do Estado;
f) Agir com isenção, imparcialidade e rigoroso apartidarismo político, em ordem a criar no público confiança na acção da Administração Pública;
g) Cultivar a lealdade institucional, a pontualidade, assiduidade, o rigor, o escrúpulo, desenvolver o espírito de iniciativa, a produtividade, a competência e o zelo profissional e contribuir para a prestação de um serviço público de qualidade;
h)Cumprir exacta, imediata e lealmente as ordens ou instruções, escritas ou verbais, dos superiores hierárquicos em objecto de serviço, salvo se a ordem ou instrução implicar a prática de crime e sem prejuízo do direito de respeitosa representação;
i) Tratar com urbanidade e respeito os utentes dos serviços públicos e ser-lhes prestável, designadamente, dando satisfação célere às suas solicitações legítimas, adoptando o procedimento legal que lhes seja mais favorável, não lhes exigindo formalidades ou pagamentos não impostos expressamente por lei ou regulamento e não lhes provocando incómodos, perdas de tempo ou gastos desnecessários;
j) Dar prioridade, no atendimento, às pessoas idosas, doentes ou com deficiência, às grávidas, aos menores e a outras pessoas em situação de vulnerabilidade;
l) Agir com correcção e consideração para com os superiores hierárquicos, colegas e subordinados;
m) Guardar segredo profissional relativamente aos assuntos de que tenham conhecimento em virtude do exercício das suas funções e sobre os quais não tenham autorização do respectivo superior hierárquico para a sua revelação ao público, sem prejuízo do direito dos cidadãos a serem informados obre o andamento dos processos em que sejam directamente interessados e do direito de acesso dos cidadãos a arquivos e registos administrativos, nos termos das leis e regulamentos;
n) Proceder disciplinarmente, nos termos da lei, relativamente às infracções praticadas pelos seus subordinados e participar superiormente as que exijam intervenção de outras autoridades;
o) Avaliar o desempenho dos seus subordinados e informar a respeito dos mesmos, com rigor, isenção e justiça;
p) Aperfeiçoar a sua formação profissional, nomeadamente, no que respeita às matérias que interessam às funções que exerçam;
q) Não solicitar nem retirar vantagens de qualquer natureza das funções que desempenham e agir com independência e isenção em relação aos interesses e pressões particulares;
r) Agir, na sua vida privada, com probidade de modo a não desprestigiar a função que exercem”.

4. Outros aspectos essenciais da carreira do pessoal docente

4.1. Direitos profissionais

Como é evidente, ao docente não são impostos apenas deveres. A lei e os respectivos Estatutos consagram-lhes, igualmente, direitos e outras prerrogativas.

Assim, e referindo-nos especificamente, ao pessoal docente dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, básica, secundária e de educação de adultos, o seu EPD reconhece-lhes, a par dos direitos estabelecidos para os funcionários e demais agentes do Estado em geral[9], os seguintes direitos profissionais (que, aliás, são igualmente reconhecidos aos docentes dos demais níveis de ensino público):
a) Participar no funcionamento do sistema educativo e na vida da escola;
b) Participar na orientação pedagógica dos estabelecimentos de ensino;
c) Participar em experiências de inovação pedagógica;
d) Eleger e ser eleito para os órgãos de gestão das escolas, nos termos previstos na lei;
e) Ter aceso à formação com vista à actualização e reforço dos conhecimentos e evolução na carreira;
f) Dispor dos apoios e recursos necessários ao bom exercício da profissão;
g) Dispor de segurança social e na actividade profissional, nos termos da lei.

Este último direito compreende, nomeadamente:
a) Assistência médica e medicamentosa;
b) A protecção por acidente em serviço, nos termos da legislação aplicável, bem como, a prevenção e tratamento das doenças que venham a ser definidas em decreto-regulamentar, como resultando necessária e directamente do exercício continuado da função docente.
c) A penalização, nos termos da legislação penal aplicável, da prática de ofensa corporal ou outra violência sobre docente no exercício das suas funções ou por causa destas.

4.2. Relação jurídica do trabalho docente

O docente, como os demais funcionários públicos, pode ser recrutado para exercer a sua actividade profissional em regime de emprego e em regime de carreira
O regime de emprego traduz-se no recrutamento mediante contrato, que é a única forma de provimento dos docentes não pertencentes ao quadro:
O regime de carreira implica o provimento através da nomeação, que tem carácter vitalício

4.3. Desenvolvimento profissional do pessoal docente

O desenvolvimento profissional do pessoal docente em regime de nomeação efectua-se através de promoção e progressão.

Entende-se por promoção a mudança do docente de um cargo para o imediatamente superior àquele que detém dentro da respectiva carreira. Devendo, em princípio, ser precedida de uma progressão, a promoção depende, geralmente, da verificação cumulativa das seguintes condições:
a) Existência de vagas;
b) Tempo mínimo de serviço no cargo imediatamente inferior, de acordo com o regime legalmente estabelecido[10];
c) Desempenho satisfatório[11];
d) Aprovação em concurso;
e) Formação, quando a lei o exija (critério não exigido ao docente do Instituto Pedagógico e do Ensino Superior).

No caso do docente do ensino superior, outro critério exigido é a “prestação de serviços à comunidade”

Por seu turno, a progressão é a mudança do docente de um escalão para o imediatamente superior dentro da mesma referência. A progressão na carreira docente depende da verificação cumulativa das seguintes condições:
a) – Três anos de serviço efectivo e ininterrupto no escalão imediatamente inferior, salvo no caso dos docentes do ensino superior, em que o tempo mínimo é de 5 anos;
b) – Desempenho satisfatório[12].

No caso do docente de ensino superior, são ainda tidos como critérios para a progressão na carreira os seguintes: horas de docência, exercício de cargo de gestão, publicação de trabalhos de investigação e prestação de serviço à comunidade.

4.4. Avaliação de desempenho

Todos os funcionários estão sujeitos a avaliação anual de desempenho. Como se refere no EPD do Instituto Pedagógico (artº 15º) e no EPD dos estabelecimentos de educação pré-escolar, básica, secundária e da educação de adultos (artº 29º), são objectivos da avaliação de desempenho:
a) Melhorar a qualidade da educação e do ensino ministrados;
b) Adequar a organização do sistema educativo às necessidades educacionais;
c) Melhorar a prestação pedagógica e a qualidade profissional dos docentes;
d) Valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos docentes.

Segundo os referidos EPD’s, a avaliação de desempenho do pessoal incide sobre a actividade profissional desenvolvida pelos docentes na educação e no ensino, tendo em conta as suas qualificações profissionais e científicas e é reportada a períodos de tempo específicos.

As normas gerais relativas à avaliação de desempenho do pessoal docente dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, do ensino básico e secundário e da alfabetização e educação de adultos, constantes do respectivo Estatuto do Pessoal Docente, são retomadas e desenvolvidas pelo Decreto-regulamentar nº 10/2000, de 4 de Setembro.

A avaliação do pessoal docente nos demais níveis de ensino, particularmente no ensino superior público, carece de regulamentação específica.

Refira-se que o Decreto-regulamentar nº 10/2000 prevê que a avaliação de despenho do docente é de carácter contínuo e sistemático, sem prejuízo da avaliação anual, que tem lugar, ordinariamente, entre Julho e Setembro, por iniciativa do órgão de direcção do respectivo estabelecimento de ensino, que deve ter em conta o parecer do correlativo órgão de gestão pedagógica (Núcleo Pedagógico, Conselho Pedagógico) ou por iniciativa do próprio professor que, neste caso, e no momento adequado (até 20 de Junho), deve desencadear o processo, através de um relatório de autoavaliação que será objecto de apreciação e decisão pelo órgão de gestão da respectiva escola.

O diploma prevê ainda dispositivos diferenciados de avaliação dos professores investidos em actividades lectivas e dos afectos às actividades de gestão e coordenação.

Algumas das particularidades deste diploma residem: no facto de prever amplas garantias ao avaliado, que pode assim accionar vários mecanismos de modo a lograr uma avaliação justa; na circunstância de o docente não ficar com a classificação de Bom caso não tiver sido avaliado por razões que não lhe são imputáveis. Neste caso, nem o docente fica sem avaliação nem lhe é atribuída a classificação máxima, restando-lhe sempre a possibilidade de ele propor para si mesmo uma avaliação de Muito Bom em face do silêncio da Administração, desde que se julgue no direito de ter uma avaliação superior.

NB: Para um conhecimento mais aprofundado das carreiras de pessoal docente do ensino público, recomenda-se o estudo dos respectivos Estatutos e (Decreto-Legislativo nº 2/2004, de 29 de Março; Decretos-Legislativos nºs 1/99 e 2/99, ambos de 15 de Fevereiro, e o Decreto-Lei nº 82/2005, de 12 de Dezembro) e respectivos regulamentos, citados no início deste texto.

Bartolomeu Varela
[1] O facto de os professores do ensino público serem considerados funcionários públicos coloca os institutos públicos do ensino perante a situação de terem de gerir o seu pessoal segundo regimes jurídicos diferentes: os docentes regem-se por leis da Função Pública e os demais trabalhadores pelo regime jurídico geral das relações de trabalho. Este facto não só torna complexa como a gestão dos recursos humanos como introduz elementos de alguma rigidez nos processos de recrutamento e gestão de docentes, porventura com efeitos perversos, sobretudo se se tem em conta a necessidade de o ensino superior público se preparar para actuar num mercado cada vez mais competitivo.
[2] Das 27 horas, 22 são horas lectivas e 5 são horas não lectivas.
[3] Das 24 horas, 16 são horas lectivas e 8 são horas não lectivas.
[4] Das 40 horas, são horas lectivas 8 a 12 horas (para os monitores, são 6 horas), sendo as restantes passíveis de ocupação com actividades não lectivas.

[5]Além das férias anuais, os professores têm direito a “férias” ou a suspensão de actividades lectivas, nomeadamente no fim de cada período escolar. O EPD do ensino superior estabelece que os docentes deste nível têm direito às férias correspondentes às respectivas escolas, sem se referir expressamente as férias anuais, pelo que se recorre à lei geral, atribuindo aos docentes, pelo menos, 22 dias úteis de férias no fim do ano lectivo, além das férias semestrais.

[6] Como o professor do ensino básico, que ainda apenas lecciona em regime de mono-docência, não consegue, na prática, gozar o direito de redução de carga horária lectiva semanal, a lei atribui-lhe, em compensação, subsídios de 10, 20, 30 ou 40% do seu vencimento após 15, 20, 25 e 30 anos de serviço, respectivamente. Esta prerrogativa não é atribuída aos demais docentes, que gozam efectivamente, o direito à redução de horário de trabalho.

[7] Note-se que as faltas ao serviço desses professores (assim como as do pessoal docente do Instituto Pedagógico) não se definem simplesmente pela ausência a um dia útil de trabalho, que é de 8 horas, para o funcionário público. Na verdade, para tais docentes, falta é o quociente da divisão por 5 do nº de horas semanais do professor. Para os docentes da educação pré-escolar e básica, da educação de adultos e do ensino secundário, equipara-se ainda a falta a um dia a ausência ao serviço de exames e a uma reunião de avaliação e a dois tempos lectivos a ausência a outras reuniões de natureza pedagógica.
[8] No caso das faltas injustificadas passíveis de aposentação compulsiva ou demissão, a regulação é a mesma para os docentes e os demais funcionários: 12 faltas seguidas ou 15 interpoladas implicam uma dessas penas expulsivas.
[9] Esta remissão à legislação geral aplicável aos funcionários importante, pois permite aos professores beneficiar de todos os direitos dos agentes da Administração Pública, além dos específicos da sua profissão..
[10] De acordo com a lei geral, o tempo mínimo para a promoção é de 4 anos. Entretanto, para o pessoal docente do ensino superior, esse tempo mínimo é de 5 anos
[11] O EPD do Instituto Pedagógico exige que a avaliação de desempenho seja de Bom, para efeitos de promoção. Já o EPD do ensino superior, em vez do requisito em causa, exige “Avaliação científica”.
[12] O EPD do Instituto Pedagógico exige que a avaliação de desempenho para efeitos de progressão seja de Bom durante os últimos três anos de serviço docente.

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